Nada será como dantes!...

OPINIÃO21.03.202001:00

Nunca imaginei vir a escrever em estado de emergência, e, muito menos, pelas razões por que foi decretado. Tenho vindo a falar e a escrever sobre a mudança de vida dos clubes portugueses e, designadamente, do Sporting e da sua sociedade anónima desportiva, e, afinal, de repente, mudámos todos - o mundo todo -  a nossa vida, e vamos ter de a mudar num futuro breve!
Nasci quase a meio do século passado, e recordo, quando menino, das histórias e romances do escritor francês Júlio Verne, apresentadas de diversas maneiras, nomeadamente, de um romance de 1865, intitulado Da terra à lua. Trata-se de um romance de ficção cientifica que, resumidamente, era uma história de quem queria chegar à lua. Ficção era e é isso mesmo, uma história inventada, produto da imaginação fundada nos progressos científicos e tecnológicos. Pouco mais de cem anos decorridos sobre o dito romance, estava eu no quarto ano da Faculdade de Direito de Lisboa - 20 de Julho de 1969 - chegavam a lua os dois primeiros homens, tripulantes da Apolo 11: Neil Armstrong e Buzz Aldrin! A fantasia tornou-se realidade! E, a partir daí tudo era possível imaginar.
Desde a minha infância e até hoje muitas foram as histórias de ficção científica que o cinema e a televisão, e mesmo a literatura, trouxeram até nós -  criações artísticas baseadas na imaginação dos progressos científicos e tecnológicos. É sabido que a acção gira, normalmente, em torno de um grande leque de temas, como viagens espaciais, viagens no tempo, mundos paralelos, mudanças climáticas, vida extraterrestres, etc. Todos nos lembramos dos filmes de James Bond, como por exemplo, Moonraker (007 - Aventura no Espaço), que retrata uma aventura deste no espaço sideral em que o agente secreto tem por missão destruir cúpulas de orquídeas negras que, se entrassem na terra, causariam o fim da humanidade; e outros filmes com este e outros personagens que lutam contra a criação e propagação de vírus e dos seus antídotos. Julgo que poucos se deram conta, não obstante o progresso da ciência e da tecnologia, que um dia isto se tornaria na realidade que estamos hoje a viver.
O que noutro tempo imaginámos em função do progresso da ciência e da tecnologia tornou-se realidade, e uma realidade que nem sempre segue o melhor caminho. Vive-se um tempo dos vírus: dos que infectam o nosso corpo e nos levam à morte física; dos que infectam também a mente, e em consequência, o carácter e a personalidade, que nos conduz à degradação nos princípios e valores.
Hoje, a humanidade combate um vírus que vai causar muitas mortes e, provavelmente, um desastre económico sem precedentes. Mas a humanidade também tem de enfrentar os vários vírus que são transmitidos pelas tecnologias que todos nós admiramos pela sua utilidade, sobretudo no que diz respeito à informação, mas que são mortais para uma sociedade que se queira reger por princípios e valores. Tal como o Covid-19 são inimigos cujo rosto se desconhece. São os vírus da desonestidade, intelectual e material, os do insulto e da difamação, os do boato e do anonimato cobarde, que corroem a moral e a ética, a democracia e a liberdade!
Já disse, noutra circunstância, que o meu tempo acabou. Mas outro tempo vai começar para mim, como para todos, mesmo para aqueles que entendem que ainda têm tempo para viver este tempo. Tenho a certeza que vamos encontrar o antídoto para o vírus que nos apoquenta, mas outros virão para o corpo e para o espírito. Como estou seguro que nada será como dantes!...

Romeu Branco - a referência que fica!

ERA o sócio n.º 243 do Sporting Clube de Portugal e isso já falaria bastante da sua fidelidade e devoção à causa leonina. Mas nascido a 21 de Outubro de 1923, quando o clube existia há apenas 17 anos, obviamente que a sua vida se funde com a do Sporting, clube que amou e ao qual se dedicou com esforço e dedicação, vivendo os momentos de glória - e foram muitos - da nossa história, para os quais contribuiu. E nos momentos menos bons também esteve sempre na linha da frente, combatendo pela defesa dos valores e princípios do clube.
Para os mais velhos convém recordar, e aos mais novos convém saber, alguns pontos objectivos do seu currículo: ingressou na Direcção no biénio 1954/1956 (os mandatos eram de dois anos), como dirigente da secção de atletismo; nos dois anos seguintes foi director da Associação de Atletismo de Lisboa; regressou à Direcção do clube em 1959/1960 e de 1965 a 1969 foi secretário-geral da Comissão Directiva do clube; integrou o Conselho Geral de 1962 a 1969; de 1969 a 1973 e de 1976 a 1978 foi vice-presidente para o Secretariado Geral; de 1969 a 1978 e de 1997 a 2009 foi membro do Conselho Leonino. Foi distinguido com o Prémio Stromp Dirigente do Ano em 1971, e a partir 1977 passou a integrar o Grupo Stromp, tendo sido Presidente em 1984, 1997 e 1998. O Sporting Clube de Portugal também o soube distinguir: em 1961, com a Medalha de Mérito e Dedicação e com o Leão de Ouro, em 1971.
Dos cargos que exerceu, e que por si só falam da esforço, dedicação e devoção com que serviu o clube, recordo o de vice-presidente para o Secretariado-Geral, porque tem para mim um significado muito especial. Na verdade, faz este ano quarenta anos que iniciei a minha vida de dirigente desportivo, isto é, que fui designado por João Rocha, para integrar a sua Direcção como vice-presidente para o Secretariado-Geral, no mandato de 1980/1981 e 1981/1982. Eu tinha 33 anos e ele quase 57, e lembro-me bem de ele se ter dirigido a mim salientando o facto de ter sido o último cargo que tinha exercido na Direcção do Sporting e dando-me concelhos úteis. Devo dizer, e sem complexos de que me chamem antiquado, com um paternalismo que sempre mereceu a minha gratidão, e que sempre atenuava as minhas discordâncias - algumas - com ele.
Com efeito, a minha intransigência e teimosia chocavam-se algumas vezes com a intransigência e teimosia do Romeu Branco. E não era um choque de feitios ou gerações, mas, pura e simplesmente, um choque de convicções. E este aspecto é aquele que guardo na minha memória como referência deste Homem - a convicção! De resto, guardo o carinho com que tratava a minha mulher a quem dizia com um sorriso provocador e amigo: «não sei como consegue aturar o mau feitio do seu marido»!
Que saudades eu já tinha do seu convívio, porque há muito tempo o não via e a última vez que falámos pelo telefone foi em Dezembro passado. Que saudades eu tenho e vou ter que não me fale mais do meu mau feitio, de que o meu Amigo, ao fim e ao cabo, gostava. Um dia vai ter de me aturar outra vez. Até lá, descanse em paz! Fico-lhe grato pela referência que me deixa!...