O Bolhão e a Ribeira eram mercados mais compreensíveis
Sempre me fizeram confusão as aberturas e fechos dos mercados de profissionais do futebol. Compreendo que as equipas não possam andar sempre a mudar de jogadores e que, por isso mesmo, seria necessário um espaço temporal para o fazer, uma janela qualquer para se ter essa oportunidade. Acontece que esta janela é selvagem e estranha, cheia de agentes e intermediários, golpes, mentiras e birras. Enfim, um horror.
Quando coloquei no título que os mercados do Bolhão e da Ribeira (que já nem existem enquanto tal) eram mais compreensíveis, foi uma mera figura de retórica. Na verdade, eu pouco frequentei mercados e aqueles onde mais vezes fui foram os do Saldanha e de Algés (o primeiro dos quais desaparecido na sua forma primordial, o segundo adaptado, como tantos outros, a uma espécie de conjunto de restaurantes). De qualquer modo, imaginemos o mercado: eu compro um peixe? Não exatamente. Compro metade do passe do peixe; ou tomo o peixe por empréstimo. Já o osso, que ninguém quer, empresto-o a um pobre de Cristo que vá a passar. O peixe levo-o para casa, mostro-o algumas vezes, digamos que posso provar um bocadinho. Mas ele - por muito que tenha custado não é meu. Por uma cláusula qualquer, pode vir um tubarão e levá-lo. Por isso, os clubes passaram a fazer aquacultura: têm os seus viveiros próprios (academias, chamam-lhe os portugueses; canteras, que é o lugar onde se corta a pedra, chamam-lhes os espanhóis). Sim, parecia boa ideia. O problema é que os tubarões passaram a atacar as academias e levam de lá os miúdos que põem numa prateleira nos seus clubes. Às vezes fazem o favor de os emprestar, outras nem isso. Estão ali. São ativos à espera de oportunidade. Outros tubarões, se veem um jogador dar um jeitinho com mais talento na bola, batem os seus milhões e levam-no. Mais tarde, se ele não render tanto como esperavam, emprestam-no. Quer dizer, emprestam em parte, porque quem toma o empréstimo tem de pagar uma fatia dos custos do homem (foi assim que chegou João Mário ao Sporting). Se um tubarão mais pequeno quiser um ativo, tem de lutar por ele, mas quase sempre perde. E então vai buscar outros, que tem de vender ao seu público como se fosse quase tão bom como o original; e costuma não ser. E lá ficam, para depois serem despachados para outro qualquer.
Mas que raio tem isto a ver com o mercado? Há um ponto em comum, o intermediário, o que mais ganha com menos esforço. E outro que é o vendedor. Quem berra mais alto faz-se ouvir. Uma canseira, portanto. Acabou e ainda bem.
Dos três grandes portugueses, o Porto e o Sporting venderam mais do que compraram. Já o Benfica foi o sexto mais gastador da Europa. Nada terá a ver com a campanha eleitoral, será o que dizem. Mas lá que parece…
Da humilhação à superação
A derrota e consequente afastamento do Sporting de qualquer prova europeia foi um golpe duro. Nem os dois golos geniais, de Nuno Mendes e Nuno Santos em Portimão, obras de arte, sobretudo o primeiro, nos fazem esquecer a humilhação dos 1-4. Bem sei que há atenuantes: a Covid, a ausência do treinador, o que quisermos. Mas foi mau de mais. Sobretudo deu um lampejo do que pode ser a equipa quando as coisas não lhe começam a correr bem, como aconteceu com o LASK e não nas duas vitórias no campeonato.
Sejamos, porém, positivos - e confiemos que a vinda de João Mário é uma mais valia que compensa a perda de Wendel. Das humilhações nascem, muitas vezes, grandes recuperações e vitórias. É o que espero. Porque este conjunto de jogadores tão jovens o merece e porque Rúben Amorim sabe dizer as palavras certas - não sei se os corpos sociais do Sporting também o merecem, mas adiante. Claro que sem um ponta de lança, como queria o treinador, será mais difícil, mas tem de se contar com a prata da casa. Tiago Tomás, Vietto, Sporar e mesmo Luiz Phellype (em quem não creio muito) têm de se superar.
