‘Murphy’ contratado para Alvalade

OPINIÃO01.10.201901:17

1 - Não tenho por hábito debruçar-me demoradamente sobre assuntos da vida interna de outros clubes, que não os do meu Benfica. Mas, perante o que se vem passando no Sporting, entendi abrir uma excepção.
Para tal, socorro-me do que ficou conhecido por Lei de Murphy, sintetizada na frase se alguma coisa puder correr mal, então vai mesmo correr mal.
O engenheiro aeroespacial americano, Edward Aloysius Murphy foi, curiosamente, a primeira vítima da lei com o seu nome. Mesmo assim, houve quem dissesse que Murphy era optimista, de tal modo que, em jeito mais humorista, o escritor britânico Arthur Clarke formulou um ainda mais pessimista conjunto de leis, como, por exemplo, a de que ler manuais de computador sem o hardware é tão frustrante quanto ler manuais sobre sexo sem o software.
Vejamos alguns exemplos de Murphy, que talvez nos digam algo sobre a agitação no clube leonino, entre azar, infelicidade, incapacidade, incompetência, inexperiência, engano, distracção, acaso ou tudo em conjunto.
Se deitamos fora alguma coisa que temos há muito tempo, vamos precisar logo dela. Ora, se substituirmos coisa por pessoa, vem-me logo à cabeça Bas Dost.
Entre dois acontecimentos prováveis, sempre acontece um improvável. O jogador Coates personifica tal asserção. Entre dois autogolos, três penáltis.
A fila do lado anda sempre mais rapidamente. Sobretudo a dos eternos rivais, que é como quem diz, a nossa crise é tão mais forte quanto mais não houver crises destas nos outros.
Ninguém está a ouvir uma pessoa, até ao momento em que ela comete um erro. Eis o grande problema do actual líder sportinguista. Fala pouco e parece ser pouco ouvido, mas quando, ainda na pré-época, afirmou peremptoriamente «acreditem no Sporting, para neste sítio onde estamos (relvado de Alvalade), a partir de Agosto, de 15 em 15 dias, tornarmos este estádio um verdadeiro inferno», o povão jamais esqueceu tal premonição.
Quando um trabalho é mal feito, qualquer tentativa de melhorá-lo acaba por o piorar. Parece que é o que se tem passado com sucessivas pré-épocas que estão a acontecer pela época propriamente dita adentro.
Se está escrito «tamanho único», é porque não nos serve. Tamanho (entenda-se aqui, preço) único para transferir Bruno Fernandes deu no que deu: situação financeira mais constrangida, demora na construção definitiva do plantel, empréstimos à pressa no último dia do mercado e o referido craque a perder a cabeça por todo o lado e circunstâncias.
Por mais tomadas que se tenham em casa, os móveis estão sempre na frente delas. É o que associo aos fanáticos nostálgicos do consulado Bruno de Carvalho, às claques para as quais - diga-se em abono da justiça - o actual presidente tomou as necessárias medidas, e, também, à catrefada de opinadores e comentadores sportinguistas, que desunem mais do que unem.
Quando nos telefonam, uma de três coisas acontece: se temos caneta, não temos papel; se temos papel, não temos caneta; e se dissermos que temos caneta e papel ninguém nos telefona. Se em vez de caneta, falarmos de Bruno Fernandes, se em vez de papel pensarmos em papel-moeda, percebe-se por que razão, no caso em apreço, nenhum clube, intermediário ou agente ligou ao Dr. Varandas, para levar o atleta para outro clube, por ser tanto o papel(-moeda) pedido.
Quando o pão com manteiga cai no chão, o lado da manteiga está sempre virado para baixo. Azar, sem dúvida. Veja-se o jogo da Taça da Liga. A equipa até criou muitas oportunidades de golo, só faltou quem as marcasse (e voltamos a Bas Dost).
Se está à espera que o corte seja transitório, ele vai ser definitivo. Isto tem a ver com a (falta) de paciência do clube, diga-se, aliás, de todos os clubes. Dizer-se que, nos próximos tempos, não se vai ser campeão é desportivamente incorrecto, logo não se diz, e querer-se afirmar como candidato na pole position é meio-caminho andado para nada ganhar.
Se acha que há quatro maneiras de uma coisa correr mal e se as ultrapassar, uma quinta possibilidade aparecerá imediatamente. Por isso, tudo focado no desempenho do agora quinto técnico da era Varandas, Jorge Silas. Além disso, houve o quinto golo do Benfica na Supertaça, cujo resultado o presidente do SCP resumiu numa frase: «Estou muito chateado, mas não estejam preocupados.»
Quando um trabalho é mal feito, qualquer tentativa de o rectificar, em vez de melhorá-lo piora. Que o diga o desamparado Leonel Pontes.
O orçamento necessário é sempre o dobro do previsto. O tempo necessário é o triplo. Também aqui, os recursos sempre mais escassos - dinheiro e tempo - são adversários da lógica do imediato.
As variáveis variam menos que as constantes. Assim poderia concluir uma empresa de consultadoria ao analisar o tempo presente e a última década do Sporting.
As porcas que sobraram de um trabalho nunca se encaixam nos parafusos que também sobraram. Cada qual dará, no caso leonino, o nome às porcas e aos parafusos.
Se se está sentindo bem, não se preocupe. Isso passa. Tudo o que começa bem, termina mal. Tudo o que começa mal, termina pior. Exemplifique-se, quanto à primeira parte da regra, com a despedida de Peseiro e de Keizer e quanto à segunda parte, com a interinidade de Leonel Pontes.
Lembro-me, ainda de uma lacónica lei de Murphy por que todos já passámos quando compramos um electrodoméstico ou coisa semelhante: «Pilhas não incluídas». Um azar dos diabos, sejam elas alcalinas ou secas, ou de outra natureza desportiva.
Termino com duas considerações à Murphy, apesar de tudo esperançosas: a única forma de descobrir os limites do possível é ultrapassá-los em direcção ao impossível. Ou esta: Tudo é possível, apenas não muito provável.

