José Sócrates e o ministério do Desporto!

OPINIÃO10.04.202106:05

Meter a discussão da disciplina e da arbitragem no Conselho de Ministros seria inolvidável, do ponto de vista do ridículo

P ARA quem se interessa pela política e pelas coisas do direito e da justiça, teve ontem grande dificuldade em desviar a sua atenção do tema mais importante do dia: a Operação Marquês!
Não se tratou, evidentemente, de saber se os sportinguistas irão ou não à Praça Marquês de Pombal comemorar o título da época de 2020/2021, mas sim se o ex-primeiro-ministro José Sócrates e outras individualidades vão ou não a julgamento e por que crimes!
Curiosamente, quando na manhã de ontem passava a vista sobre as notícias e artigos de opinião dos jornais desportivos, deparei com a habitual coluna, num jornal da concorrência, do ex-furriel e actual presidente do sindicato dos treinadores de futebol, mais conhecido por Associação Nacional dos Treinadores de Futebol (ANTF).
Tal artigo aborda mais um vez a questão da necessidade da criação de um ministério do Desporto, necessidade essa que normalmente é defendida pelos homens do futebol, e do futebol profissional, que hoje em dia se afasta bastante daquilo que pensamos ser o desporto - prática regular de uma actividade que requer exercício corporal e que obedece a determinadas regras, para lazer, para desenvolvimento físico ou para demonstrar agilidade, destreza ou força.
A curiosidade é que, se a memória me não atraiçoa, a última vez que a criação de um tal ministério esteve em cima da mesa foi na campanha eleitoral das eleições que conduziram José Sócrates a primeiro-ministro, que não foi, no dia de ontem, o protagonista, porque o protagonismo foi assumido pelo juiz Ivo Rosa.
Na verdade, recordo-me que durante essa campanha, Sócrates anunciou a sua intenção de retomar a ideia da criação do ministério do Desporto, ideia que penso apenas foi executada quando da organização do XIV Governo Constitucional, liderado por António Guterres, tendo sido ministros Armando Vara (ora preso) e José Lello (já falecido). A convite do meu amigo Laurentino Dias, que se dizia ir ser o ocupante desse ministério do Desporto, e que viria a ser secretário de Estado da Juventude e do Desporto do XVII Governo Constitucional (e do XVIII), participei numa sessão de esclarecimento de José Sócrates com homens e mulheres do desporto, não obstante não ser adepto do Partido Socialista, mas antes militante do PSD.
Quando chegou a minha vez de falar, interpelei José Sócrates sobre se confirmava ser sua intenção a criação de novo do ministério do Desporto, ao que ele respondeu afirmativamente com segurança. Disse-lhe então que a maior asneira que ele poderia cometer era levar o desporto, e muito particularmente o futebol, para o Conselho de Ministros, e que o achava suficientemente inteligente e conhecedor do ambiente para nem sequer ter de fundamentar a minha afirmação. Com a sua habitual arrogância retorquiu que mantinha a sua intenção. Sentei-me e não intervim mais!
No final, com enorme simpatia abeirou-se de mim e afastando-se de todos os que o rodeavam, disse-me: diga-me em que se fundamenta o conselho que me deu. Não vou dizer o que lhe disse, não obstante hoje ter pouca simpatia pela sua pessoa. Ouviu das minhas razões, despediu-se e agradeceu a frontalidade com que tinha falado. Como facilmente se pode constatar não houve ministério do Desporto, mas sim secretário de Estado da Juventude e do Desporto, na dependência do primeiro-ministro.
Acho que o Desporto ficou a ganhar e, em minha opinião, Laurentino Dias fez um trabalho, como secretário de Estado, que se calhar não teria feito como ministro. Gostei muito de colaborar com ele e reforcei a minha amizade com ele. Sem partidarite ou clubite!
O futebol, e o futebol profissional, é transversal a todos os ministérios e a todos os sectores, mas é vivido em Portugal sempre na perspectiva básica do clube de que somos adeptos, de uma forma tendenciosa e de defesa dos interesses pessoais. Meter a discussão da disciplina e da arbitragem no Conselho de Ministros seria uma experiência provavelmente inolvidável, do ponto de vista do ridículo.