Não vamos esperar milagres desta equipa, nem seria justo fazê-lo, mas queremos superação, ou se preferirem a divisa do Sporting - esforço, dedicação, devoção e glória. Não basta vencer como contra o Portimonense, com os dois golos de antologia, seguidos de um sofrimento próprio de um drama grego.
Honestamente o clube necessita de ser humilde a jogar; esforçado, sério, sem vedetismo e alcançar um lugar na Liga que o coloque na porta da Champions. Falhar esse objetivo é mau. Porque durante mais dois ou três anos é impossível sonhar com o desejo mais profundo de todos os sportinguistas: o campeonato!
A próxima jornada, que ainda vem longe devido à interrupção provocada pelos compromissos da Seleção Nacional, traz-nos um Sporting-Porto. Será um jogo que definirá muito do futuro da nossa equipa. Uma vitória é uma afirmação de que estamos aqui para os primeiros lugares. Um empate ou derrota, dependerá da forma como jogarmos. Se for tipo LASK, pode ser o nosso canto do cisne; acaso não consigamos os três pontos, ainda que com uma exibição forte, unida e convincente, nada estará perdido para o futuro. Mais do que ganhar, que será o ideal, a atitude em campo será decisiva. E nesse aspeto confio em Amorim.
Um clube quebrado
«Matam-se todos uns aos outros lá dentro» disse o Juiz-Conselheiro Baltazar Pinto, presidente da Comissão Fiscal e Disciplinar do Sporting. É verdade. Mas há quem mate mais do que os outros. E há quem não se resguarde e quem queira que assim seja. Há de tudo.
Continuo a insistir que, depois da política justa que o CD teve com certas claques, só há uma maneira de acabar com estas guerras estúpidas, improdutivas e autofágicas: a revisão dos estatutos. A principal forma de unir é comprometer uma maioria significativa dos sócios com os seus dirigentes. Tal é impossível com o sistema eleitoral atual em que uma Direção (como foi o caso da de Varandas) pode ser eleita com 39% dos votantes, o que significa que tem 61% que preferiria outro rumo e outras pessoas. Acresce que, entre esses 39%, haverá quem tenha votado como mal menor. No entanto, entre os que depositaram na urna a sua confiança neste CD, não me parece que seja significativo o número dos que o querem demitir. Já nos que votaram noutras listas… vá-se lá saber.
Varandas teve a sorte de ter um adversário principal com grande elevação e sportinguismo à prova de bala. João Benedito teve mais votantes do que ele (embora menos votos, devido ao sistema de não haver um voto por cabeça, o que é justo e aceite no clube). Não levantou, que eu saiba, qualquer dificuldade à nova Direção. De qualquer modo, imaginemos que haveria uma segunda volta entre Varandas e Benedito. Para vencer essa segunda volta seria fundamental que ambos tentassem pontes com outras candidaturas (os votos de Ricciardi chegariam para dar a vitória a qualquer um deles) e no final um presidente teria muito mais de 50% dos votos. Isto significaria uma maioria em que se tinham estabelecido novas ideias, cedências de parte a parte e uma inequívoca vontade. Claro que, depois desta simples reforma, que anda a ser pedida, outras seriam fundamentais. Nomeadamente a eleição em separado e por método de Hondt do Conselho Fiscal e Disciplinar e, segundo defendo há muito, um órgão de consulta da Direção eleito também proporcionalmente (espécie de senado, mas não com a composição e competências do Conselho Leonino), para onde transitassem diversas competências da AG - como a aprovação de contas. Seria mais democrático e mais claro. Mas isto, eu sei, é pedir muito a um clube que parece comprazer-se em dizer mal de tudo e nunca resolver nada.