Muito mais do que um empate

OPINIÃO08.06.202004:00

A retoma do campeonato ficou marcada por um dado curioso: nenhum dos quatro grandes conseguiu ganhar. Surpresas maiores, sem dúvidas, a derrota do FC Porto em Famalicão e o empate do Benfica, na Luz, frente ao Tondela. E logo houve quem para elas encontrasse explicações elaboradas: os quase três meses de paragem - como se os jogadores do Famalicão e do Tondela não tivessem, também eles, estado parados - e a ausência de público - o que, no caso do Benfica ou de qualquer outro grande que jogue em casa, se pode levar em conta, porque é, efetivamente, mais confortável para o adversário jogar num estádio às moscas do que com 40, 50 ou 60 mil pessoas nas bancadas. Ainda assim, e dito isto, há uma realidade indesmentível que torna absolutamente inúteis quaisquer desculpas para os tropeções dos (agora) dois líderes: seja em que circunstância for, FC Porto e Benfica teriam, sempre, obrigação de ganhar a Famalicão e Tondela. Não ganharam porque não foram competentes. Simples.

PROVOCOU mais mossa o empate com o Tondela ao Benfica do que a derrota em Famalicão ao FC Porto. Percebe-se que assim seja. Por várias razões. Primeiro, porque mesmo perdendo, o conjunto de Conceição segurou a liderança - mesmo que, por agora, apenas virtual - e a verdade é que ser campeão com um ponto de avanço é o mesmo que ser campeão com os mesmos pontos do adversário. Segundo, porque a igualdade cedida pela equipa de Bruno Lage não foi só um empate. Foi muito mais do que isso.

Foi, antes de mais, uma oportunidade perdida (e veremos se não única) de recuperar a liderança. E foi, acima de tudo, uma oportunidade desperdiçada, por treinadores e jogadores, de mostrarem que os problemas evidenciados nas semanas antes de parar o campeonato estavam, em definitivo, ultrapassados. Não estão, como se percebeu. Pelo contrário. E isso será, porventura, o que de momento mais preocupa os benfiquistas.

Bruno Lage anda há demasiado tempo a dizer que o problema está identificado. E se, há uns meses, tinha a desculpa da cadência de jogos para justificar a ausência de
melhorias, terão os adeptos pensado que a paragem forçada poderia, afinal, ser mais benéfica para o Benfica do que para o FC Porto. Era essa, aliás, a expectativa geral. Até porque neste período Lage recuperou André Almeida e Gabriel, duas peças importantíssimas na equipa. E o FC Porto até perdeu, pelo meio, Marcano.
Pensou-se, e é legítimo que se pensasse, que o Benfica voltaria da paragem mais forte. Para aumentar ainda mais a expectativa, na noite antes do regresso do Benfica à competição o FC Porto caiu em Famalicão. Estavam, parecia, criadas as condições para a tempestade perfeita. Só que faltou aquilo de que todos pareciam estar certos: o Benfica voltar mais forte. Não voltou. Voltou na mesma. Com os mesmos problemas que o fizeram desbaratar uma liderança de sete pontos. Com a mesma dinâmica (?) de um meio-campo que com Weigl e Gabriel já mostrara não funcionar - alguém se lembra que foi com Gabriel e Taarabt que a águia voou a sério?... - e com um mesmo proscrito (Cervi, de repente dispensável) para que Taarabt (de repente imprescindível, seja em que posição for) pudesse jogar a 10, encostando Rafa (de repente incapaz, para Lage, de jogar nas costas do ponta de lança) à esquerda. É, percebe-se, mais do mesmo. E se o mesmo não chegava há três meses é normal que também não chegue agora. Percebe-se a frustração dos benfiquistas e de Luís Filipe Vieira: foram, pelos vistos, três meses perdidos…

VIEIRA deu conta dessa frustração com um raspanete a Lage e aos jogadores. Dizem os relatos que os jogadores não gostaram e, sejamos sinceros, têm razões para não ter gostado do timimg escolhido pelo presidente tendo em conta aquilo que viveram no regresso ao Seixal. Nesse capítulo Vieira deu um tiro nos pés. No mais, não se compreendem as razões para o incómodo do balneário encarnado. Só pelo facto de ter mantido os salários por inteiro quando a tendência geral era reduzi-los, Vieira tem mais legitimidade do que qualquer outro presidente para exigir mais a jogadores e treinadores. Não saber que ter condições privilegiadas traz consigo um acréscimo de responsabilidade é estar, de todo, desfasado da realidade.