Em maré de balanço
Esta será a última crónica que vos escrevo este ano. Quando voltar a este espaço (assim o espero), estaremos já no dia 8 de Janeiro de 2019. Quer isto dizer que o Natal e a passagem de ano estão à porta. Isso impele-me a uma espécie de balanço do que procurei aqui fazer nos últimos meses.
Como saberá quem me acompanha nestas linhas, no ano que agora termina, centrei muito do meu discurso em questões de arbitragem. Obviamente. Mas, aqui e ali, atrevi-me também a falar sobre outras matérias, sobretudo as que estão ligadas a comportamentos e atitudes, fora das quatro linhas.
Naquela que foi a causa da minha vida, tentei esclarecer tudo o que podia (e sabia) sobre lances, regulamentos e leis de jogo. Pisei e repisei a questão do VAR, desde o seu protocolo-base ao caminho, lento mas gradual, que tem sido percorrido. Um caminho evolutivo e positivo, aqui e ali beliscado por momentos infelizes, por decisões evitáveis, por omissões inexplicáveis. Momentos que, por muito que vos choque, também aconteceram, na mesma medida, drama e impacto, em todas as outras competições onde a tecnologia arrancou.
Outros dos assuntos com que muito vos massacrei e que é agora - confesso - a causa da minha vida, são as agressões a árbitros distritais. A maioria delas perpetradas por pais e adeptos, em jogos sem policiamento, nos escalões jovens. Não sou eu que o digo, são os números oficiais. Foram demasiadas e não parecem ter fim à vista. Falha a prevenção, que pode e deve ser mais firme e falha a punição, que pode e deve ser mais pesada. Mas quem falhou mesmo foram os próprios árbitros. Os de elite, que nem por uma vez, uma só vez, ergueram a sua voz para condenar o que se passava ou solidarizar-se com os seus colegas de outros escalões; e esses, que nem por uma vez, uma só vez, se lembraram de tomar uma atitude firme, no sentido de lutarem pelo mais elementar dos seus direitos: a sua segurança física, psicológica e emocional. Quando são eles que não parecem importar-se, fica difícil para os outros tentarem mudar o rumo das coisas.
Outra das minhas lutas tem sido o ruído excessivo e contagiante que, por vezes, gravita em torno do jogo: a propaganda comunicacional (esta época, reconheço que bem mais contida), as histerias públicas em torno de algumas decisões de arbitragem e o folclore habitual de quem precisa de uma boia para esconder que, afinal, não tem condições para nadar. Se repararmos bem, é tudo uma questão de caráter e personalidade, de classe e civismo. De saber perder e vencer, ainda que com azar ou injustiça, ainda que com sorte ou mérito. Somos como somos, na verdade. Uns maiores, outros mais pequenos e o futebol é apenas a montra visível duma sociedade que ainda procura aprender o que é caminhar livremente numa democracia recente.
O importante agora é olharmos, em conjunto, para o que aí vem. Para o amanhã. Para 2019. Juntos podemos tornar o futebol um espetáculo melhor, um jogo mais bonito, uma verdadeira escola de virtudes. Espero, sinceramente, que estes dias possam dar espaço à reflexão de quem tem capacidade para mudar o rumo de algumas variáveis. Temos enorme margem de progressão, conjuntural e individual e é fundamental que saibamos crescer. Todos temos a ganhar quando percebermos que, juntos, somos bem mais fortes do que separados. A evolução não se faz em tempos de guerra.
Um Santo e Feliz Natal e um excelente ano novo para todos. Para todos... sem exceção.