Fora da Europa
1 Há muitos anos, muitos mesmo, - dezoito anos! - que o futebol português não tinha qualquer clube nos oitavos de final de uma competição europeia. Nestas quarta e quinta feiras os quatro primeiros classificados da nossa Liga foram afastados da Liga Europa. O interessante é que das trinta e duas equipas que resistem nas duas competições europeias de clubes, vinte e cinco (78%) são originárias das cinco principais ligas da Europa: Espanha (6), Inglaterra (6), Alemanha (6), Itália (5) e França (2). E na décima posição está a Ucrânia, a única que no top - 10 resiste com um clube na Europa do futebol, o Shakhtar de Luís Castro. Na verdade Espanha, Inglaterra e Alemanha só perderam um clube até ao momento. Todas iniciaram as competições com sete representantes, tal como, aliás, a Itália que perdeu dois! E só a França, que mantém dois clubes da Liga dos Campeões (PSG e Lyon), é que perdeu mais, quatro representantes. Depois Rússia, Portugal, Bélgica e Holanda estão a zero. E, aqui, também com o Ajax a ser eliminado da Liga Europa! O que significa que só ligas que estão para além do décimo lugar no ranking da UEFA têm representantes nos oitavos de final da Liga Europa: Turquia, Suíça, Escócia, Grécia, Áustria, Dinamarca e Ucrânia. No mais é o domínio total das cinco Ligas mais poderosas da Europa! E o salto entre a quinta (França) e a agora sexta (Portugal) é um salto imenso e com a consciência que a França pode correr o risco de não ter qualquer clube nos quartos de final da Liga que dá milhões!
2 E, aqui, reside um lado de e para análise. Na verdade a Liga Europa é uma liga de prestígio. Não é uma Liga que suscite milhões. E os clubes da segunda metade do ranking - que arranca no sexto lugar! -, não ignoram que vale mais entrar diretamente na fase de grupos da Liga dos Campeões do que lutar por uma fase adiantada da Liga Europa. É inequívoco, que a Liga Europa é uma forma de estar na Europa! É uma prova que, por excelência a partir dos oitavos de final, gera visibilidade, suscita atratividade e proporciona que alguns talentos sejam vistos com maior atenção. Basta recordarmos as prestações de João Félix na última edição da Liga Europa. Meio passaporte para uma transferência milionária! Mas o que conta é mesmo a Liga dos Campeões. O que se ganha pela entrada direta para a fase de grupos é uma pipa de massa! E se falha tal entrada são necessários orçamentos retificativos e, porventura, uma realização bem extraordinária de receitas. E esta realização é tão mais premente quanto haja clubes - em rigor SAD- que estejam sujeitas a rigoroso controle financeiro ou bancário. Estar na Europa, em projeto, é uma ambição, um desejo legítimo. Mas importa que tal ambição tenha os pés bem assentes no terra . Diria que na realidade do futebol de hoje, dos seus números, da relação com os outros futebóis e da sua competitividade efetiva. Não basta que as máquinas de comunicação - cada vez com maior número de envolvidos o que implica uma necessidade de alimentação que não pode ser ignorada e que deve mesmo suscitar análises sistémicas - proclamem a «grande aquisição», a «extraordinária conquista» ou o «apoio dito sereno» da estrutura que Bonaparte erigiu. O que fica são os números, as derrotas sofridas, as exibições não conseguidas ou as substituições não entendidas. O que fica é, no adepto(a) apaixonado, a dor do afastamento e não compreensão da explicação dada pelo desaire. E é esta disfuncionalidade que traduz o dado novo neste desaire coletivo do futebol português. Agora as redes sociais devem ser lidas. Há dezoito anos a desilusão tinha menor expressão publicada. E são estes novos tempos que não podem ser ignorados. Mesmo por aqueles que se julgam imbatíveis ou inatingíveis! Os dados recentes do Mundo ajudam a mostrar múltiplos exemplos de poderosos com pés de barro! A todos os níveis. Os donos disto tudo nascem e morrem. Tal como os impérios. Tal como, acredito, os vírus. Cresçam, ou não, em coroa!
3 Esta vigésima terceira jornada da nossa Liga só termina depois de amanhã em Famalicão com a visita do Sporting. E, amanhã, o centro das atenções estará em Ponta Delgada e na Luz. O Futebol Clube do Porto defrontará o Santa Clara e o Benfica iniciará o confronto com o Moreirense sem saber o resultado final da partida dos Açores. Agora que estamos fora da Europa todas as atenções vão centrar-se na nossa Liga. Agora a disputa, como tem sido timbre, será, em exclusivo, interna. Nos jogos europeus a arbitragem não conta. Nem as análises do VAR. Cá dentro, numa disputa sem tréguas, os jogos valem nos relvados e contam muito fora deles. Sabendo do estado de necessidade em que se encontram algumas SAD e não ignorando situações de força maior com que se deparam (ou depararão) outras delas. E são estas realidades, bem singulares do nosso futebol, que também ajudam a entender o desastre europeu e a concentração de todas as atenções da frente interna! E sem que a Federação e a Liga consigam - tal como o poder politico - atenuar a crispação que cresce semana a semana com decisões de instâncias judiciárias. Que muito gostaria de comentar mas que, por razões deontológicas que rigorosamente cumpro - ao contrário de outros cuja ética da responsabilidade exigiria o silêncio! -, estou impedido de fazer. Mas o que sei é que, por vezes, a justiça pode tardar mas ela existe e está viva. Em todas as suas diferentes vertentes, incluindo na gestão do sorteio de processos… Aqui a ralação é muita! Muita mesma!
4 Ontem na Alemanha, em concreto, em Hoffenheim, o Bayern de Munique vencia por seis a zero. O protocolo anti racismo foi ativado. O jogo interrompido. As equipas solidárias deram uma resposta inequívoca aos ultra que determinaram a suspensão do jogo. Nada com ver, e rever, as imagens. E a ação de árbitros, jogadores, treinadores e altos dirigentes de ambos os clubes. A rever em Portugal na antevéspera de possíveis decisões que vão perturbar, ainda mais, o ambiente fora dos relvados! Como diria numa linguagem comum, «vão por mim»!
5 Todos os ciclistas que participaram na Volta aos Emiratos Árabes Unidos deram resultado negativo ao denominado, e muito angustiante, «Covid-19»! Mas permaneceram em Abu Dhabi, em quarentena, por precaução. Por cá, a Associação de Futebol de Lisboa adiou, e muito bem, dois jogos, nos escalões mais jovens, em que participavam equipas dos Maristas de Carcavelos já que alguns alunos tinham estado, em vigem escolar, no Norte de Itália. Também por cá, tal como em Itália, o futebol, e os seus dirigentes, assumem, com plena responsabilidade, o dever de prevenção! Já que o presente, como escreveu Simone de Beauvoir, «não é um passado em potência, ele é o momento da escolha e da ação»! Da ação sublinho e evidencio! Na Europa e fora da Europa!