Os ciúmes que têm do Benfica

OPINIÃO25.06.201904:01

Não fosse a transferência de João Félix para o Atlético Madrid, mais os 120 milhões de euros que lhe estão associados,  suscitando conversas e discussões ao nível de baiuca de aldeia, o defeso seria uma pasmaceira completa. Sem capacidade para investir no futebol da paróquia o resultado é este, nada de especial acontece.

O Benfica, campeão em título, é um oásis em deserto de ideias. Faz bem o que mais ninguém é capaz, porque tem um rumo e, principalmente, respeita um plano de recuperação e crescimento  subordinado ao admirável sentido estratégico do seu presidente: primeiro salvou o clube das cinzas, depois investiu nas infraestruturas, com gastos substanciais que obrigaram a uma travessia longa, mas de risco controlado, até alcançar a estabilidade financeira que lhe permitisse concentrar forças e energias no ousado projeto desportivo. Que  está em marcha e, como é obvio e notório, não só coloca a águia em patamar superior comparativamente aos principais emblemas rivais como explica os ciúmes que estes lhe têm e não escondem. 

Neste momento, o Benfica reforça-se e rejuvenesce-se,  procedendo apenas a acertos pontuais na medida em que o corpo central do plantel se mantém. Será  essa, creio,  a intenção futura, justificada por  uma linha de continuidade assegurada pela academia do Seixal, ficando o recurso ao mercado externo limitado à supressão de carências que os meios internos não conseguirem solucionar.  

Nenhuma surpresa, pois, pelo facto de o pilar principal formado por Jardel, Fejsa e Jonas, sobre o qual foi projetada a época transata, ter perdido o protagonismo. O caminho da reconquista a isso obrigou. Abriram-se  novos horizontes e os três indispensáveis, de repente, perderam espaço, embora por razões diferentes. 

Jardel, ainda com Luisão no ativo, adiou Rúben Dias, mas já não parou Ferro, nem prejudicou o crescimento da futura dupla de centrais da Seleção. Será chamado menos vezes ao palco, mas nem por isso verá diminuída a sua influência na comunidade.

O caso de Fejsa é diferente. O  futebol do Benfica adquiriu outra intensidade com novas dinâmicas e debilitou a posição do médio, ao nível da velocidade que não tem e da disponibilidade física que lhe falta.

Jonas é o homem do golo. Sem ele era desgraça anunciada. Além disso, foi  tema de discussões infindáveis e de sábios tratados jornalísticos quando Rui Vitória alterou o sistema de jogo. Porém,  o avançado brasileiro, detentor de uma qualidade de execução superior,  integra-se em qualquer desenho tático. Foi o que fez, provando à saciedade a inutilidade das horas que se gastaram sobre um problema que, verdadeiramente, nunca existiu.

A idade não perdoa, e as dores nas costas também não, mas um jogador com a sua classe quase nem precisa de correr atrás da bola, é a bola que corre atrás dele… Não espantará, no entanto, se não couber  no formato da águia 2019/2020.   Tal como Salvio, por exemplo. O argentino chegou em 2012, não está em causa a sua competência, mas as frequentes paragens provocadas por lesões somam  dois  anos de inatividade. É demasiado.  O comportamento do Benfica é  inatacável ao prolongar-lhe o contrato até 2022, mas as coisas são como são…

O espírito da reconquista trazido por Bruno Lage foi apenas o  primeiro passo de um novo percurso. Ou não. O percurso será o mesmo, embora atacado com outra atitude. Com o prazer de acreditar que o Benfica vai voltar a ser campeão europeu, como confessou o diretor-geral Tiago Pinto, em entrevista  publicada em A BOLA. É esse o desejo supremo  do presidente Luís Filipe Vieira e, garantidamente, de toda a grande família benfiquista.

Os heróis de 1964

Foi em maio de 1964, fez 55 anos, uma idade bonita, que o Sporting conquistou a Taça dos Vencedores de Taças, numa final empolgante com o MTK, que só se resolveu em segundo jogo, em Antuérpia, com o célebre cantinho do Morais. Frederico Varandas poderia ter-se lembrado de evocar a histórica data quando se referiu às mais recentes vitórias europeias do Sporting, que é «melhor que os maiores da Europa», em ano que «vai ser recordado durante décadas», como sublinhou, nas modalidades de judo, goalball, futsal, atletismo e hóquei em patins.

Não se lembrou. Carvalho, Pedro Gomes, José Carlos, Alexandre Baptista, Figueiredo e Hilário, felizmente ainda vivos, teriam gostado de ouvir. E teria feito bem ao orgulho dos adeptos, aos mais velhos e aos mais jovens, os quais devem aplaudir o passado europeu do leão e venerar os heróis de 1964, que na caminhada para o título defrontaram nos quartos de final o poderoso Manchester United:  foram goleados  em Inglaterra (0-4), mas na segunda mão, em Alvalade, numa reviravolta espantosa e creio ter sido a derrota mais pesada sofrida pelo United em toda a sua história, o Sporting ganhou por cinco a zero. 

Nem o ouro olímpico de Carlos Lopes lhe mereceu uma referência de circunstância.

Percebe-se o entusiasmo de Varandas, mas ele também deve perceber que só é presidente há nove meses de um clube que nasceu há mais de cem anos.