O Mundial da minha nostalgia
É deveras curioso como pode a mente humana causar-nos tanta surpresa. Exemplo pessoal, que não me importo de partilhar convosco: sentir nostalgia, antes da razão objetiva de a sentir.
Não me arrependo - e julgo que não virei a arrepender-me - de não estar fisicamente presente no Mundial da Rússia. Todas as coisas têm o seu tempo e nunca foi meu projeto de vida profissional andar a bater recordes de longevidade.
Acompanhei oito Campeonatos do Mundo. Desde 1986, não perdi nenhum. Adorei ter estado durante dois longos meses, naquele frenesim histórico do México, em 86; no pachorrento Itália 90; no Mundial contra natura dos Estados Unidos, em 94; no esplendor da vitória da França racialmente plural, em 98; no longínquo, mas sofisticado Coreia/Japão, primeiro Mundial do século XXI; no legítimo orgulho lusitano de uma das nossas seleções maiores, no Alemanha 2006; ainda no fantástico primeiro mundial africano na África do Sul (última aparição pública de Nelson Mandela) em 2010; por fim, no Mundial brasileiro, feito e sentido por nós como em casa de família, no ano de 2014.
Rússia seria, pois, o meu nono Mundial de Futebol. Tudo por junto, seriam 36 anos de andanças pelo Mundo, a ver um dos melhores espetáculos do nosso planeta, em relação ao qual, admito, me liga uma profunda e sempre inesquecível paixão. Fico-me por 32 anos de globetrotter de Mundiais de futebol e já me parecem muitos.
Regresso ao essencial da razão: tudo tem o seu tempo, não corro atrás de recordes de longevidade e, o mais importante, não sinto ter o direito de adiar o futuro de alguns dos mais jovens e competentes jornalistas de A BOLA.
A ideia de que sempre seríamos capazes de fazer melhor do que outros, a todos nos assalta, mas há muito que exigi, a mim próprio, a disciplina, e também a coragem, de ser eu a tomar decisões que outros, mais tarde ou mais cedo, haveriam de ter de tomar. Provavelmente com desconforto, e, inevitavelmente, com dor.
PORTUGAL chegará à Rússia com a boa responsabilidade de ter o título de campeão europeu. Não o obriga a ser campeão do mundo, não lhe exige, sequer, um lugar no pódio, mas não lhe pode ser indiferente.
Tenho, confesso, algumas expectativas sobre a Seleção. Em primeiro lugar, porque tem excelentes jogadores; em segundo lugar, porque, com bons jogadores, Fernando Santos saberá fazer uma equipa competente, que não quererá necessariamente dizer luminosa; em terceiro lugar, porque acho que temos a obrigação de chegar aos oitavos de final e seria muito engraçado passar essa barreira e defrontar a França nos quartos de final, coisa que, atendendo ao cruzamento dos grupos, pode muito bem suceder.
CRISTIANO RONALDO ou MESSI? Qual deles será a estrela maior neste Campeonato do Mundo? Uma resposta com elevado grau de risco: NEYMAR.
Se pudesse ser eu a decidir, obviamente Cristiano. Por dever pátrio. Não creio que o Mundial da Rússia me dê esse prémio de compensação pela minha ausência pessoal. Creio que Neymar despontará, finalmente, como estrela maior e como legítimo sucessor de dois génios, que ficarão para sempre na História do futebol.
Acredito muito em Neymar, porque chega, enfim, a um Campeonato do Mundo sem grande desgaste competitivo; porque tem uma bela e prometedora equipa e, o mais importante de tudo, porque é, também, um fantástico talento do futebol mundial.