Janeiro de emoções, confusões e milhões

OPINIÃO14.01.202003:00

1Jornada 16 com Benfica e Porto a sentir muitas dificuldades, mas a vencerem merecidamente. Aproximam-se jogos de grande importância que poderão ser decisivos, o primeiro dos quais é a ida do líder ao Estádio de Alvalade. Jogo sempre imprevisível, dada a sua natureza histórica e a ambiência que sempre o rodeia, independentemente das classificações ou ambições em disputa.  Neste caso, com o Sporting a procurar salvar a época, que é, como quem diz, tirar pontos ao seu eterno rival, depois de por culpa própria não ter derrotado o Porto.


Contra o Desportivo das Aves nunca pensei que a vitória fosse tão difícil. Em abono da verdade e desde logo porque os avenses jogaram bem, amealharam um golo madrugador, não fizeram anti-jogo descarado e aguentaram-se sempre do ponto de vista físico e táctico. Vendo este jogo, custa a perceber como estão desterrados no último lugar com apenas 6 pontos! Quanto ao Benfica, o seu desempenho foi quase exactamente o contrário do que teve em Guimarães. Lá, precisou de um remate para fazer um golo e foi gerindo o tempo, embora sem domínio. Cá, rematou 32 vezes, teve 16 oportunidades de golo, 17 cantos, tudo num modo de atacar rápido, diversificado e fluido. Concordo com as declarações de Bruno Lage, quanto às deficiências defensivas. Já não o sigo quanto a algumas rotações a que entendeu proceder. Se é compreensível a titularidade de André Almeida e a entrada de Weigl para o lugar do castigado Taarabt, não enxerguei a vantagem de Jota ter substituído Cervi e Seferovic tomar o lugar de Vinícius. Sobretudo Jota que, para mim, continua a não ter lugar no onze principal, que não defende (o golo e mais umas jogadas do Aves pelo seu lado não teriam tido a mesma sequência com Cervi…) e que não tem, como é visível, o mesmo entendimento com Grimaldo. O suíço tem um modo de jogar intrigante: faz coisas dificílimas e, muitas vezes, falha as fáceis. Foi o que sucedeu na sexta-feira. Quanto ao estreante alemão não se poderia ter exigido mais, mas mostrou que é jogador de qualidade inegável. Enfim, um jogo muito complicado, do qual há que tirar algumas ilações, a maior das quais é que certas rotações se devem fazer quando o resultado já está consolidado e não implicando uma corrida contra um resultado ingrato. Boa notícia, foi a de os centrais (únicos) não se terem lesionado.

2Bem sei que os contextos e as restrições associadas moldam completamente os horários dos jogos de futebol. Tal passa-se por todo o lado, e, em particular, nos campeonatos mais exportáveis para fusos horários bem longínquos. A televisão e a imagem transmitida por variadas formas tudo condicionam. A sobreposição de dois jogos é, agora, uma raridade e quase se tornou num pecado mediático.


Em Portugal, acrescem aspectos relacionados com a aparente debilidade de planeamento das épocas. Por isso, temos fartos períodos em que não há nada para ninguém e outros em que tudo se acumula numa precipitação de todo injustificada. Vejamos o que vai suceder agora em pouco mais de uma semana: uma jornada do campeonato ensanduichada entre uma eliminatória da Taça de Portugal e os jogos finais da Taça da Liga, com a consequência de os finalistas desta terem de adiar a jornada que coincide(!) com aquela Taça. Mas não só. Numa altura em que o campeonato tem jogos que podem ser decisivos para o desfecho final, eis que, por exemplo, o Benfica vai a Alvalade menos de 72 horas depois de ter enfrentado o Rio Ave numa eliminatória da Taça, que até pode vir a ter prolongamento. E porquê? Porque, inacreditavelmente, se privilegiaram os jogos das meias-finais da Taça da Liga e se secundarizou a jornada do campeonato de que, aliás, desde Julho do ano passado, já se sabia que contemplaria o clássico dos clássicos e até um FC Porto-SC Braga (neste caso, porém, os portistas após uma eliminatória muito mais acessível na Taça de Portugal). Assim, dois encontros de primacial importância são atirados para um dia de semana, sexta-feira, com a maior das indiferenças de organizações que existem para servir e promover o futebol português. É até falta de consideração pelos associados e adeptos que, muitas vezes, organizam a sua vida de modo a poderem assistir nos estádios aos seus jogos predilectos. No Sporting - Benfica passou-se de um sábado para uma sexta-feira sem se atender a estas circunstâncias ou outras.


