Futebol, negócios e relações perigosas
O mundo financeiro e a classe política sempre se sentiram atraídos pela rede de relações perigosas do lado mais obscuro do futebol
Omundo do futebol é de uma complexidade fascinante. Nos clubes profissionais e nas suas sociedades desportivas se junta um universo global, que inclui os setores mais decisivos e diversos da vida nacional. Da economia à política, das ciências do desporto à psicologia e à filosofia, da gestão às ciências da comunicação. O volume de negócios, sobretudo nos principais clubes, é significativo e, no caso de Portugal, o peso do resultado desportivo tem um desproporcionado impacto social, numa população desportivamente tripartida.
É por isso que a classe política e o mundo financeiro se sentem tão atraídos pelo abismo. E mesmo que proclamem o seu distanciamento e a sua mais honesta independência, na verdade, há sempre uma rede indestrutível de comunicações e de relações que procura unir interesses e juntar proveitos.
Não estamos, propriamente, numa sociedade moralizante e moralizadora. Só os ingénuos, ou os hipócritas, acreditam que o mérito é o grande responsável por todos os sucessos de vida. Ora, precisamente no desporto, o sucesso é decisivo e por ele e para ele se reúnem esforços, entendimentos, relações, influências, jogos de bastidores, estratégias políticas, guerras de comunicação e se determina quem são os amigos e quem são os inimigos, sendo que os neutros se anulam e são expulsos do templo, pela indiferença.
Luís Filipe Vieira, ex-presidente do Benfica
A mais recente reportagem da SIC, que nos apresenta linhas de óbvia promiscuidade entre o poder financeiro, autárquico e desportivo, tendo por exemplo o Benfica e o seu ex-presidente, Luís Filipe Vieira, é um trabalho de investigação que me parece sério e competente. No entanto, bastará olhar, mesmo que de relance, as redes sociais para se ver e ouvir um ataque desenfreado e irracional aos jornalistas responsáveis e ao canal que divulgou - e bem - a extensa reportagem. Há quem ponha em causa, não a realidade dos factos apresentados, mas a intenção de os publicar e há quem suscite a questão de ter sido escolhido especificamente o Benfica e um dos seus mais recentes líderes para ilustrar uma promiscuidade de relações que, afinal, são mais uma regra do que uma exceção.
Obviamente, que se tratam de reações assentes num primarismo que perverte a mais elementar responsabilidade de cidadania, mas que não deixa de ser um território algo selvagem, uma coutada inexpugnável, em que o futebol costume viver sem sombra de remorsos.
No fundo - também é importante que se diga - a recente explosão de notícias que nos dão conta de um estrondoso desabamento da moralidade e da sanidade do mundo financeiro, em especial o da banca, e o melhor conhecimento da sua relação promíscua com o velho aliado braço da política mais permissiva e antinacional devem enquadrar, até para melhor e mais completa compreensão, a teia em que o desporto ao mais alto nível de dirigentes, empresários e certo tipo de comissionistas influentes se envolvem.
A verdade é que temos de admitir que estamos num país onde pode ser demasiado fácil e demasiado difícil ganhar dinheiro. Se for com competência, suor e trabalho, é um país muito difícil de concretizar sonhos e ambições, mas se for de espertezas, de promiscuidades, de relações perigosas e de lóbis de interesses, é um país de ganhos fáceis e de tolerância larga.
O lado mais obscuro do futebol português beneficia dessa realidade e por isso a ele se ligam mesmo aqueles que para efeitos de comunicação política juram o mais efetivo afastamento. Mas, verdadeiramente, quem é que fica surpreendido com estas verdades?
UM DESPORTO COMPLICADO
É quase necessário contratar um matemático para nos levar a entender algo que deveria ser essencial em qualquer competição desportiva: saber, quase de forma intuitiva, quem é que neste Europeu de hóquei em patins poderá chegar à final da prova. Mais complicada e antinatura, só mesmo aquela peculiar competição de futebol de rua em que por cada golo marcado se retira do campo um jogador adversário. Algumas modalidades desportivas têm procurado encontrar caminhos de sobrevivência, mas não piorem as coisas.
SENSIBILIDADE E BOM SENSO
A Europa tornou-se, de novo, no principal polo de crescimento de infeções de Covid-19 e Portugal, apesar de viver uma situação controlada, procura encontrar, entre o interesse de saúde pública, o impacto político e as consequências económicas soluções híbridas para a contenção do vírus. Há quem tema que as medidas repitam a discriminação das atividades desportivas, incluindo uma excessiva limitação de espectadores nos estádios e recintos desportivos. Sensibilidade e bom senso é o que devemos esperar de quem nos governa.