Do Lodo no Cais
Qualquer semelhança entre o ‘Lodo no Cais’ e o lodo fora da relva não é pura coincidência
PARA mim, um bom filme só é um bom filme se me der boas metáforas para a vida - e, por isso, é que Há Lodo no Cais continua a ser um ícone (aparecendo, amiúde, perturbador e perturbante, a cruzar-me a cabeça no fogacho das suas imagens).
Lembram-se? Terry Malloy andara pelo boxe e estando quase a tocar o «altar do êxito» - ficou de destino destroçado por combate que teve de perder, enrodilhado pelas sacanices de um jogo de apostas. Tornou-se, então, obtuso «moço de recados» de Johnny Friendly, cabecinha de um sindicato que, mafioso, controlava a oferta de mão no porto de Nova Iorque, com a ajuda de Charley Malloy, o espertalhão irmão de Terry. Quando Joey Doyle, um dos estivadores, reagiu, arrojado, às suas iniquidades, Friendly condenou-o à morte com o involuntário (e desconhecido) contributo de Terry. Percebeu-o, apenas, ao apanhar, de outro dos mafiosos, o sarcasmo:
- Alguém caiu do telhado…
e quando, chocado, Terry atirou a Charley o murmúrio chocado:
- Colaborei nisto… pensando que só iam apertar com ele…
Charley deu-lhe, cínico, a justificação (em jeito de consolo):
- Joey tornou-se demasiado difícil…
Terry (e não só…) percebia assim as consequências de se «quebrar a lei do silêncio», as consequências de alguém se atrever a ir à polícia «lavar a roupa suja do sindicato» - e aceitando, esfarrapado por dentro, que «as coisas tivessem de ser mesmo assim» (resolvidas em «golpe baixo») - e pôs-se a criar pombos no terraço da sua casa (que era o que Joey fazia antes de o matarem) e, vendo-se já Edie, a irmã de Joey, na missão de denunciar o «sangrento ajuste de contas», apanhou-se -lhe o cochicho:
- Nesta cidade há muitos falcões. Posicionam-se estrategicamente no cimo dos grandes hotéis e quando veem pomba no parque lançam-se sobre ela.
É, qualquer semelhança com a realidade do futebol português (o que não se joga na relva) não é pura coincidência...