Também relacionado com tudo isto, continua o verdadeiro quebra-cabeça dos dias e horas dos jogos. Uma semana certo jogo começa às 20 horas. Na seguinte às 20.30. Depois para variar é às 20.15, 20.45, 19.30, 18.30, etc, etc. No caso do Benfica, na sexta-feira passada, o jogo iniciou-se às 19 horas. Já hoje, contra o Rio Ave, tudo começa às 21.15 (o que, aliás, impede, como atrás referi, o Benfica de descansar 72 horas, antes do jogo do campeonato!) o que significa que, na melhor das hipóteses, o encontro terminará já depois das 23 horas (ou por volta da meia-noite, na hipótese de prolongamento e penáltis…). Já sobre os dias em que se joga, pior do que a sexta-feira é o degredo da segunda-feira. E depois queixamo-nos das assistências escassíssimas em certas partidas. Em suma e objectivamente, poderemos falar de decisões que desconsideram o respeito que deveriam suscitar todos quantos ainda têm a iniciativa de ver os jogos ao vivo.

3Não sei se Raul de Tomas é um bom jogador ou não. Vi que tem boa técnica e pareceu-me sempre um profissional seguro e contido. Não se pode dizer que não tenha tido oportunidades desde Agosto até agora, ainda que se possa questionar se jogou na sua melhor posição ou com os mais adequados parceiros no ataque encarnado. É claro que devemos ter em conta que uma coisa é jogar na mais retinta equipa ioió do sobe-e-desce de Espanha - o Rayo Vallecano -, com marcações menos impiedosas e jogando em contra-ataque, do que no campeão nacional português, em que a lógica de cada jogo é a inversa do clube dos arredores de Madrid, ou seja maioritariamente em ataque sistemático. A ele deve o Benfica, porém, estar na Liga Europa, pois o golaço que marcou em São Petersburgo reduzindo para 3-1 a derrota sofrida, possibilitou um critério de desempate favorável ao Benfica. E se aquela bola do meio campo não tivesse sido defendida pelo guardião do Leipzig e o resultado passasse, então, para 0-3, o que teria mudado no acesso aos oitavos- de- final da Liga dos Campeões e como o golo teria percorrido o mundo e valorizado o atleta. Sem dúvida, muitas vezes a fronteira entre um potencial sucesso e um envergonhado fracasso é da espessura de um fio de cabelo.
É compreensível a decepção e frustração do espanhol que quis voltar ao seu país. E fez bem o Benfica em o ter permitido, ainda por cima, com inegáveis vantagens financeiras no presente e, quem sabe, no futuro. Basta passar os olhos por alguns textos e ouvir alguns comentadores televisivos para neles perscrutar a indisfarçável azia por mais esta boa transacção do Benfica. Provavelmente estão a compará-la com outros negócios. Por exemplo: ao fim de 4 meses, RDT dos 20 milhões marcou apenas 3 golos e acaba de ser vendido pelos mesmos 20 (que podem chegar a 22) por 80% do passe. Já Adrián López custou 11 milhões ao FCP (por 60% do passe), marcou só 7 golos em muito mais tempo e saiu sem retorno financeiro. No SCP, o excelente atacante Bas Dost, que custou 11,85 milhões, fez 98 golos e saiu por … 7 milhões…