Europa tão acima!
Bayern passou por cima do Al Ahly e deverá fazer o mesmo amanhã ao Tigres, na final do Mundial. Futebol europeu não tem rival há muitos anos…
OBayern Munique venceu tranquilamente o campeão africano Al Alhy (Egipto) na meia final do Mundial de Clubes, no Catar, e deverá fazer o mesmo amanhã ao mexicano Tigres no jogo da final, na cidade de Al Rayyan. Toda a gente está à espera que os alemães, que marcam golos há 58 jogos seguidos (!), completem o «hexa» de títulos de 2020 e tragam para a Europa o oitavo título mundial consecutivo (o que acontecerá pela primeira vez na história da competição). Poucos apostam na possibilidade de o veterano francês André Pierre Gignac, a estrela da equipa mexicana, voltar a ser feliz como foi nos jogos com o Ulsan Hyundai (dois golos) e com o Palmeiras de Abel Ferreira (decidiu de penalty). O Bayern é outra coisa.
Quem viu a maneira como o Bayern amassou o campeão africano (sobretudo na 1.ª parte) sem forçar muito o andamento (vinha de uma viagem aérea de 15 horas) percebe a distância - cada vez maior - que separa o futebol europeu dos restantes. Não há comparação possível entre o ITÁLICO andamento, a competitividade e a qualidade das equipas europeias de topo com a das equipas americanas, africanas e asiáticas. São mundos à parte. Como escreveu o colunista Juca Kfouri na Folha de São Paulo, na antevisão do Palmeiras-Tigres: (…) ITÁLICO «O que se exige de time brasileiro no Mundial é disputar a decisão. Ao chegar nela, a responsabilidade passa a ser do adversário europeu e só não pode haver goleada como o Barcelona impôs ao Santos em 2011». É desta maneira que os brasileiros encaram hoje os duelos com a elite europeia, e creio que na origem desta atitude humilde e despretensiosa está a monstruosa goleada imposta pela «Mannschaft» ao Brasil (7-1) na meia final do Mundial de 2014. Há um antes e depois desse enxovalho (há pouco mais de um ano, a Imprensa carioca não poupou elogios ao Flamengo de Jorge Jesus só por ter forçado o Liverpool a um prolongamento). Bom. Há superioridades que até fica mal não reconhecer. A Europa não perde um Mundial de Selecções desde 2002 (Itália, Espanha, Alemanha e França sucessivamente campeãs depois do triunfo do Brasil de Scolari no Japão / Coreia do Sul) e ganhou, nas calmas, os últimos sete Mundiais de clube.
O Palmeiras do nosso Abel jogou pouco e pouco ousou. Consequentemente, permitiu ao mexicano Tigres tornar-se o primeiro campeão da CONCACAF (América do Norte e Central) a atingir uma final do Mundial. Mas não se pense que este foi o primeiro insucesso de uma equipa brasileira perante adversários teoricamente menos cotados. Nada disso. O Internacional de Abel Braga foi claramente batido (0-2) pelo congolês Tout Puissant Mazembe na meia final de 2010, acontecendo o mesmo, três anos volvidos, ao Atletico Mineiro de Alexi Stival ‘Cuca’ perante o marroquino Raja Casablanca (1-3). Sem esquecer que o argentino River Plate, de longe a melhor equipa do futebol sul-americano, perdeu há dois anos (nos penalties) a meia final para o Al-Ain (!!!) dos Emiratos Árabes Unidos. Esses ITÁLICO azares nunca acontecem aos clubes europeus, que estiveram infalivelmente em todas as finais desde que a prova se disputa nestes moldes (2005). Ganharam 12 e perderam apenas três: Liverpool de Rafa Benitez (0-1) para o São Paulo de Autuori em 2005; Barcelona de Frank Rijkaard (0-1) para o Internacional de Abel Braga em 2006; Chelsea de Rafa Benitez (0-1) para o Corinthians de Tite em 2012.
Ricardo Ferretti pode buscar inspiração nestas três excepções, mas a regra tem sido bem clara: Europa ITÁLICO über alles! Em todas as frentes…
A importância da idêntidade
OCity tem a mesma identidade há vários anos e foi com ela que merecidamente arrasou o Liverpool em Anfield (4-1), assegurando uma vantagem folgada na liderança da Premier. O «tiki taka» britânico de Guardiola - feito de posse, passe, triangulações e inteligente ocupação de espaços - foi demasiado superior para um Liverpool desfalcado de jogadores importantes e completamente falho de confiança (os erros do guradião Alisson também ajudaram à ITÁLICO débacle, é um facto). Mas que ninguém tenha dúvidas. O Liverpool há-de ressurgir e voltar a ser ferozmente competitivo fiel à identidade que Klopp ali implantou - feita de pressão, circulação rápida, linearidade e contundência. Ninguém vai por isso em causa, assim como Pep não renunciou à sua filosofia nos (poucos) anos de vacas magras. Coerência e continuidade são conceitos fundamentais em projectos de médio/longo prazo, como aqueles que estão a ser desenvolvidos em Manchester e Liverpool. Qualquer deles bem sucedido.
PS - Quem viu a maneira retraída e timorata como, há dias, a jogar em casa, o Tottenham se apresentou perante ITÁLICO este Liverpool (derrota por 1-3), percebe porque é que Mourinho deixou de ser o Napoleão do futebol.
Surgem as «narrativas»
Aincapacidade de reconhecer erros próprios é tão triste quanto a mesquinha incapacidade de reconhecer méritos alheios. Por estes dias ficámos a saber que o Benfica só está como está por causa da pandemia - «o covid é que nos arrasou!», revelou Jorge Jesus - e que o FC Porto só não está onde gostaria de estar por causa «de decisões disciplinares dificeis de entender [«legitimação de jogo duro dos nossos oponentes»], explicou Pinto da Costa. Ou seja: pandemia e más arbitragens explicam o 4.º lugar do Benfica e o 2.º lugar do FC Porto, pouco importando para a narrativa de Jesus que o Benfica, antes de 16 janeiro 2021 (quando o virus atacou em força na Luz), tenha acumulado uma sucessão de maus resultados e exibições pífias (mais concretamente, desde o 0-3 no Bessa a 2 novembro 2020). Também pouco importa para a narrativa de Pinto da Costa que esta seja a defesa mais batida da era Sérgio Conceição (mais de um golo sofrido por jogo…) e que a equipa tenha perdido vários pontos claramente por demérito próprio (Paços Ferreira, Maritimo, Belenenses, Braga) e não por causa de eventuais erros arbitrais - que houve alguns, isso é claro… mas nem todos em prejuízo do FCP! As décadas passam e nada muda na saloia mentalidade do futebol português: a culpa nunca é nossa mas dos outros - ou de alguma coisa que não podemos controlar.