Os anos 20 outra vez
Estamos, não sei se repararam, a quatro dias dos anos 20. Dá que pensar, porque no que respeita ao século passado nunca nos referimos aos anos 10, pois a nossa era, a de cultura de massa, começou nos 20, os roaring twenties, como ficaram conhecidos na América e em Londres, les années folles, como apelidados em Paris, os loucos anos, como lhes teriam chamado por cá se por cá se tivesse passado algo de progressista à data.
Em todo o caso, aprende-se na escola que foi nos anos 20, no pós-guerra, que a vida como a conhecemos começou: ter máquina de lavar roupa, frigorífico, lâmina de barbear, rádio, televisão, máquina fotográfica; as linhas de montagem, os hábitos de consumo, os mass media. Antes disso, na América e no mundo, nos tais anos 10, havia mais gente a viver, dispersa, nos campos, do que nas cidades. Havia mais dinheiro, ou mais formas de ganhá-lo, e com isso a possibilidade de tal cultura de massa, as estrelas de jazz, os artistas de cinema, em parte mudo, Charlie Chaplin, Greta Garbo, o nome no cartaz, a nova sensualidade, o ídolo, o querer ser como alguém. Com Babe Ruth, o basebolista, a primeira estrela social do desporto, estádios, taças, multidões, competições. É fácil imaginar a vida nos anos 20, mais difícil imaginá-la antes. O que mudou dos primeiros anos 20 para estes segundos? Talvez nem tanto assim. As tecnologias aproximaram tudo, contudo as vontades parecem-me fundamentalmente iguais: a máquina de lavar roupa, os social media, o frigorífico, a lâmina de barbear, o ecrã, muitos Babe Ruth, o nome no Twitter, uma sensualidade fácil que passou a sexualidade fácil, o Instagram, versões de Chaplin e Garbo, o querer ser como alguém. Bem-vindos, loucos anos 20, há muito que ouço falar de vocês e é, enfim, um prazer conhecer-vos.