2 - Vitória tangencial sobre um Vitória e empate conformado sobre outro Vitória, eis a semana futebolística do Benfica. É visível algum decréscimo de eficácia e de jogo esclarecido. Aliás, numa prova longa, qualquer campeão passa sempre por estas fases menos conseguidas, na esperança de que a seguir o ciclo seja ascendente. Daí a importância de valorizar as vitórias, quer em Moreira de Cónegos, quer contra os sadinos, bem como a consistência defensiva (nos sete jogos do campeonato, não sofreu golos em cinco). Esta longa paragem do campeonato pode, nesse sentido, ser proveitosa, quanto mais não seja para ter todo o plantel à disposição (com a excepção de Chiquinho) para o recomeço daqui a um mês! Até lá … dois jogos cruciais para a Champions.
No comando, continua um improvável Famalicão, que já leva mais 11 pontos do que o Sp. de Braga e - no momento em que escrevo, sem saber o resultado do SCP - com, no mínimo, mais 8 pontos do que os leões. Ainda sem derrotas e com o melhor ataque, a par do Benfica e do Porto. Também é de novidades destas que o nosso remediado campeonato necessita.

3 - Mais uma gala para atribuir prémios gold para os artistas da bola. Confesso que já são tantas que, nem como uma cábula, as consigo distinguir. As festarolas são cada vez mais passadas a papel químico umas das outras, ainda que, às vezes, haja uns intrusos que perturbam a normalidade da sociedade Ronaldo & Messi. No ano passado, Modric, este ano Virgil van Dijk. A coisa tem sido de tal forma que se tornou quase patologicamente chauvinista. Uns pelo Ronaldo, outros pelo Messi, outros ainda por nenhum deles. Na última gala, Messi ganhou e Ronaldo escafedeu-se, embora, em Turim, estivesse bem perto do mítico Lo Scala de Milão. Ganhar é saboroso, mas não ganhar também pode ser honroso. Confesso, ainda, a discordância quanto à contabilidade que se releva para comparar candidatos. Ter ganho mais títulos e troféus do que outros (este ano, com Messi, até não foi bem assim…). Quer isto dizer que um notável jogador numa equipa que não ganha troféus internacionais, ou que seja da selecção de País de Gales, Escócia ou Montenegro, por exemplo, jamais pode ousar sonhar com uma qualquer Bola de Ouro. Elegem-se individualidades em função de sociedades. E das duas, uma: ou se enaltece o football association e não há a corrida individual de egos, ou se premeiam jogadores, mas não se têm as conquistas do grupo como primeiro e decisivo critério.