Mil milhões de euros!

OPINIÃO03.08.202206:30

Dinheiro que os clubes da Premier League investiram para a época nova apenas até… 16 de julho. E não, não é um recorde mundial!

HÁ guerra na Europa, a inflação apresenta-se galo- pante e tem potencial capaz de arrasar até as economias mais saudáveis, a (maldita...) pandemia ainda não é endemia e o futebol comporta-se como se vivêssemos tempos normais. Não são! Se necessitássemos de prova da demência, ei-la: até 16 de julho, só os 20 clubes que competem na Premier League investiram (mais de) 1000 milhões de euros em transferências para a temporada nova do campeonato nacional mais atrativo, mediático e interessante do desporto-rei.

Não, não é recorde mundial! A Premier League atingiu esta fasquia pelo 9.º ano consecutivo, mas nunca tão rapidamente como em 2022, e não igualou (ainda) a proeza da La Liga no verão de 2019, que chegou àquele número ainda mais depressa, a 14 de julho, com as contratações milionárias então protagonizadas pelos pesos pesados Real Madrid (Eden Hazard, Éder Militão e Luka Jovic), Barcelona (Fren- kie de Jong e Antoine Griezmann) e Atlético Madrid (João Félix).

O mercado de transferências até acelerou, não travou, desde 16 de julho, mas o facto não muda o fundamental: no futebol, Premier League sem adversários. Até àquela data, os 20 clubes do campeonato de Inglaterra movimentaram (muitíssimo) mais dinheiro do que Bundesliga (Alemanha), La Liga (Espanha) e Serie A (Itália) combinadas. Duvidando da resistência desta indústria aos impactos do Covid-19, que demonstração de capacidade!

A Premier League, neste arranque de 2022/2023, não derrubou o recorde da La Liga na velocidade de transposição da barreira dos 1000 milhões de euros, mas tem o recorde debaixo de olho: durante o verão de 2017, em transferências, os 20 emblemas do campeonato mais excitante e mediático do planeta futebol gastaram 1600 milhões de euros, mais euro, menos euro. Outro facto relevante: até ontem, dia 2, três clubes transpuseram a fasquia dos 200 milhões, Manchester City (292,3), Arsenal (248,7) e Tottenham (200,6), e mais cinco superaram a dos 100, Chelsea (191), Aston Villa (129), Manchester United (126), Leeds (110,4) e o novo primodivisionário Nottingham Forest (104,85)! Curiosamente, o Liverpool assinou a contratação mais cara do ano (75 milhões já pagos ao Benfica pela compra do internacional uruguaio Darwin Núñez), mas apresenta-se algo mais moderado nos investimentos: no total, até ao momento, 88 milhões.

O recorde de 2017 dificilmente sobreviverá a este verão e a próxima barreira a derrubar é a dos 2000 milhões. Um absurdo! A abundância de dinheiro na Premier League não resulta somente das fortunas dos proprietários dos clubes, nem mesmo de clubes-estado como o Man. City (Abu Dhabi) e o Newcastle (Arábia Saudita), o novo-rico da Liga. E o segredo nem sequer é segredo, conhecendo a dimensão das receitas associadas aos direitos de TV, que são distribuídas de forma equitativa q.b. por todos os participantes na competição: no período 2022-2025, mais de 10.000 milhões de euros!

Em Portugal, numa Liga que vale 1,13 mil milhões de euros, contra os 9,24 da Premier League, os 4,94 da La Liga, os 4,51 da Serie, os 4,16 da Bundesliga e os 3,41 da Ligue 1, discute-se (ainda?!...) a centralização dos direitos televisivos dos campeonatos profissionais. Em fevereiro de 2021, o Conselho de Ministros fez mais do que aprová-la: determinou que a fórmula tem de estar implementada até ao início de 2028/2029. Pouco tempo depois, a Liga criou empresa para acelerar o processo negocial, com o objetivo de tornar possível a implementação da fórmula antes do programado (2023/2024).

Mas, num futebol com três clubes dominantes, Federação e Liga incapazes de moderá-los e operadores televisivos com créditos/poderes  a mais, consenso pouco provável. Nas decisões dos primeiros títulos de 2022/2023, City contra Liverpool, Bayern contra RB Leipzig, Ajax contra PSV, FC Porto contra o pouco que sobrava da versão 2021/2022 do Tondela.