Este engenheiro é vivo!

OPINIÃO19.11.201903:00

Na edição da última quinta-feira, dia do jogo com a Lituânia, A BOLA escolheu para título principal de primeira página uma frase de Fernando Santos que deu prazer de ler: «Vamos estar no Euro.»  Hoje, terça feira, já estamos. Pela décima primeira vez, desde a mudança de século, com cinco presenças em fases finais de Mundiais e seis de Europeus.


Desde o ano 2000 que não falhamos um único apuramento, em brutal contraste com o longo passado de azares e outras desculpas inócuas em que enxergamos o Mundial de 66, que nos entusiasmou, e o de 86, que nos envergonhou, além  de dois Europeus, o de 84, só nos faltou um treinador  para chegar ao título, e o de 96, no qual Poborsky marcou o golo da vida dele e… da nossa desilusão.


É notável o crescimento do futebol português e mais notável é a sua afirmação internacional, inimaginável há uma dezena de anos, mas registada com dois títulos só ao alcance dos melhores: Europeu de França, em 2016, e Liga das Nações, em 2019.


Por detrás desta obra grandiosa, que se sabe como começou, mas ninguém adivinha como acabará, está uma estrutura profissional, competente, inovadora, influente, respeitada e olhada como referência no âmbito da própria FIFA.


Gilberto Madail construiu  os alicerces da mudança, e variadas vezes  foi criticado por ser mais presidente da Seleção do que da Federação, mas foi com Fernando Gomes,  e uma equipa  diretiva com gente nova na idade e com novas ideias, que  o edifício começou a crescer, tirando  Portugal do quase anonimato para o transformar numa potência futebolística, mundialmente admirada no campo e fora dele.

Este engenheiro é vivo! Leva  sempre a dele avante e é irritante, por causa do seu conservadorismo na forma de jogar. Pensa pela sua cabeça e está-se nas tintas para as opiniões da turba de sábios na matéria,  em que me incluo, obviamente, e à qual ele sorri com simpatia, mas não liga nadinha, porque  tem estatuto para assim proceder. Não me refiro à façanha de  ter sofrido apenas três derrotas em jogos oficiais (Suíça, Uruguai  e Ucrânia) desde que é selecionador, completa agora cinco anos. Verdadeiramente marcante foi ter  dito, com espantosa antecipação,  que acreditava que  Portugal iria ser campeão europeu em 2016. Insistiu, voltou a insistir, mas só recebeu troça de volta. Retenho uma frase muito curiosa:  «Vocês não acreditam, mas eu já avisei a minha família que só me vou embora depois do dia 10 [final].»


Com igual serenidade e confiança, afirmou,  este domingo, no Luxemburgo, que não só vamos lutar para ganhar o próximo Europeu, o que desde logo coloca em alerta os mensageiros de desgraças, como indica o caminho para lá chegar:  «Quando Portugal consegue juntar criatividade, qualidade e nota artística e, ao mesmo tempo, perceber que o jogo, em determinados momentos, precisa de outras coisas, é praticamente imbatível.»


Do seu ponto de vista, a nossa Seleção reúne capacidade argumentativa para voltar a ter sucesso e encher de felicidade os portugueses.  As «outras coisas» a que Fernando Santos alude, e que estarão identificadas, são o desafio que se lhe depara e que ele aceita, entusiasmado e esperançado em recolocar o nome de Portugal nas bocas do mundo pelo melhor dos motivos: outra vez campeão da Europa. Acreditar  é o primeiro passo.
 
ASeleção faz o seu percurso triunfal  na Europa, mas os clubes temem-na e tropeçam a cada jogo. Ao discurso positivo e motivador do selecionador contrapõe-se a narrativa titubeante e descrente  dos treinadores dos emblemas lusos, não sempre,  é certo, mas na maioria dos casos. Como facilmente se  deixam maniatar pelas prioridades, pelas teorias sobre gestão e outras abstrusidades, nem se dão conta que cansados devem ficar os jogadores em face das  fracas ambições de quem os treina.  


No Benfica, quando Luís Filipe Vieira persiste no desejo de ver o Benfica numa final da Champions logo o acusam  de aumentar pressão sobre jogadores e treinadores, um disparate total. O que se observa é que Bruno Lage, além de começar a ficar geometricamente chato na oratória, só consegue fazer levar a sua voz de comando até Elvas…  
No FC Porto, Conceição tenta disfarçar hesitações e receios  através de uma posição ora agressiva, ora tímida ou petulante, mas, no fim, a conclusão é idêntica:  aquilo que importa é o que se passa cá dentro. Lá fora, a  conversa é entre ricos, sem levar na devida consideração que,  embora humilde, o seu clube atual, já este século, conquistou uma Liga dos Campeões e uma Taça UEFA (José Mourinho) e uma Liga Europa (André Villas Boas).


No SC Braga, Sá Pinto  está a dar boa conta do recado no exterior.  No entanto, se tem presente que treina num clube que foi finalista da Liga Europa, em 2011 (Domingos Paciência), e frequentou recentemente a Liga dos Campeões, não deveria precisar da advertência  presidencial para o modesto desempenho na Liga interna.
No Vitória de Guimarães, Ivo Vieira não resistiu ao deslumbramento na sua estreia europeia. Foi afastado, cheio de exibições luminosas, pela porta das traseiras. Culpa da má sorte, é o que todos dizem…