João Mário e o resto

OPINIÃO26.04.202206:30

Erik ten Hag (Ajax) já foi confirmado no Manchester United, mas Roger Schmidt (PSV) deve continuar em meditação

D EPOIS do empate com o Famalicão, o Benfica soma quinze pontos perdidos nos jogos em casa, ultrapassando, ainda com  três jornadas por realizar, o registo da época transata (12 pontos), desfavorável  em relação a Sporting (oito) e FC Porto (nove), que preencheram os dois primeiros lugares  na classificação final, os únicos que dão acesso direto à Liga dos Campeões.
Esta temporada, a cena repete-se e o terceiro lugar é uma inevitabilidade para a águia em função da correnteza de maus desempenhos no Estádio da Luz, o último no passado sábado, em que ficou a zero com o Famalicão e voltou a dar uma pálida imagem que a sua família não sabe como explicar, sobretudo pela confrangedora exibição imediatamente a seguir a dois desafios de dificuldade incomensuravelmente superior, primeiro em Anfield, valorizado pelos três golos apontados no empate com o Liverpool, e, depois, em Alvalade, com o Sporting, através de uma vitória inequívoca e que poderia ter ficado assinalada por uma vantagem mais expressiva.
Foram dois jogos contra a corrente, sem dúvida, ainda por cima disputados em ambientes de enorme pressão, que poderiam ter funcionado como sinal de mudança, de reconciliação com os adeptos e de reencontro com a história do clube. Quem assim pensou, porém, equivocou-se. O futebol do Benfica  precisa de uma revolução profunda que passa, necessariamente, por uma limpeza de balneário, estou a repetir-me, pela dispensa dos que, considerando-se parte da mobília, já nada acrescentam, dos que chegaram e foram adquiridos por catálogo, sem critério, mas bem pagos, e ainda dos que, francamente, nem sequer revelam atributos mínimos para vestirem a camisola de um emblema campeão europeu.

Oproblem mais grave, no entanto, reside no facto de gente ricamente remunerada, com contratos exagerados para a realidade portuguesa, pelas verbas e pelo tempo de duração, quando os objetivos desportivos se diluem, sem que nenhuma responsabilidade se apure, saber como resguardar-se enquanto  espera que as tempestades passem, fazendo emergir o risco sério do desinteresse se generalizar e o grau de exigência profissional afrouxar, naturalmente.  
Se aqueles que se preocupam  e se esforçam chegarem à conclusão de que não vale a pena aborrecerem-se porque, internamente, não há quem ponha ordem na casa e puna os que correm pouco,  os que não gostam de se treinar quando chove ou faz frio, os que têm receio de se magoarem porque lidam mal com as dores, como se o futebol não fosse um desporto de contacto físico e a pedir muito sacrifício, na eventualidade de um cenário desses as coisas ficam à deriva e na fronteira do caos. 

N ÉLSON Veríssimo tem sido merecedor do respeito dos benfiquistas, por ter aceitado este enorme desafio, em momento muito complicado na vida clube e sabendo que apenas lhe competiria assegurar uma transição o mais serena possível para preparar o início do ciclo de Rui Costa.  
Apesar de me parecer mal protegido pela chamada estrutura, e também alvo de algumas críticas despropositadas, tem cumprido a missão com esforço, dedicação e saber, mas pior do que o desajeitado onze titular que escolheu para defrontar o Famalicão foi ter obrigado o universo encarnado a uma hora de pesadelo, sem se dar conta, nem ele nem os seus conselheiros, de que aquilo não era uma equipa, tão somente um grupo de jogadores desconexo, com Weigl mais terceiro central do que médio e Darwin, que esperava reforçar a sua liderança na BOLA de Prata,  a sentir-se fora de jogo e a parecer mais médio do que avançado para conseguir ter bola.
Uma trapalhada, no princípio, que se transformou em atabalhoação, no final, pela substituições apressadas e a más horas que nada resolveram. Um trabalho deficiente, muito mau, até, para não se repetir, e quando a equipa precisava de alguém que pensasse o jogo João Mário voltou a não sair do banco. Talvez não se aplique nos treinos, não sei, mas sei que não é um jogador vulgar e sei também que o promissor Paulo Bernardo ainda precisa de trincar muita côdea para lhe chegar aos calcanhares, como, também mais uma vez, ficou demonstrado, o que é normal.
Veríssimo tem autoridade e boas razões, com certeza, para assim proceder, mas não se tratando de um jogador qualquer, que viajou de Alvalade para a Luz, por desejo do anterior treinador, que viu nele a fonte de classe que faltava ao futebol do Benfica, até para evitar mal entendidos, penso que seria conveniente clarificar a situação, sem preconceitos.
Por outro lado, se o seu sucessor for alemão, outro folhetim aberrantemente promovido - Erik ten Hag (Ajax) já foi confirmado no Manchester United e divulgada uma lista de jogadores a dispensar, mas Roger Schmidt (PSV)  deve continuar  em meditação ou, então, ainda não haverá acordo sobre a política de saídas e entradas -, é natural que João Mário tenha de fazer um esforço grande para se adaptar e fazer parte da solução. Mas os adeptos entenderão: isso e o que tiver de acontecer. Que será muito, se Rui Costa quiser mesmo mudar para triunfar.