O suicídio do jornalismo

OPINIÃO17.09.202206:30

A crise do jornalismo é global, mas em Portugal é dramática. Congela-se o investimento, os custos,a qualidade, mas a banalidade não vende...

NÃO tenho a certeza de que a morte do jornalismo já seja, no presente, uma realidade universal irreversível. Admito que possa ser uma convicção de muitos, mas nós que vivemos num país politicamente inquieto, economicamente débil, cultural e intelectualmente diminuído sabemos que temos à porta um problema dramático de um jornalismo em cuidados intensivos e que, por agora,  apenas parece capaz de aspirar à sobrevivência de mais um ano, mais um mês, mais um dia.

Não se trata, aqui, de uma autoflagelação inconsequente, provocada por uma discriminação negativa dos portugueses em relação a outros povos. Trata-se de pragmatismo e, por isso, de compreender que Portugal tem, por circunstâncias geográficas, económicas, demográficas um problema de escala que leva a que todas as crises, nos mais diversos setores da sua vida pública e privada, se tornem epidémicas e com uma dimensão de efeitos generalizados.

No caso do jornalismo, a crise está instalada há muito tempo e apenas têm existido soluções de caráter paliativo. Uma única solução emerge: a diminuição do investimento, a redução drástica dos custos e a tentativa desesperada de ir ao encontro do que o público gostará de ter, de ler, de ver e de ouvir para o satisfazer e lhe merecer alguma preferência. O resultado é a inevitável tentação do suicídio do jornalismo, a ausência de meios para investigar, para conhecer, para informar, para se tornar suficientemente credível que leve o cidadão comum a achar que merece a pena pagar porque tem a garantia de mais e melhor conhecimento, além daquele que vai recebendo gratuitamente, queira ou não queira, e que o vai atraindo no sensual verniz das redes sociais.
 

Funeral de Isabel II dominou televisões 


O estado dos media em Portugal já não era famoso, mas a crise económica internacional, que  nos trouxe a troika atrelada, o brutal efeito da pandemia, que nos fechou a todos em casa e nos obrigou a inventar um jornalismo em modo de arrendamento local, logo depois a guerra na Ucrânia, com toda a sua cadeia de consequências para a vulnerabilidade europeia, trouxeram-nos um quadro dantesco de uma tempestade perfeita que devasta uma indústria fragilizada e precária.

Hoje, os jornais televisivos, apesar de chegarem a cobrir duas horas em prime time, são monotemáticos, porque cada estação tem de apostar todas as fichas de produção, realização, meios humanos e financeiros num único assunto. E foi assim com a crise pandémica, usada e abusada até à exaustão, com a guerra da Ucrânia, levada até à pornografia do seu caos humanitário, e foi também assim com o colapso dos serviços hospitalares, os incêndios de verão e, agora, da forma mais despudorada, com o funeral da rainha Isabel II, transformado num ritual cénico, ou seja, num espetáculo bem mais mundano do que mundial.

Ainda mais grave e preocupante é o cenário em que vai resistindo a imprensa escrita. Alguma, associada a empresas que têm o seu núcleo duro no projeto televisivo, tornou-se apenas em projetos meramente subsidiários, insignificantes do ponto de vista empresarial e por isso só tolerados, desde que não constitua problemas irritantes; outra, autónoma e desejavelmente mais independente, espera e desespera por um qualquer milagre que lhe venha resolver a quadradatura do círculo. Sem vendas não há dinheiro, sem dinheiro não há investimento, sem investimento não há jornalismo que torne o produto interessante e sem um produto interessante não há quem compre a banalidade do dia.
Estaremos, pois, muito próximos do tempo de uma nova revolução mediática que acompanhe, enfim, a revolução tecnológica. 
 

DENTRO DA ÁREA – O ADEUS DE UM ÍDOLO MUNDIAL 

Roger Federer, tenista suíço de 41 anos, fez capa em muitos jornais europeus, de generalistas a desportivos,  depois de ter anunciado, nesta última quinta-feira, que se iria retirar da competição ao mais alto nível. Vencedor de nada menos de vinte títulos de torneios do Grand Slam, Federer marcou a história do ténis moderno, com o seu incrível talento e que fez dele um ídolo de dimensão mundial. Ainda recentemente, apesar de estar afastado dos principais torneios, por lesão, continuava a ser o tenista mais bem pago do mundo. 
 

FORA DA ÁREA – E, ENFIM, UMA NOTÍCIA BOA...

A Organização Mundial de Saúde dá a pandemia de Covid-19 como praticamente extinta, apesar das reservas que ainda existem sobre a possibilidade de surgirem novas variantes. Entretanto a Direção Geral de Saúde garante que 95,8 por cento dos portugueses está imune ao vírus. Não deixa de ser uma das melhores notícias que o país recebeu nos últimos tempos e basta pensar no que foi a vida enclausurada dos portugueses (e não só) durante os ainda muito recentes anos de pandemia para se sentir uma incrível sensação de alívio.