Editorial: Estranha forma de estar e ser...
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Editorial: Estranha forma de estar e ser...

OPINIÃO17.10.202309:56

Somos mesmo assim, nunca estamos satisfeitos com nada. 0-5? 0-10 é que era...

Portugal vai com oito vitórias em oito jogos da fase de apuramento para o Euro-2024, um feito inédito desde que disputamos as qualificações para grandes competições. Grande coisa, numa série destas o contrário é que seria de estranhar! Marcámos 32 golos e sofremos dois? E depois, devíamos, no mínimo, ter faturado 50. E batemos o recorde  de goleadas com os 9-0 contra o Luxemburgo? Contra quem? Devem estar a brincar! Ontem fomos à Bósnia vencer por 5-0?Uma treta, na segunda parte nem quisemos jogar. Já agora só fomos campeões da Europa em 2016 porque Fernando Santos andou agarrado à santinha que tinha no bolso, e vencemos a Liga das Nações apenas porque jogámos em casa. Ainda mais: só embarcámos na saga dos Descobrimentos porque somos um país com uma fronteira para o mar e outra para Espanha, para onde não nos podíamos expandir, José Saramago só ganhou o Nobel da Literatura porque naquele ano não havia mais ninguém de jeito para galardoar, Durão Barroso foi durante dez anos presidente da Comissão Europeia porque queriam alguém sem poder, António Guterres vai para uma década como secretário-geral das Nações Unidas porque mais ninguém quis o cargo, o 25 de abril não teve jeito nenhum, porque vingou sem qualquer banho de sangue, como uma revolução que se preze, e até Salvador Sobral ganhou o Festival da Eurovisão apenas porque a Europa é composta por uma data de lamechas de coração mole. 

Perante o sucesso, enquanto os espanhóis entram em êxtase, os franceses esquecem que há mundo para além do Hexágono e os transalpinos passam semanas a trautear o Fratelli D’Italia, nós só procuramos razões menores para explicar feitos maiores.

Regressemos ao futebol. Roberto Martínez, a quem se louva o esforço para falar português, o que num espanhol merece aplausos vezes dez, por mais que, volta e meia, se atrase nas substituições ou faça escolhas pouco consensuais, na big picture está a criar um grupo coeso, de onde irá sair uma equipa capaz de nos fazer sonhar. Ontem, na Bósnia, a exibição de Portugal, exuberante e letal na primeira parte, e sólida e adulta na segunda, raiou a perfeição. Por mais que nos subjuguemos ao complexo histórico de desvalorizar o que de bom temos e fazemos, não será tempo de mudar a agulha e valorizar quem somos e conseguimos?