Esta gentalha

OPINIÃO30.03.201903:00

MUITAS vezes ainda estou a acabar de escrever o artigo da semana, e já estou a pensar no de sábado seguinte ou sei mesmo já o que vou escrever, a menos que surja qualquer coisa mais interessante ou mais actual.
Confesso que esta semana  não andei muito inspirado, depois de nas duas últimas semanas ter escrito sobre o Special Olympics e os extraordinários resultados que estes obtêm sem que lhes dêem qualquer importância, porque actualmente o que que interessa à comunicação social, designadamente, a desportiva, são os diálogos entre o César Boaventura e um tal Vítor Catão, ao que dizem amigos de Luís Filipe Vieira, mas que eu não acredito, porque não posso admitir que sendo o nível tão baixo, o presidente do Benfica se quisesse ao comentário «diz-me com quem andar, dir-te-ei quem és»!...


É impressionante como se consegue andar uma semana, ou mais, a comentar um tal diálogo, se é que assim se pode qualificar aquela cena surrealista entre aquelas duas personagens, aliás bem representativas do baixo nível a que se chegou em termos de comunicação. E o que mais me incomoda, depois das gargalhadas a que aquilo me conduz, seguida de um estado depressivo, é ver jornalistas (não jornaleiros) a participar naquilo, sem uma palavra dura de crítica perante estas situações tão degradantes, reveladoras da miséria humana que hoje envolve o desporto e, muito particularmente, o futebol. As gargalhadas resultam da perplexidade que aquilo me causa e me faz lembrar o meu amigo Vítor Correia, árbitro já falecido, que dizia «que já tinha visto tudo, menos uma bicicleta a andar de porco»! Aonde quer que esteja, se consegue de lá ver televisão, poderá agora dizer que já viu mesmo tudo. A parte depressiva deriva de me lembrar de um saudoso e famoso locutor, que, perante o golo, gritava «é disto que o meu povo gosta»! Eu digo o mesmo, não com a alegria do Jorge Perestrelo, mas com a tristeza de que o povo, a que pertenço, goste disto !..


Aqueles que lutaram, com sacrifício da sua própria vida e da sua própria liberdade, pela liberdade de expressão e informação, não mereciam, e não merecem, este intolerável abuso da democracia, que aliás a enfraquece, em vez de a robustecer. Diz o artigo 37.º da Constituição, no seu número um, que «todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações». Mas aquilo a que assistimos todos os dias, e em vários canais, é a divulgação de qualquer pensamento ou opinião? É liberdade de expressão ou é pura libertinagem? Pois é, a Constituição também diz que o exercício desses direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura; mas também não impede que haja alguma sensatez por parte das direcções de informação, a que, inexplicável e despudoradamente, estes programas pertencem! São estes desmandos que trazem as ditaduras e as censuras!
Cabe perguntar, de resto, se conhecem por essa Europa fora - para não falar do resto do mundo, incluindo o terceiro - onde existam programas semelhantes? Os big brother são maus, mas ao menos são considerados entretimento, e eu respeito, porque cada qual tem o direito a entreter-se, seja com novelas, cinema, canções ou com o quer que seja; custa-me a aceitar é que esses programas sejam de informação, quando são é de deformação da saúde mental.


Na quinta-feira passada, como já não conseguia ver televisão, resolvi ir ao cinema para ver um filme português, baseado numa histórica verídica: SNU! Uma grande mulher que viveu um grande amor com o grande político Francisco Sá Carneiro, interrompido pelo trágico acidente de Camarate, e que puseram a nu a grande hipocrisia com que por vezes se fala de liberdade e democracia!...
Mas também que saudade ao rever os grandes políticos de então, e dos quais poucos sobram! Muitas vezes me questiono, e durante o filme interroguei-me várias vezes, como seria hoje este país, se aquele homem não tivesse perecido daquela forma trágica. E naquela altura, eu nem sequer era adepto do seu partido, mas admirava as suas qualidades humanas e politicas! E a coragem com que enfrentou a hipocrisia dos políticos, da igreja e da sociedade defendendo a sua liberdade de amar, não a confundido com o amantismo às escondidas dos cobardes e dos falsos moralistas!...


Este desvio da televisão ao cinema, fez-me desviar do futebol para a politica, embora esse desvio não seja assim tão grande, infelizmente, pois, na realidade, por vezes - vezes de mais - em vez de se desviarem convergem naquilo que o futebol e a politica têm de pior. O futebol jogado é bonito, um grande espectáculo; a politica é nobre! O pior é que há muita gente que não serve essas causas, antes se serve, e de forma alarve!
Mas logo a ele voltei, ao ler ontem de manhã o artigo de João Bonzinho neste jornal, e que me serviu de inspiração - ‘Esta gente’! O título de um poema de Sophia de Mello Breyner, que muito aprecio, como apreciei o texto que o antecede.
Contudo, meu caro João Bonzinho, fez jus ao seu apelido ao considerar ‘esta gente’! Desculpe a correcção, mas corja, escória, ou, de uma forma geral, gente de baixa condição moral, cultural e social não é gente é gentalha!