O património popular do futebol
O Benfica entrou, no novo ano, com o pé direito. Em Guimarães, num ambiente fantástico (e, muitas vezes, escaldante), Bruno Lage montou uma equipa capaz de vencer um excelente conjunto liderado por Ivo Vieira. Num dos jogos mais bem disputados até ao momento na presente época desportiva, o Vitória fez com que o Benfica tivesse que jogar com o coração e com a cabeça para trazer da cidade-berço os três pontos que lhe permitem manter a liderança isolada (com mais sete pontos do que o Futebol Clube do Porto até, pelo menos, logo à noite) da Liga. Foi, pois, o início de ano que todos os benfiquistas ansiavam.
2Ontem recomeçou, assim, a nossa Liga depois de uma pausa longa. Agora, nestes dois meses, muito se vai decidir. Confrontos entre os grandes, a disputa final da Taça da Liga, os quartos de final da Taça de Portugal e os jogos, em Fevereiro, da Liga Europa. Aqui, para alegria da SIC, nesta disputa de audiências que tão acesa está nas antevésperas de alterações significantes na titularidade da TVI. E a BTV aumenta a sua oferta com um produto de proximidade que decerto vai atrair muitos e muitas benfiquistas. Há o play nos relvados e há o play nos ecrãs. Ou seja, o pleno do futebol de hoje. A que se juntam as linhas ao dispor do VAR que já chegam aos calcanhares e aos doze milímetros! Coisas destes tempos!
3O ano de 2020 arranca com um Sporting - Porto. Diria que é um jogo determinante para a equipa de Jorge Silas e muito importante para a equipa de Sérgio Conceição. O Sporting de Bruno Fernandes sabe que não pode perder mais pontos. O Futebol Clube do Porto de Danilo sabe que se tem de aproximar do Benfica. Um e outro quererão os três pontos. Um e outro sabem que os próximos tempos, internos e externos, são decisivos para o futuro próximo de ambas as sociedades desportivas. E cada ponto conquistado vale muito. Na classificação e nas contas. Onde entram a tesouraria e também os projetos desportivos a curto e médio prazo. Tendo em conta os desafios internos e as apostas externas. Onde os novos modelos competitivos europeus e mundiais não podem ser ignorados. E, aqui, FPF e Benfica, através de Tiago Craveiro e Domingos Soares de Oliveira, estão na dianteira. Como se diria em linguagem comum, conseguem ver largo! E com o Tiago Craveiro a assumir, uma vez mais, um papel determinante na UEFA e na nova estrutura empresarial que vai acompanhar o novo modelo competitivo.
4É tendo em conta este desafio externo e, também, as apostas internas, que o Benfica, com o entusiasmo dos seus apaixonados e fiéis adeptos, concretizou a aposta no alemão Julian Weigl. O Benfica sabe que a Europa é o seu espaço vital. Não ignorando que a nossa Liga é essencial para aquela afirmação. O Benfica sabe que tem de estar aliado às mudanças que vão ocorrer no mundo do futebol. E será fora da competição interna que tal irá acontecer. Mas a nossa Liga, e a sua conquista, tem de ser um desígnio permanente. Sistemático e repetido. Até para condicionar em definitivo adversários que se tornaram, por razões umas conhecidas e outras a conhecer, inimigos! E a disputa entre amigo e inimigo é uma das essências da afirmação de poder. Como a história, sempre necessária, nos ensina!
5O futebol inglês domina o Mundo. Prende as atenções dos países mais populosos, como a China, a Índia, a Indonésia, a Nigéria, o Paquistão ou a Malásia. Os seus jogos são vistos por centenas de milhões de homens e de mulheres. As camisolas dos jogadores vendem-se nos mercados principais de cidades que agregam mais de cinco milhões de pessoas. Ontem, neste jornal, Jorge Valdano proporcionou-nos um naco delicioso de futebol escrito com mestria e em que nos deu conta da Liga inglesa e o seu papel determinante na defesa e na promoção do património popular do futebol. E em outra reflexão, em outro jornal desportivo - não português -, outro sociólogo do futebol contemporâneo, Santiago Segurola, alimentava-nos a alma com a análise do Liverpool de hoje - arrasador! - e do papel de Jurgen Klopp nesse domínio. Mas, e para além do futebol, e se registamos e aplaudimos o papel de Jorge Jesus na descoberta pelo Brasil da competência e da excelência do Portugal de hoje, a honestidade intelectual exige-nos, por a vivermos e sentirmos, que reafirmemos que Cristiano Ronaldo é, hoje em dia, para centenas de milhões de homens e mulheres, a referência de Portugal. E sei bem que, há vinte anos, nos mesmos locais de hoje, pouca gente ouvira falar de Portugal. Porventura, ao lado de Espanha! E hoje mencionamos o nome de Portugal e logo escutamos Cristiano Ronaldo. E até um taxista numa impressionante metrópole acrescentou: «Sou católico e ele é um Deus!» E, assim, e com a anunciada e desejada recandidatura de Fernando Gomes, arrancou 2020. Agora, teremos futebol a valer quase todos os dias. Com a sua paixão e, por vezes, com certa razão. Mas com a consciência que importa, também entre nós, criar uma mentalidade positiva que preserve o património popular do futebol. Que é a sua essência e a razão da sua existência!