Gracejos e graçolas
NA semana passada Pinto da Costa foi recebido em Belém na qualidade de administrador da FC Porto Media, detentora do Porto Canal. O encontro deveu-se à situação da comunicação social portuguesa e por isso esteve acompanhado por Júlio Magalhães, o diretor da estação. O motivo foi esse, mas não me lembro de alguém o questionar sobre a sua relação com o canal, que autoridade detém ou a influência que exerce. Seria natural apurar o essencial e só depois dar-lhe espaço para o que lhe apetecia divulgar, período que ele sabiamente preencheu.
Foi o que fez. Perante a simpatia de quem o ouvia, falou sobre o que quis, com a destreza que foi aprimorando ao longo dos anos, tomou conta da situação e passou a mensagem que lhe interessava, ornamentada com uma piada de gosto duvidoso quando se referiu a uma outra piada do ministro dos Negócios Estrangeiros sobre a cor azul.
A plateia deve ter gostado, porque não se manifestou, mas a mim pareceu-me uma deselegância, porque há diferenças entre o que se afirma no meio da rua e uma graçola produzida na residência oficial do Presidente da República à saída de uma audiência.
Na Assembleia da República, Santos Silva gracejou acerca da sua aversão ao azul, o diretor de comunicação portista reagiu com celeridade e Pinto da Costa recebeu a informação em tempo útil, não desaproveitando a presença em palco de estrelas, como é o palácio presidencial, para encantar quem o escutava e demonstrar a sua boa forma na utilização da arma em que é mestre na arte de dizer: a ironia. Além de ter dado mais um sinal de que a comunicação do emblema do dragão, podendo não gostar-se do estilo nem da linguagem, faz bem e depressa os trabalhos de casa.
Oque Pinto da Cosa pretendia dizer, disse. Por entre algumas críticas ao rigor da autoridade de saúde, revelou-se muito confiante na retoma da competição, mas a sua sólida experiência avisou-o para manter a porta entreaberta a todos os cenários e o mais preocupante tem a ver com a impossibilidade de se realizarem as dez jornadas que faltam. Como já há precedentes, dentro e fora do país, que vinham todos arrumados na sua memória, a solução normal será atribuir o título a quem, à data, ocupar o primeiro lugar. E recordou que se na Liga 2 subiram os dois primeiros e desceram os dois últimos por que razão «na 1ª Liga haveria de ser diferente»?
Seguramente não será, se for preciso aplicar idêntica medida no caso de a prova não chegar ao fim e for preciso tomar uma decisão sobre quem entra diretamente na Champions e quem fica obrigado a disputar as pré-eliminatórias. É esta a diferença entre a agradável certeza e a angustiante dúvida de encaixar 50 milhões de euros ou… talvez não, de aí fazer sentido a posição de Rui Gomes da Silva, candidato às eleições do Benfica, o qual, em entrevista à Renascença, afirmou não ter dúvidas de que, por vontade do FC Porto, «o campeonato ficava por aqui».
«O grande objetivo do Porto nem é ser campeão porque não precisa disso, o que Porto precisa é dos quarenta e tal milhões do apuramento direto para a Champions», disse.
Como é normal, a comunicação da águia pensou devagar e três dias depois o melhor que conseguiu arranjar foi a recusa em jogar no Dragão como casa emprestada de adversário que lhe caiba visitar e sugerir também que a Luz não acolha clubes que tenham de defrontar o FC Porto como visitante. No interesse da verdade desportiva, segundo a mesma fonte. Em jogos à porta fechada e sem público? Alguém é capaz de explicar?
Em 1976, por interdição das Antas, o FC Porto jogou na Luz com os alemães do Schalke (2-2). Seis anos mais tarde, em 1982, igualmente por interdição do seu estádio, o FC Porto alugou a Luz para receber o FC Utrecht (2-0), na Taça UEFA, e em agosto de 1983, na última final da Taça de Portugal que não se realizou no Estádio Nacional, o Benfica venceu o FC Porto nas Antas (1-0). Dizem-me que os tempos eram outros, mas não consta que por essa altura águia e dragão andassem aos beijos e abraços.
Incomodados
Praiense (1º C, 53 pontos), Olhanense (1º D, 57), Fafe (2ª A, 52), Lusitânia de Lourosa (2º B, 50), Benfica e Castelo Branco (2º C, 42) e Real (2º D, 57) não gostaram que, na minha última crónica neste espaço, tivesse escrito que eram seis oportunistas por se aproveitarem de uma situação de excecionalidade para contestarem a decisão da Federação Portuguesa de Futebol de interromper a competição e considerar promovidos à Liga 2 Vizela (1º A 60) e Arouca (1º B 58). Seguiu um critério razoável e aceitável, que nada tem de original, frise-se, ao privilegiar os mais pontuados.
Os seis clubes exerceram o ‘Direito de Reposta’ e fizeram muito bem. Digo-lhes, porém, que ‘mensageiro’, como me chamam, sou, garantidamente, da minha independência, o que me permite, em total liberdade, defender o que a consciência me aconselha. É o que procuro fazer sempre.
No resto, continuo convencido de que o Campeonato de Portugal é uma imensidão de sombras, com muitas histórias escondidas e propício a relações pouco saudáveis, com o poder autárquico, por exemplo, com inusitada tendência para meter-se onde não devia. Percebo o vosso incómodo, mas fará algum sentido uma câmara municipal disponibilizar os seus serviços jurídicos e aprovar o pagamento das custas judiciais para o clube da terra, que é uma sociedade anónima desportiva, processar a FPF? A isto chama-se o quê?