Força mental e paixão

OPINIÃO07.04.202107:00

É o que o FC Porto (desfalcado) precisa para aguentar um Chelsea com ADN de Champions. Não há impossíveis

NÃO acredito num Chelsea enfraquecido e muito menos humilhado com a sova mestra (5-2) que lhe foi aplicada em Londres pelo West Bromwich Albion. Esse resultado só veio confirmar pela milésima vez que em Inglaterra qualquer pequenote tem argumentos (dinheiro e jogadores) para, pelo menos, tentar jogar olhos nos olhos com os grandes. O WBA foi atrevido, malicioso até; correu-lhe tudo bem e marcou nas alturas certas. Ponto. Nem sequer se pode dizer que tenha sido uma vitória alicerçada num brilhante arranjo tático porque o treinador do WBA, não sei se estão a ver, dá pelo nome de Big Sam meia bola e força Allardyce. Aquilo que o talentoso Matheus Pereira (esteve nos cinco golos!) e os colegas fizeram em Stamford Bridge foi formidável, mas não é uma raridade. Longe disso. Lembro que nesta época o City apanhou 5-2 do Leicester em casa; o Manchester United apanhou 6-1 do Tottenham em casa; o Liverpool apanhou 7-2 do Aston Villa em Birmingham e, além disso, vai numa sequência de seis derrotas consecutivas em casa (!!!).
A Premier não é a nossa Primeira Liga. É o campeonato mais competitivo do mundo.
Quer isto dizer que o Chelsea, que ainda não tinha perdido qualquer jogo com Thomas Tuchel, não passou a ser uma equipa acessível ao FC Porto só por ter feito aquela triste figura no sábado. Antes fosse! Mas ninguém duvide que a equipa inglesa vai a Sevilha com a confiança intocada - o que acontece na Premier, fica na Premier - e que Thomas Tuchel preparou o jogo pelo menos tão minuciosamente como Sérgio Conceição. Para os mais distraídos, acrescento que o Chelski de Roman Abramovich é um grande no modelo Champions [estreado em 1992]. Anotem: 10 presenças nos quartos de final (o FCP vai para a oitava), 7 presenças nas meias-finais (FCP: 2), duas finais (FCP: 1) e um título (como o FCP). Ademais o Chelsea é a sétima equipa da Champions com mais jogos (174) e vitórias (86), logo atrás do FCP (204 e 90). Acima deles, só monstros como Juventus, Man. United, Bayern, Barcelona e Real Madrid. Temos portanto um choque de pesos pesados em Sevilha, não sendo nenhuma surpresa um desfecho favorável a qualquer dos dois. A este nível, como bem lembrou Sérgio Conceição, «não há impossíveis». Desfalcado de Sérgio Oliveira e Taremi, o FCP tem de pensar no duelo de logo à noite como a primeira parte de um jogo de 180 minutos disputado no mesmo estádio… apesar de a regra do golo fora continuar a valer. Assim sendo, um empate a zero poderá ser um bom resultado. Entre as várias hipóteses em cima da mesa (dois ou três centrais? Fábio Vieira ou Grujic no lugar de Sérgio Oliveira?, etc, etc), que Sérgio avance com três centrais (Pepe, Mbemba e Diogo Leite), um meio-campo com Corona, Uribe, Otávio e Luis Díaz atrás de Marega. E se assim for não acredito que Tuchel fique muito surpreendido. Ele tem fama de prever e estudar todos os possíveis movimentos do adversário. Para ter hipóteses de adicionar o escalpe do Chelsea ao da Juventus, o FCP precisa de ser o FC Porto europeu dos últimos trinta anos. Força mental, compromisso, paixão e… essa admirável capacidade de lutar, espernear e acreditar até ao último fôlego.
Nos jogos de ontem, o Real Madrid, com o sinuoso Vinícius em grande plano, venceu o Liverpool com clareza (3-1) e está com um pé na meia-final da competição onde é rei indiscutido. Uma injeção de moral para Zidane em vésperas do clássico que pode projetar os merengues para uma Liga que chegou a parecer perdida. Mas atenção que há dois anos o Liverpool saiu de Barcelona com uma derrota ainda mais pesada (0-3) e depois em Anfield foi o que se viu... Já o City, com os três portugueses no onze e todos os avançados no banco (Sterling, Gabriel Jesus e Kun Aguero), não foi além de uma vitória mínima (2-1) perante um Dortmund perigoso - o velho Marco Reus assinou o golo do empate, mas Foden decidiu no último fôlego. O jogo não foi famoso e os ingleses não conseguiram completar o oitavo jogo sem sofrer golos na Champions (!): o último a marcar-lhes, antes de Reus, fora o portista Luis Díaz, a 21 de outubro passado.
 

Sérgio Oliveira na festa do golo decisivo em Turim, mais um exemplo do que os dragões são capazes de fazer nas competições europeias


La Liga a caminho da normalidade

OAtlético de Simeone ainda pode ser campeão, mas já esteve dez pontos mais perto disso. Tendo desperdiçado a enorme vantagem que chegou a ter sobre Barcelona (mais uma eliminação horribilis na Champions, passivo monstruoso, indefinição em torno de Messi...) e Real Madrid (equipa em fim de ciclo, clube em fase de transição para o novo Bernabéu…), o segundo clube de Madrid mira-se ao espelho e vê um tio feio como o demo. Impossível cativar alguém com aquela caraçolha. O futebol do Atleti, quase jurássico, é de uma pobreza inaceitável para o custo do plantel. O responsável mor é Cholo mas, exceção feita ao veterano Luis Suárez (19 golos na Liga, o grande responsável por o Atlético ainda ser líder), não se vê no plantel colchonero a matéria de que são feitas as grandes equipas. Vê-se músculo, hormona, ego e presunção, mas faltam craques a sério - os que não se escondem, desequilibram e fazem a diferença.
A nove jornadas do fim, o Barcelona talvez seja agora o maior favorito. Não só porque tem vindo a crescer de jogo para jogo, mas porque tem Messi focado e recebe o Atlético a 9 maio, na jornada (35) que pode decidir tudo. Isto, claro, partindo do princípio que o Barça sobrevive ao clássico do próximo sábado em Madrid. Porque se a vitória sorrir ao Real Madrid (que ganhou em Camp Nou), é Zidane quem estará mais perto do bicampeonato. Repete-se: o patinho feio de Simeone anda pode ser campeão (ao contrário da pavorosa Juventus, que vai ter o que merece…) mas percebe-se que La Liga está a caminho da normalidade. Isto é: ganharem os melhores.