Lage tem de ser um Mourinho

OPINIÃO22.10.201904:00

NA semana em que regressam as competições europeias os  jogadores  das equipas portuguesas estão bem. Podem sentir-se enfastiados, por ausência prolongada de competição, entrecortada pelos jogos de seleções e apenas para os que tiveram esse privilégio,  mas cansados, não, felizmente.
O Benfica, como único representante luso na Liga dos Campeões, é o primeiro a entrar em cena, amanhã, no seu estádio, diante de um Lyon às aranhas, atual 17.º classificado na Liga francesa, a quem  está obrigado a ganhar, por respeito ao estatuto europeu da águia e, sobretudo, para manter viva a esperança de chegar aos oitavos de final, um dos objetivos  desportivos proclamados por Luís Filipe Vieira e que, por excesso de ambição, dizem, tem sido gozado à tripa-forra por causa da sucessão de maus resultados, que se explicam pela discutível competência de jogadores com mais elevado estatuto e, talvez, pela vertiginosa ascensão de um treinador cujos méritos não se contestam, mas que, admito, ao chegar demasiado alto e depressa, se tornou imprudente ao ponto de  admitir que, apesar de noviço na função, já terá crédito para errar e perder. Não tem, principalmente a este nível, porque os adeptos não vão esquecer nunca o vergonhoso  legado de Rui Vitória que colocou o Benfica nas bocas do mundo pelos piores motivos, ser o último de entre os 32 clubes que participaram na edição de há dois anos: seis jogos, seis derrotas, um golo marcado e 14 sofridos. Na presente edição o quadro é menos  deprimente, mas, muito cuidado, porque, nesta altura, no universo dos oito grupos da Champions, com dois jogos e duas derrotas, além do Benfica, apenas se assinalam Atalanta, Leverkusen e Lille.

HÁ duas semanas escrevi neste espaço que, sendo Pizzi e Rafa Silva as principais referências da  equipa encarnada e segundas ou terceiras escolhas da Seleção, alguma defeituosa avaliação prejudicou construção de um coletivo que se queria forte e que, afinal, se tem  revelado  mais vulgar do que o anterior.  
A derrota sofrida com o FC Porto, ainda por cima na Luz,  estragou tudo, ao colidir com o que de agradável o Benfica produziu na pré-temporada (vitória na International Champions Cup)  e se prolongou por agosto, com  triunfo na Supertaça e estreia empolgante na Liga (duas vezes 5-0, ao Sporting e ao Paços de Ferreira). O desfecho daquele clássico, porém, encolheu drasticamente a margem de tolerância, porque é assim que se vive o futebol, e Bruno Lage sentiu-se obrigado a reinventar a filosofia de jogo da equipa, com o mesmo plantel, sim, mas com novas ideias, e não através de experiências  repetidas e  adaptações gastas que só podem conduzir ao fracasso:  foi assim com o Leipzig e, mais cruel, com o  Zenit, por isso o presidente confessou a sua vergonha. Além de, como Lage compreenderá, a eliminação com o Eintracht Frankfurt, na época passada, tal como aconteceu, ter provocado desconforto atroz, principalmente pela ligeireza, não há outro termo, com que foi abordada a segunda mão.

NO jogo com o Lyon o Benfica tem de ser competente, mostrar capacidade de sofrimento, espírito de luta e de entreajuda e, de uma vez por todas, deve  haver  coragem na identificação e responsabilização de jogadores que, sendo  fortes com os fracos e se amedrontam com os fortes, não justificam  o que recebem, que é muito, nem as mordomias com que são tratados, ao nível do que melhor se pratica.  
Em todas as circunstâncias, deve ser máxima a exigência do treinador, contratado para corresponder aos anseios da massa adepta, com vitórias e títulos, e não para receber elogios dos jogadores, razão pela qual me pareceu um inopinado exagero classificar de tremenda a atitude que tiveram no jogo com o Cova da Piedade.
De atitude tremenda precisa o Benfica amanhã, verdadeiramente tremenda, porque se for idêntica à que se viu na Piedade, diante de um oponente menor, não é previsível que o Estádio da Luz volte a reviver o ambiente das  grande noites europeias. Tantas  na sua história, embora cada vez menos…
Por outro lado, o treinador da águia, pessoa culta, que ouve notícias, lê jornais e gosta de andar informado, com certeza que já se deu conta que o fantasma do costume volta a atacar e, até ver, com  mais força. A única forma de o afastar é ganhar mais.  O que nem  é difícil. Bruno Lage até está em vantagem, mas não chega. Para consumo interno, já dizia Mário Wilson, qualquer treinador se arrisca a ser campeão no Benfica. O segredo estará  em descobrir um Mourinho que aceite o desafio de lhe devolver a dimensão europeia que durante três décadas exibiu com reconhecido mérito e o tornou um emblema ainda hoje respeitado e admirado em todo o mundo.

NA quinta-feira há Liga Europa. Acredito que FC Porto, Sporting e SC Braga vão passar à fase de eliminatórias. Ao Vitória de Guimarães tocou-lhe a fava, mas a visita ao Arsenal deve ser festejada. Prestigia o clube e os seus jogadores vão adorar exibir-se no relvado do Estádio Emirates.