Não basta crer, há que provar

OPINIÃO07.10.201802:13

Lendo com atenção a defesa apresentada pela reforçada equipa de advogados do Benfica no caso e-toupeira fica ainda mais claro aquilo que já saltara à vista nos primeiros comunicados emitidos pelo clube da Luz assim que se soube arguido no processo: a estratégia passa, não restem dúvidas, por retirar toda e qualquer conhecimento da SAD sobre os atos ilícitos alegadamente praticados por Paulo Gonçalves. Está lá, em quase todas as 171 páginas do documento: embora acreditando na inocência do seu ex-diretor jurídico, garantem os advogados dos encarnados que se houve crime não teve a SAD nele qualquer participação. Os argumentos são extensos, mas resumem-se numa ideia-chave: não tinha Luís Filipe Vieira de ter conhecimento do que se passava, por poder Paulo Gonçalves dar aquilo que dizem ter dado aos outros arguidos do processo sem para que tal necessitasse do aval do presidente.


Haverá, a partir daqui, quem garanta ser essa tese válida (os benfiquistas) e os que olharão para ela como um conjunto de balelas (todos os outros). Cada um crê no que quer - e a verdade, em especial quando se mete o futebol ao barulho, é quase sempre ditada mais pelo coração do que pela razão. Mas é bom que todos tenham noção de que quando um processo chega aos tribunais não chega acreditar. É preciso provar: o Ministério Público que Luís Filipe Vieira tinha conhecimento das ações imputadas a Paulo Gonçalves, o Benfica o contrário. É isso - e só isso - que irá determinar o rumo do processo. É inegável que o nome do clube da Luz ficará para sempre manchado, mas isso não significa, por si só, que seja culpado.


Os casos não são comparáveis, mas o mesmo se aplica ao que abala Cristiano Ronaldo. As opiniões dividem-se - em especial nas redes sociais, espaço em que gente que não percebe nada sobre nada procura rótulo de especialista em quase tudo - entre os que defendem o capitão da Seleção Nacional e o proclamam como inocente e os que, impiedosos, o apontam como culpado, num julgamento em praça pública em que quase todos assumem, às vezes com argumentos quase ridículos, o papel de juiz. Convenhamos, este caso convida prudência. É natural que os que idolatram Cristiano Ronaldo - e devíamos ser todos, por tudo aquilo que fez pelo futebol português - desejem vê-lo inocentado no final do processo. Acreditar na inocência de alguém não é crime. Mas não vale tudo para proclamarmos essa crença. O mesmo se aplica, claro, aos que (nesse capítulo tem alguma razão Peseiro) só por dele não gostarem lhe apontam o dedo de forma acusatória. Repete-se: acreditar muito numa coisa não a torna necessariamente verdade. Há, portanto, que esperar que a justiça funcione e, até lá, ter cuidado com o que se diz - e escreve. Prudência, lá está. E cautela. Coisas que por cá escasseiam.


Luisão falou anteontem, ao canal do Benfica - é o que há... - sobre o final da carreira. Garantiu o agora retirado central das águias não ter saído magoado com Rui Vitória. Neste caso não é necessário recorrer ao tribunal para decidir, é mesmo, apenas e só, uma questão de crença. Mostrou-se ainda o brasileiro agradecido ao treinador pela «forma frontal» como o tratou. Aqui é, convenhamos, mais fácil acreditar. Primeiro porque não tinha de dizê-lo - ninguém lhe apontará, de certeza, uma pistola à cabeça -, segundo porque é difícil conceber que Rui Vitória transformasse Luisão - jogador com 15 anos de ligação ao clube, com estatuto de capitão e o mais titulado futebolista da história do clube da Luz - em quinto central sem que lho dissesse na cara. Acharia Luisão que ainda poderia ser útil? É provável. É até humano que assim seja. Mas não parece ter feito do adeus um drama. Nem ele merecia que assim fosse.