Itália na Arábia
O futebol italiano está em alvoroço com intolerâncias sociais que o usam para se expressar: racismos, xenofobias, separatismos, o que quer que seja. Tanto a Federação como a Liga tiveram num passado recente de punir Milan, Inter, Juventus, Roma e Lazio com interdição de bancadas a radicais, jogos à porta fechada e um rol de multas por comportamentos desviantes e virulentos, gastando-se muito em campanhas contra as discriminações. Em Itália, não esqueçamos, adeptos distribuem autocolantes dos adversários com a cara de Anne Frank (como os da Lazio); ou desrespeitam-se com cânticos de festa o minuto de silêncio que as autoridades organizaram para lamentar os 232 imigrantes mortos que boiavam no Mediterrâneo (como os adeptos do Verona). Ah! E Ancelotti anda aos gritos a prometer tirar o Nápoles de campo se continuar a ouvir manifestações racistas!
E o que faz o futebol italiano? Agenda a Supertaça de 16 de janeiro, entre Juventus e Milan, para Jidá, na Arábia Saudita, num estádio com acesso condicionado a mulheres. Sendo onde é, não espanta, pois. O que surpreende, sim, é que a voz mais reprovadora desta seja a de Matteo Salvini, o vice-primeiro ministro e ministro do Interior, um nacionalista de extrema-direita que até slogans de Mussolini usou em campanha, que num acesso de decência classificou jogar a Supertaça num ambiente que discrimina mulheres era, cito, «um nojo».
A Arábia Saudita, entre indignações internacionais (ataques ao Iémen e suspeitas no envolvimento de assassinato de jornalista crítico do governo local), tem insistido num asseio pelo desporto, ora importando treinadores de elite (Jesus e Vitória), ora pagando para receber espetáculos de topo, como particulares do Brasil ou da Argentina, eventos de luta, corrida ou golfe. É o desporto a construir pontes e a combater erros que persistem, dirão uns. Ou, creio, é apenas fechar os olhos e pactuar por dinheiro.