O novo Benfica nasceu

OPINIÃO30.08.202206:30

Rui Costa foi feliz na escolha do seu ‘primeiro’ treinador. O processo de mudança está em marcha. Pode ser demorado, mas é inadiável

QUANDO perguntaram a Roger Schmidt se a equipa do Benfica era a mais forte da Liga portuguesa a sua resposta foi sábia: quando o campeonato acabar é que vai saber-se. Treinador de poucas palavras, mas de olhos muito abertos, está obrigado a dar passos seguros numa realidade que ainda domina mal, sem se deixar contagiar pelo entusiasmo dos adeptos, verdadeiramente encantados com as exibições da águia, como há muito não tinham o prazer de ver.
Schmidt escolheu o caminho por onde quer seguir, sabe do que precisa para chegar ao fim na liderança da classificação e sabe também que a  empreitada é grandiosa, embora desafiante e exigente.  A equipa mais forte será a que for mais regular e competente nesta  prova de resistência que se estende até maio do próximo ano.
Começar bem é importante, mas apenas isso, e o Benfica tem guardadas na memória situações recentes de euforias apressadas que se transformaram  em desolações profundas. Há duas épocas,  liderou até à quinta jornada (15 pontos, contra 13 do Sporting e 10 do FC Porto). Depois foi sempre a descer, acabando no terceiro lugar, a nove pontos do leão e a quatro do dragão.
Na temporada transata, o cenário revelou-se ainda mais frustrante:  foi líder nas primeira nove jornadas e na décima caiu para terceiro, posição em que se manteve até final, ficando a 17 pontos do  FC Porto e a 11 do Sporting.
 

PERANTE indicadores tão  negativos , apesar de fraco significado face à rica história do Benfica, que o treinador bem conhece, é natural que Schmidt tenha pouca paciência para análises, estudos, estatísticas e comparações que nada lhe acrescentam em relação ao que precisa para definir  o seu rumo, o que  já fez, note-se: assumiu as dores da administração, dando ânimo à revolução em marcha no plantel, e decidiu um corte radical com o passado recente quanto à atitude competitiva dos jogadores, ponto de partida para devolver à águia o prestígio que lhe foi sendo roubado por vagas de praticantes vulgares e desinteressados e também por canhestras opções técnicas que representaram anos de estagnação, corroeram os horizontes desportivos da instituição e adiaram o seu futuro.  E não foi por falta de investimentos…
O novo Benfica nasceu e quer recuperar o tempo que esbanjou e o dinheiro que gastou na promoção de personalidades megalómanas. Rui Costa foi feliz na escolha do seu primeiro treinador. O processo de mudança está em marcha. Pode  ser demorado, mas é inadiável, e Schmidt não só tem a clara noção da responsabilidade que aceitou como tem identificadas lacunas por eliminar. O plantel é bom, mas, segundo ele, deve ser equilibrado, faltando «alguns ajustes em todas as posições», de modo a reforçar a competição individual. Para já, e referindo-se ao jogo desta noite com o Paços de Ferreira, foi claríssimo: «Não podemos subestimar nenhum adversário». O que aconteceu a Sporting e FC Porto é o melhor exemplo…
 

VARANDAS MUDO

N ÃO foram apenas os resultados que originaram a trovoada que o treinador leonino previu e que o levou a dizer o que disse, antes do clássico no Dragão.  Foi perspicaz na antecipação, mas talvez não esperasse que o choque  tivesse impacto tão forte. Depois da derrota com o FC Porto, sentenciou  que uma vitória sobre o Chaves seria suficiente para voltar a ficar tudo bem, mas o leão voltou a não ganhar, o que o obrigou  a repetir a promessa, embora com subtil diferença:  ganhar o próximo jogo, no Estoril, já não é garantia de ficar tudo bem, apenas a esperança de que isso aconteça porque, palavras do guarda-redes António Adán, «o balneário não está no seu melhor momento,  animicamente».
Rúben Amorim admite que o seu lugar possa estar em risco, até a época desportiva do clube, mas o plano do Sporting  parece protegido de todas as intempéries resultadistas que até os mais insignes  analistas do futebol sentem  dificuldade em interpretar. Situação diferente, porém, é recusar as evidências e não enfrentar a realidade, como parece ser o caso.

No momento presente, Amorim sabe que só deixará de ser treinador do Sporting por vontade própria, mas essa aparente estabilidade não ajuda a explicar alguns recentes excessos de linguagem, como proclamar  que pode sofrer até dez derrotas que não muda de ideias. Assegura que vai manter as suas convicções,  quer com os avançados, quer com Coates na frente, e sabe que pode dizê-lo porque beneficia de cobertura presidencial. No entanto, creio que voltou a exagerar na palavra, agora em relação aos adeptos acerca do conflito com Slimani, ao afirmar ser-lhe «completamente indiferente» o que eles pensam ou de que lado estão. Disse-lhe tudo «na cara»,  enfatizou, mas o quê e a propósito de quê? O que Slimani escreveu nas redes sociais, ou alguém por ele, foi isto: «O que aconteceu foi que ele [Amorim] não gostou que eu jogasse bem  para que ele fosse obrigado a tirar o jogador dele [Paulinho]. Então arranjou todas estas desculpas (…)».
Se foi assim ou não, a verdade é que  Amorim  nada esclareceu. E devia tê-lo feito, para proteção do próprio Paulinho e colocar ponto final no assunto. Pior, só a mudez de Frederico Varandas.