Evitar a enésima derrota
O Benfica joga um tudo ou nada em Leipzig, já conhecedor do resultado do Zenit-Lyon. O campeão nacional ainda não saiu do último lugar do grupo e tem a continuidade na Europa em risco. Pode ter de ganhar mais logo na Alemanha se o Zenit bater em casa o inconsistente Lyon: só assim mantém hipóteses de chegar ao terceiro lugar na última jornada (o Zenit vai à Luz). É bom que Bruno Lage considere a hipótese de uma vitória russa. Não seria nenhuma surpresa. Pelo que se tem visto, o Zenit até será a segunda melhor equipa do grupo. Em condições normais, o Benfica, que fez um péssimo jogo em Vizela (alerta vermelho: viu-se gente sem grande vontade de correr…), tem de ir a jogo com tudo e deixar a pele em Leipzig, onde mora o 2.º classificado da Bundesliga com um futebol que lembra um pouco o que Jurgen Klopp levou para Liverpool. Ganhar tem de ser o objetivo. Não perder tem de ser o segundo objetivo: os adeptos estão saturados de derrotas europeias, que é o prato que lhes tem sido constantemente servido nos últimos três anos.
O problema é que o Benfica ganhou uma inércia derrotista muito vincada na Champions (perdeu 13 dos últimos 17 jogos, a pior sequência de sempre de uma equipa portuguesa na Europa) e não parece muito empenhado em contrariá-la. Ainda ontem a própria manchete deste jornal - «Futuro de Lage não depende do que acontecer na Alemanha: IMUNE À CHAMPIONS» - parecia inconscientemente confirmar que a Champions para o benfiquismo é uma espécie de vírus maldito que todos os anos desgraçadamente se abate sobre o clube, uma prova que nem sequer deve contar na análise ao desempenho do treinador… que desgosto teriam Eusébio e Coluna se fossem vivos! E que tristeza têm aqueles que se lembram do grande Benfica europeu dos anos sessenta e até dos anos oitenta. Eu sou um deles. Vi muitas noites de glória europeia no antigo inferno da Luz e não me conformo com a mediocridade deste Benfica no plano externo. E acho estranhíssimo que esta vergonhosa série negra na Champions seja aceite e digerida como coisa normal por quem tem obrigação de cuidar e defender a imagem internacional do clube. O negócio não pode ser tudo!
Está mais que percebido que a prioridade absoluta para o Benfica continua a ser o sacrossanto campeonato doméstico (vale os 40 milhões de entrada na Champions, pois!) e, a julgar por recentes declarações sobre esse assunto do antigo futebolista Rui Costa, administrador da SAD encarnada, é no conforto do lar que a águia se sente bem. Assim sendo, talvez não valha a pena gastar muito latim com um clube que apregoa uma coisa pela boca do presidente e do treinador - queremos voltar a ser alguém na Europa! - e depois não faz nada por isso, mais parecendo fazer o contrário. A relação do Benfica com a Champions tornou-se doentia e é pena que ninguém na sua direção pareça compreender que o fiasco constante afeta - e muito - a imagem e a credibilidade internacional do clube, retirando valor à equipa e, naturalmente, aos seus ativos - caramba!, pensem lá um bocadinho: quem é que pode levar a sério uma equipa que perde quase todos os jogos que faz na Champions ?!?
… e também afeta a imagem do próprio futebol português, que o Benfica, cumpre dizer, não tem sabido representar na competição onde se faz prova da grandeza que conta.
Sobre a Liga Europa. Curiosidade de ver o que o aflito FC Porto (último no seu grupo) fará na Suíça com o Young Boys. Há quem defenda que o FCP fez contas e concluiu que ganhar o campeonato - e os tais 40 milhões - é muito mais importante para a (catastrófica) situação financeira do clube (quem faz perguntas difíceis à SAD portista? … que tem a dizer o responsável das finanças?) do que tentar chegar longe numa Liga Europa que não dá milhões, mas patacos. Bom. O FC Porto, precisado de fazer 60 milhões a curto prazo, segundo informou o administrador Fernando Gomes com uma naturalidade inquietante, saberá as linhas com que se cose; mas lembro que o clube tem uma responsabilidade especial na Europa, onde é, há muitos anos, o navio almirante do futebol português. Juntar a uma humilhante eliminação na Champions (às mãos do minorca Krasnodar) uma ainda mais indesculpável eliminação na Liga Europa num grupo com adversários de segunda linha não faria nada bem à imagem de um clube que sempre percebeu a importância das competições europeias na construção da sua identidade.
Sporting (recebe PSV) e Braga (recebe Wolves) têm a possibilidade de garantirem perante os seus adeptos o apuramento para a fase seguinte. O Vitória está fora. O PSV, por defender francamente mal, parece ao alcance do leão menos apetrechado e mais titubeante dos últimos anos - que, mesmo assim, já contribuiu com 9 pontos para o ranking luso na UEFA. O Braga defende perante o sensacional Wolverhampton (5.º na Premier), principal contribuinte da Seleção Nacional, uma campanha europeia quase imaculada (7 vitórias e um empate em oito jogos). Creio que haverá um grande jogo na Pedreira.
Jesus: agora o mundo!
Com a espetacular dupla conquista em menos de 24 horas, Jorge Jesus tem agora 17 títulos na carreira (distribuídos por seis clubes) e aproxima-se dos registos de Manuel José, O Africano (23), e José Mourinho (25), O Europeu, os dois treinadores portugueses mais titulados e os únicos com vinte ou mais troféus no currículo. 27 anos depois de ganhar o campeonato da 2.ª B com o Amora, Jesus também passou a integrar a elite dos treinadores lusitanos que ganharam grandes competições internacionais de clubes e de seleções, juntando-se a Anselmo Fernandes (Taça das Taças com o Sporting em 1964), Carlos Queiroz, Artur Jorge, Nelo Vingada, Manuel José, José Mourinho, André Villas Boas e Fernando Santos. O próximo desafio de Jesus é tornar-se o primeiro treinador português a ganhar o Mundial de Clubes - lembro que os dois títulos mundiais do FC Porto (1987 e 2004) foram conquistados por treinadores estrangeiros (Tomislav Ivic e Victor Fernandez). Mourinho teve essa possibilidade duas vezes (2004 e 2010) mas não chegou a ir lá porque mudou de clube. Já Manuel José participou em três Mundiais com o Al-Ahly (2005: quartos; 2006: meia-final e 3.º lugar final; 2008: quartos) mas não chegou ao jogo decisivo. Campeão nacional e continental com o Flamengo, Jesus aponta agora à consagração mundial para rematar um ano fabuloso. Veremos o que pensa o Liverpool disso.