Mattia Perin, o guarda redes à condição
PROVAVELMENTE já ninguém fora do Parque Jurássico se lembra de uma personagem de novela brasileira que dava pelo nome de senhorzinho Malta e que perguntava insistentemente: « tou certo ou tou errado?». É essa a pergunta que a mim próprio faço quando penso um bocadinho nesta nova novela do surrealismo nacional e que tem por título Perin, um guarda redes à condição.
Já, ontem, o João Bonzinho refletia sobre o caso, mas eu não consegui resistir à tentação de a ele voltar, até porque a história deveria entrar para o guiness das maiores aberrações deste triste e pardacento defeso.
Em primeiro lugar, saudou-se a ideia tornada oficial pelo Benfica de que Bruno Lage precisava de um guarda-redes forte, competente, capaz de rimar com a ambição que o clube começa a manifestar ter. E isso foi celebrado. Por norma, o Benfica tem sido lento na reação à perda, desleixado na análise das prioridades do plantel, destituído de rigor na oportunidade da aquisição de reforços, que se afirmem como tal, aliás, na razão inversa da manifesta capacidade de negociar na área da exportação.
Desta vez, porém, o Benfica parecia estar decidido a mudar de maus hábitos. Achou que Vlachodimos é um guarda-redes interessante, mas com deficiências estruturais e que se manifestam, essencialmente, por fraca qualidade no jogo com os pés e por uma notória fragilidade nos lances fora da zona de baliza. Ou seja: para uma grande equipa, seria necessário um guarda-redes de grande dimensão internacional e não, apenas, um guarda-redes capaz de remediar nas competições caseiras. E o Benfica, com toda a sua multiplicidade de competências para escolher bem, escolheu um guarda redes que sabia estar lesionado, mas que não sabia estar TÃO LESIONADO! que só deverá regressar à baliza em...2020.
Depois de uma chegada animada a Lisboa, o Benfica levou o rapaz ao departamento clínico e percebeu que, afinal, não podia contar com o seu novo guarda redes para Setembro, mas teria de ter a paciência de esperar, pelo menos, mais quatro meses.
Tocaram todas as campainhas de alarme. Em finais de dezembro, o campeonato está mais ou menos apontado e a Champions decidida quanto a ficar pelo caminho, passar para a Liga Europa ou ganhar o prémio sonhado de chegar aos oitavos de final.
O que seria normal fazer nestas situações? Enviar o guarda-redes para casa, pagar-lhe o bilhete de volta, dar-lhe um abraço de solidariedade e desejar-lhe um bom futuro noutras paragens. Depois, partir à descoberta de um outro guarda redes, que servisse as pretensões do Benfica, uma vez que dificilmente o mercado de bons guarda-redes se esgotaria na Juventus ou, até, em Itália.
Mas o Benfica preferiu a decisão mais imprevisível. Deixar Mattia Perin ir para casa curar-se e garantir-lhe uma contratação na janela de inverno para, então, ocupar a baliza do Benfica.
Natural o sorriso de satisfação do guarda-redes convalescente à partida de Lisboa. Uma sorte assim, de encontrar um clube tão compreensivo, é de celebrar com um bom vinho de Piemonte ou da Toscânia.
Entretanto, enquanto Perin partiu em missão de recuperação clínica, o Benfica partiu em missão de recuperação psicológica de Vlachodimos, tentando explicar ao guarda-redes descartado que, afinal, ele é que é o verdadeiro domo da baliza. Não é fácil o sucesso da missão e, a acontecer, não se saberá se tal sucesso poderá ocorrer antes do previsto sucesso da recuperação do italiano. Ou seja: neste momento, o maior e mais grave problema da equipa do Benfica é o guarda-redes.