É o que temos
Pandemia satura
Dois meses de vírus devia ser o máximo permitido por lei. Pena não ser verdade o tal passe de mágica que, em Abril, dissiparia a Covid-19 num ai (Donald Trump enganou-se nessa previsão). De qualquer forma, a vida continua ainda com muitas limitações e vamo-nos habituando a esta nova realidade que não pedimos e não merecemos quase sem reparar que todas as restrições que ela contém são profundamente anti-humanas, assim ao género do ponto 4 das condições de regresso do campeonato enunciadas pela DGS: «Para minimizar o risco de infeção por SARS-CoV-2, os atletas, as equipas técnicas e os árbitros devem manter-se em recolhimento domiciliário desde a data do início da retoma dos treinos para as competições oficiais e até ao final da temporada de todas as competições.» Um excesso a somar a outros que não pode deixar de ser compreensível numa altura como esta: excecional. Todos os cuidados são poucos e ninguém quer ficar com o carimbo de ter facilitado o que não era de facilitar.
Acredito que esse ponto não será cumprido da forma que está enunciado e que as equipas acabarão por ficar confinadas em unidades hoteleiras no mês e meio que durar a competição. Uma espécie de estágio prolongado. Não será a solução ideal, apenas uma das possíveis, um mal menor. O campeonato nos moldes em que vai ser jogado é tudo menos futebol. Parece mais uma experiência laboratorial controlada ao milímetro. Mas não vale a pena torcer o nariz. É o que temos. É o possível. A alternativa é não haver campeonato e, consequentemente, falir a maior parte dos clubes da I Liga. O que é bem pior. Se ao fim de um mês de paragem já estavam praticamente todos com a corda no pescoço (com a exceção momentânea do Benfica muito por força da mega encaixe feito com João Félix), imagine-se o que lhes aconteceria se o futebol só regressasse em meados de agosto ou setembro. Nem é preciso fazer um desenho. Há um certo risco na retoma em fins de maio, é inegável, mas neste momento os clubes não tem outra saída. É a própria sobrevivência que está em causa.
Alemanha eterna
ogrande país de Goethe, Schiller, Dürer, Kant, Nietzsche, Leibnitz, Bach, Beethoven, Marx, Bismarck e Einstein acaba de ver ingleses, americanos e russos celebrarem o 75.º aniversário da capitulação Nazi que levou ao fim da II Guerra Mundial, iniciada em setembro de 1939 com a infame invasão e não menos infame partilha da Polónia pela Wehrmacht de Hitler e pelo Exército Vermelho de Estaline. Como de costume, dos aliados europeus os ingleses foram os que celebraram mais efusivamente. Percebe-se. Foram os únicos que não dormiram com o inimigo e estiveram sempre contra ele. No próximo fim de semana todos os olhares convergirão para a Alemanha desta vez por razões mais simpáticas. Regressa a Bundesliga e com ela o futebol de topo - é a primeira das big five a reatar a atividade. A Europa sempre aprendeu com os alemães, que têm uma civilização magnífica a despeito do tal ethos soturno que os levou a provocar duas Guerras Mundiais e a organizar um dos acontecimentos mais abjetos da História da Humanidade - o Holocausto Judeu. Os alemães são por definição eficientes, rigorosos, super profissionais e muito mais imaginativos do que geralmente se pensa (a infindável lista de maldades e perversidades inventadas pela Gestapo e pelas SS prova-o). No futebol os teutões também são rigorosos e competentes, de modo que todos vamos estar de olho na forma como se vão desenrolar os jogos e de que forma funciona (ou não) a máquina logística montada para garantir o sucesso da operação. Algo me diz que vamos tirar dali algumas ideias.
Dinamarca imaginosa.
Um pouco mais acima, dos primos dinamarqueses, chega uma ideia admirável destinada a trazer os adeptos de volta ao futebol. O Aarhus fechou uma parceria com a plataforma de videoconferências Zoom e vai disponibilizar bilhetes virtuais para os adeptos, em casa, poderem seguir os jogos no estádio, surgindo num dos 22 ecrãs gigantes que o clube vai instalar nas bancadas - ou bancasas?… - do Ceres Park & Arena (20 mil lugares). Os jogadores vão poder ver as caras dos adeptos a apoiarem as equipas e a festejarem cada golo. «É uma iniciativa digital histórica e estamos orgulhosos de sermos o primeiro clube do mundo a utilizá-la, agora que, provavelmente, não teremos adeptos no estádio por algum tempo. Esperamos que outros clubes adiram a esta iniciativa», disse Jacob Nielsen, CEO do Aarhus. Um bom exemplo de criatividade e golpe de asa a que podemos juntar a ideia doutro clube dinamarquês, o Midtjylland - drive-in para 10 mil adeptos assistirem aos jogos em ecrãs gigantes dispostos na parte exterior da MCH Arena. Na Dinamarca finta-se o corona.
Bolsonaro único
Aparece sempre antes ou depois de Donald Trump nos noticiários televisivos. A associação não é inocente, mas até se percebe. Não há muitos chefes de Estado que tenham dito tantos disparates em público e, sobretudo, que tenham feito uma gestão tão desastrada da pandemia. Quer dizer: haver até há - por exemplo, os governos de Boris Johnson (Reino Unido) e Stefan Löfven (Suécia) deixaram muito a desejar pelo caminho errático que escolheram - com elevados custos para os povos e para a economia dos países que governam -, mas não fazem tristes figuras todos os dias. Creio que nesse aspeto nenhum estadista no Mundo iguala Jair Messias Bolsonaro na forma de estar e comunicar. Que me desculpem os leitores brasileiros a franqueza, mas este homem transpira vulgaridade, boçalidade e insolência por todos os poros. A pose desafiante lembra a de um garoto rufia e trauliteiro, o mauzão da turma que, ao fim deste tempo todo, ainda não percebeu que não é por ele querer à viva força desvalorizar a «gripezinha» que ela deixa de ser perigosa e mortífera. Como infelizmente sabem mais de 11 mil famílias brasileiras. Por outro lado, quando vejo nas capas de jornais brasileiros verdadeiras multidões de transeuntes desfilando descontraidamente pelas ruas e avenidas cariocas, paulistas e baianas (os títulos oscilam entre a censura, a incredulidade e a raiva…), fico a pensar que o problema do Brasil não está só no Palácio do Planalto. E quando me lembro que antes de Messias Bolsonaro houve a inenarrável Dilma Rousseff… e antes dela o inenarrável Lula da Silva (farinhas do mesmo saco) sinto uma náusea… e uma certeza: Deus nestes últimos anos foi tudo menos Brasileiro.
Aguentem firme, irmãos: não há mal que sempre dure.