O Benfica de amanhã
Qualquer contratação a fazer por esta altura, como já se percebeu, será sempre em condições desfavoráveis para o emblema da águia
DOS três históricos pretendentes ao título português, o Benfica é o que terá o melhor plantel, mas não quer dizer que tenha a melhor equipa. Não é só a classificação atual que o sugere, mas também a demora em arrumar uma casa que peca por excesso de peças de mobiliário e que não raras vezes encaixam mal no desenho da casa encarnada. Preenchem alguns espaços vazios, é certo, geralmente a preços excessivos, embora não acrescentem valor ao grupo, devido à política que tem sido seguida nos últimos anos de comprar avulso para suprir faltas à pressa, uma espécie de navegação de cabotagem, que muito tem contribuído para atrasar a recuperação do prestígio europeu da águia, o qual só poderá ser alcançado quando, definitivamente, a sua administração se capacitar que tem de ser mais rigorosa nas decisões, perder a costa de vista e desafiar o futuro com a coragem e a ousadia dos vencedores.
O tema do momento é a noticiada urgência em encontrar um central seja onde for, lá está, para ocupar o lugar de Lucas Veríssimo, sem se avaliar se é realmente preciso e, se sim, se não haverá uma solução interna que proteja o clube de gastos suplementares. Questão colocada de outra forma: será que dessa aquisição depende o sucesso desportivo do Benfica na presente época, ou, na dúvida, não será mais prudente puxar para cima algum dos jovens em lista de espera no Seixal? Morato não é suficiente? Ferro, definitivamente, é para esquecer? Se sim, resolvam, deem liberdade ao jovem para tratar da sua vida. Por outro lado, Tomás Araújo ainda não tem idade para ser adulto? E Conti, outro mistério, daqueles investimentos insondáveis, não poderá, pelo menos, ser um razoável suplente?
QUALQUER contratação a fazer por esta altura, como já se percebeu, será sempre em condições desfavoráveis para o Benfica, por se situar numa corrente de ar entre a pressão do treinador e a oportunidade de lucro generoso aproveitada por potenciais vendedores. Julgo serem adequadas as dúvidas colocadas sobre a premência do negócio na medida em que não acredito na longevidade do esquema de três centrais tal como foi engendrado por Jorge Jesus.
Dir-me-ão, mas no Sporting resulta. Pois resulta, porque foi um projeto de raiz, arquitetado por Rúben Amorim em três fases: primeira, promoveu ampla observação interna; segunda, sinalizou os lugares em défice; terceira, fez as contratações cirúrgicas de acordo com as possibilidades do clube e as necessidades da equipa. Isto é, houve uma lógica que formatou uma nova identificação do futebol do clube e o conduziu ao título nacional. Além de o treinador leonino não ter por hábito pedir aquilo que não lhe pode ser dado, muito menos alimentar discussões inúteis.
NA edição de A BOLA deste domingo li que a renovação de Grimaldo, que termina contrato em 2023, tem o selo de prioridade. Sendo um jogador com 26 anos e com «mercado internacional» é natural que assim seja. Ao contrário de outro quinteto que igualmente termina contrato no mesmo ano: André Almeida (31 anos), Otamendi (33), Vertonghen (34), Taarabt (32) e Pizzi (32). Dentro de dois anos serão ainda mais trintões e, nesse sentido, compete a Rui Costa gerir a situação com o cuidado que ela impõe, através da relação idade/qualidade/custo.
Sinceramente, é minha convicção de que o mais importante será, a partir de hoje, começar a projetar o Benfica de amanhã, acrescentando juventude irreverente e desejosa de mostrar serviço à experiência bem paga mas de pouco futuro e dessa forma, com método e perspetivas mais abrangentes, ir renovando o quadro de futebolistas, em obediência a um plano desportivo exigente, que continua por definir. Melhor, não sei se alguma vez foi pensado com o mínimo de rigor. Um plano a dois-três anos, com metas a transpor, que seja explicado, os adeptos aprovem e se comprometam, nos bons e maus momentos, a contribuir para o desígnio comum: a águia voar mais alto e chegar mais longe.
SELEÇÃO SEM EQUIPA
ASeleção voltou a falhar, não correspondendo ao que dela se esperava em função da enorme qualidade dos seus jogadores, os quais, apesar de tão prendados na arte de jogar, ainda não foram capazes de formar uma boa equipa.
O nosso selecionador é merecedor de toda a gratidão por ter conduzido Portugal ao título de campeão da Europa, mas a verdade é que, conforme tem sido dito e mil vezes repetido, nunca ninguém olhou para nós como tal.
Este jogo com a Sérvia é apenas mais um exemplo. Não conseguimos impor uma identidade, nem promover uma marca. Assim como não preparamos os jogos em função do riquíssimo talento dos praticantes lusos, que gostam de intimidar e pressionar os adversários para imporem os seus preciosos argumentos ao nível da execução e da leitura de jogo. Em contraposição, Fernando Santos perde tempo demasiado a identificar atributos nos oponentes, de maneira a justificar as suas estratégias acanhadas, que têm como primeiro inconveniente reforçar o moral de quem nos defronta.
Esta ideia de eleger um meio campo com Danilo e João Moutinho, em jogo decisivo, traduz a linha do seu pensamento. E ainda mandou aquecer William Carvalho. Depois dos desempenhos vergonhosos no último Europeu é a prova provada de que prefere fazer de conta a encarar o que realidade tem para lhe mostrar.