O mundo de olhos em Kiev

OPINIÃO14.10.201904:00

Hoje à noite todos os olhos estarão no Estádio Olímpico de Kiev. Os dos portugueses e os do mundo inteiro. Os nossos por duas razões, os dos outros por uma apenas - a não ser os dos sérvios, a quem o resultado, de facto, interessa tendo em vista o apuramento para o Euro-2020. Comecemos pelos interesses coletivos, porque sempre aprendemos que, no futebol, os interesses coletivos se devem sobrepor aos individuais. E é verdade. Todos esperamos, iniciando então a conversa por aí, que com uma vitória na Ucrânia a Seleção Nacional se coloque em posição de poder, ainda, lutar pelo primeiro lugar do grupo. Não é que seja imperioso consegui-lo, porque desta vez o segundo também se apura diretamente, mas é uma questão de orgulho. Portugal é campeão da Europa, tem o melhor jogador do mundo, tem dos mais talentosos futebolistas da atualidade e tem, de facto, a obrigação de acabar em primeiro lugar. Em especial neste grupo.


É, ainda assim, exagerado apelidar a partida desta noite de decisiva. Porque não é. A Seleção Nacional pode até perder (batamos, todos, três vezes na madeira) e ainda assim apenas um verdadeiro descalabro a tirará do Campeonato da Europa, tendo em conta que, mesmo que a Sérvia vença hoje na Lituânia, ficará um ponto atrás e a Portugal ficarão a faltar dois encontros que - e não é sobranceria, é apenas o que é... - não deverão trazer-nos demasiadas dificuldades: a Lituânia em casa e o Luxemburgo fora (embora, conhecendo a realidade luxemburguesa, se possa prever que o ambiente será, nesse jogo, até bastante favorável...). Não é, portanto, um jogo decisivo para a qualificação. Pode sê-lo, talvez, para o ego de quem de há uns anos para cá se habituou a ver a Seleção Nacional ganhar quase sempre. E de quem sabe que o campeão europeu, ainda por cima com jogadores como aqueles de que dispõe Fernando Santos, tem de ser melhor do que a Ucrânia. Ganhar é, então, uma obrigação? Sim, mas apenas uma obrigação moral. Não uma obrigação matemática. Graças a Deus, porque já estamos cansados de fazer contas difíceis no que a apuramentos diz respeito.


E ainda assim, mesmo não se tratando de um jogo decisivo, hoje à noite todos os olhos estarão no Estádio Olímpico de Kiev. Os dos portugueses e os do mundo inteiro. Porque esta pode ser a noite de Cristiano Ronaldo. E já se sabe que, onde anda Cristiano Ronaldo estão os olhares de centenas de milhões de pessoas. O melhor jogador português de todos os tempos, talvez o mais completo da história do futebol mundial, pode chegar na Ucrânia aos 700 golos na sua carreira enquanto futebolista profissional. 700. Podia ter lá chegado frente ao Luxemburgo, mas, convenhamos, seria até mais poético que o conseguisse hoje, frente a um adversário bem mais complicado do que o Luxemburgo. Porque não se deve misturar Cristiano Ronaldo com aqueles que foram capazes de atingir números simpáticos marcando muitas vezes contra oponentes acessíveis e ficando quase sempre em branco quando a exigência aumentava. CR7 é diferente. Marca a (quase) todos, fortes e fracos, desde pré-eliminatórias a finais da Champions - não marcou na final do Europeu, é verdade, mas todos sabemos porquê... Sim, vendo bem as coisas, e tendo em conta que seria bonito ver o capitão português fazer o seu golo 700 com a camisola da Seleção Nacional, saberá melhor que seja em Kiev contra a Ucrânia do que em Alvalade contra o Luxemburgo. Mesmo que Cristiano preferisse, talvez, tê-lo feito no palco ao lado daquele onde fez o primeiro...


700 golos... Não é para todos. Aliás, se alguém tentar desvalorizá-los (e há por cá muitos que não se importarão de fazê-lo), basta dizer que na história do futebol mundial - que já tem uns aninhos... - só Puskas, Gerd Muller, Pelé, Romário e Josef Bilan conseguiram lá chegar. Eles e Ronaldo, é certo. De preferência já hoje.