O comentador de arbitragem

OPINIÃO07.08.201801:53

Para quem não se recorda, há muito que nomes como (os saudosos) Cruz dos Santos, Carlos Arsénio, Vítor Correia ou Paulo Paraty desempenharam essa missão e diga-se, com equilíbrio, elevação e competência. Eram pessoas cultas, educadas e experientes, que partilhavam as suas opiniões de forma clara e objetiva, sem necessidade de recorrer sistematicamente a sarcasmos de categoria duvidosa ou a piadolas de mau perdedor. É uma questão de qualidade humana e nisso todos eles eram, de facto, uns senhores.


Como já terão reparado, esta carreira, cada vez mais em uso, pode desempenhar papel determinante no modo como forma opinião e contagia o adepto. Deve, por isso, ser exercida por quem se mantenha permanentemente atualizado, por quem não se esqueça das suas vivências em campo e por quem tenha capacidade para comunicar e sensibilidade para criticar. Para criticar de forma instrutiva, didática e construtiva. Na minha opinião, um comentador de arbitragem não deve reduzir a sua intervenção à mera análise de penáltis ou à justiça de uma expulsão. Pode, deve e tem de ir mais longe, porque nos dias de hoje, qualquer pessoa mais atenta sabe dizer se houve ou não falta, se era ou não lance para vermelho.


Por isso, o mais importante não é focar na discussão estéril dos momentos quentes de uma partida, mas antes acrescentar valor através dela. É tentar explicar os motivos de uma decisão, o que terá corrido bem e menos bem... e porquê. É passar, com paciência e persistência, a mensagem que arbitrar é uma arte difícil e que analisar jogadas é um desafio constante.  É procurar desmistificar suspeitas, colocando água na fogueira, não ateando fogos deliberadamente. É exemplificar, humanizar e ensinar. É educar.


O comentador de arbitragem não deve, por exemplo, perder tempo a comentar o trabalho de outros comentadores de arbitragem. Mesmo que não goste, mesmo que não concorde, mesmo que deteste. Isso só o descredibiliza enquanto profissional e revela o seu caráter enquanto pessoa. Deve saber controlar os seus fantasmas, resolvê-los, ficar em paz consigo e com os outros... e seguir em frente. E deve aceitar esta segunda fase da sua carreira com um sorriso genuíno e com espírito de missão. Com grandeza, educação e respeito.


Na verdade, a presença de ex-árbitros nos media pode ser tão importante como a de ex-jogadores ou de ex-treinadores. Foram eles que andaram nos relvados, a sentir o jogo e a construir a sua história. E é deles a competência técnica específica, o conhecimento de causa.


Porque, de facto, há espaço para que todos possam contribuir positivamente para uma arbitragem mais compreendida e melhor aceite. O resto são minudências, pequenos fait-divers de que ninguém ouviu falar, com que ninguém se importa e de que, na verdade, ninguém quer saber.