UM ÁRBITRO COM DUAS CARAS 

H Á quem diga que é, na actualidade, o melhor árbitro português. Como não sei, nem conheço, quem é o melhor árbitro português, no limite, apenas poderia dizer que é o menos mau. Mas nem isso.
Na verdade, tecnicamente, reconheço que há alguns árbitros que são menos maus, pese embora ninguém lhes ligar nenhuma em eventos internacionais de elevado nível, designadamente campeonatos europeus e mundiais. Depois de Pedro Proença é um deserto, não se descortinando um oásis por perto. Digo tecnicamente quando querem, porquanto, quando querem outra coisa, não nos podemos iludir com a tese da incompetência. Há muita incompetência voluntária e dolosa.
Em matéria disciplinar, porém, as suas decisões não se devem a incompetência ou desconhecimento das leis, mas sim a critérios diferentes conforme a cor da camisola que o infractor enverga. Deviam ter vergonha, mas não têm.
Houve unanimidade entre os comentadores desportivos, incluindo ex-árbitros, de que a entrada, a matar, do jogador do Moreirense sobre Nuno Mendes, era, no mínimo, merecedora de um cartão amarelo e que era incompreensível a ausência desse cartão. Que não tinha explicação. Muitos foram mais longe e salientaram a dualidade de critérios, pois cinco dias antes mostrou um segundo cartão amarelo que determinou a expulsão de um jogador do Sporting de Braga e portanto a fragilização desta equipa perante o Benfica!
Quem tem uma dualidade de critérios na apreciação de comportamentos disciplinares não tem condições para julgar, porque o julgador, por definição, tem de ser isento. Quem não é isento, pode ser tecnicamente muito bom na aplicação das leis, mas não pode julgar. Os juízes de direito podem saber muito de direito, mas se não tiverem isenção, isto é, se não actuarem com uma venda nos olhos no exercício da justiça...
Um juiz, um árbitro ou qualquer outra pessoa que tenha por missão julgar tem de ser isento e imparcial e não ter dualidade de critério nos seus julgamentos. O melhor árbitro português não pode deixar de ser isento nos seus julgamentos. João Pinheiro não é, em minha opinião, o melhor árbitro português, porque, em minha opinião, não é isento. E não é de agora!


JORGE COELHO

F ECHO demasiadas vezes este artigo comentando a morte de alguém. Esta, pelo seu repentismo e por ser inesperada, chocou-me profundamente. Abro a televisão para ver o jogo do Futebol Clube do Porto e vejo em rodapé a notícia do falecimento de Jorge Coelho, um dos políticos que eu muito apreciava, pela sua atitude corajosa e de uma enorme importância para a credibilidade da democracia, de se demitir perante a tragédia de Entre-os-Rios, assumindo a responsabilidade política. Esta atitude é, infelizmente, invulgar e devia ser seguida por muitos outros políticos que, com enorme hipocrisia salientam esse comportamento, sem que apliquem o princípio a si próprios e bem mais razões teriam para o fazer.
Não tínhamos o mesmo partido político, mas tínhamos enorme amor pelo nosso Sporting como ele afirmava quando tínhamos ocasião de nos encontrar e falar do Sporting. Ele manifestou-me muitas vezes o apreço que tinha pelo meu sportinguismo (generosidade da sua parte), como não perdia ocasião por mostrar grande consideração por minha irmã, adversária política, mas que ainda agora também manifestou a sua consideração pessoal por ele.
Na política, como no futebol, os adversários não têm de ser inimigos, antes se devem respeitar na diversidade democrática.
Que descanse em paz este grande político, socialista e sportinguista! Saudações leoninas como sempre nos cumprimentamos!