Diferentes ou ... indiferentes?!!!
Raymond Poincaré foi um político francês que serviu a França como seu 10.º Presidente, entre 1913 a 1920, além de ter sido Primeiro-ministro em três ocasiões diferentes: primeiro entre 1912 e 1913, depois a partir de 1922 até 1924 e por fim de 1926 a 1929. No inicio deste seu terceiro mandato, terá exclamado: «A hora já não é para recriminações retrospectivas. Pouco importa o passado! É para diante de nós que é preciso olhar!»
Os sportinguistas, em especial os que neste momento têm responsabilidades, ou aqueles que em breve as podem vir a ter, têm que meditar nisto e afirma-lo claramente, ainda que sem esquecer o passado e, designadamente, o passado recente, isto é, não se pode dizer que pouco importa esse passado. Temos, porém, de olhar para o presente e para o futuro. Temos de pensar e decidir o presente, mas com os olhos postos para além de oito de Setembro!
Há oito dias atrás a nação sportinguista debatia-se, contorcia-se e enfraquecia - se numa luta dissolvente de confrontos e retaliações, numa crítica demolidora, entre um pessimismo doentio e a amargura da desilusão. Pouco mais se fez de que criticar ou usar a má língua, mais do que destruir, desvirtuar costumes saudáveis, corromper consciências e inteligências. Agora, porém, basta!
Há quem diga que a assembleia geral de dia 23 passado cortou o mal pela raiz com a destituição do Conselho Directivo. Não me preocupa que o digam, mas fico pouco tranquilo com os que assim pensam. Todos nós sabemos que quando retiramos as ervas que estão a prejudicar um terreno, elas voltam a crescer se não tratarmos do terreno onde elas brotaram.
Soou a hora, e ela é decisiva, para o Sporting Clube de Portugal - um clube desportivo, constituído como pessoa colectiva de direito privado e declarado de utilidade pública pelo seu contributo em prol do desporto - e para a sua sociedade anónima desportiva, Sporting Clube de Portugal, Futebol SAD! Passou o momento das lutas inglórias, o período dos ataques e da destruição. A hora que passa tem de ser uma hora intensa de trabalho: de conservação do que de bom se fez, de reconstrução do que se destruiu, uma hora de realizações concretas e produtivas para o clube e a sua SAD.
Não é fácil tratar dos assuntos de uma sociedade anónima desportiva, relacionada com um clube, mas com temas e timings muito próprios, alguns de resolução imediata! É hora para trabalhar e, das duas, uma: ou mostramos que somos realmente diferentes pela raça e firmeza com que os tratamos ou vamos revelar a impotência da nossa força e traçamos a condenação do nosso próprio destino.
Mais difícil ainda quando há eleições no clube no dia 8 de Setembro, depois de fechado o período de inscrições de jogadores e, de momento, ainda não há treinador, para dois meses, para uma época ou para duas ou três!...
Mas, por que mais difícil, é um tremendo desafio à capacidade dos candidatos, uma vez que nos parece de grande inutilidade a habitual apresentação de jogadores no caso de o candidato ser eleito, ou de grande prejuízo para o clube o facto de alguém apontar um treinador para um projecto, quando o treinador contratado, pelos responsáveis actuais pelo clube e pela SAD, estará com dois ou três jogos da Liga disputados, com sucesso, sem sucesso ou assim-assim!
Mas é nesta situação concreta, e não outra, que agora não existe, que temos de tirar alguns ensinamentos para o futuro. Para o presente o que conta são decisões concretas, sobre problemas concretos, nas condições que temos e em que estamos. Com efeito, no futuro temos de pensar numa forma de governance que concilie e compatibilize a emoção do clube-associação com a razão da sociedade anónima desportiva. O sócio e o accionista não são incompatíveis, mas de um ponto de vista objetivo são realidades distintas.
E a situação concreta que temos é a gestão do clube por uma comissão e não por corpos gerentes eleitos em assembleia geral de sócios. E, se a situação não é inédita, é muito diferente da vivida na já longínqua época de 1979/1980, em que até fomos campeões nacionais de futebol. Para começo de análise foi há trinta e oito anos, e muita coisa mudou: desde logo, o velho departamento de futebol transformou-se - é o termo correcto - numa sociedade anónima desportiva! Depois a génese da comissão de gestão foi o facto do Presidente João Rocha não se querer recandidatar e não terem aparecido candidatos, e toda a gente esperar que, ao fim e ao cabo, seria, como veio a ser, João Rocha o novo presidente que também era o presidente da comissão de gestão. Isto então faz toda a diferença! Tanto mais quanto os agora membros da comissão de gestão assumiram o compromisso de não se envolverem em candidaturas ou listas.
E essa postura de dignidade, voluntariamente assumida, deve merecer de todos os candidatos e não só, o respeito, pelo menos institucional, perante as decisões que tomarem, no que respeita ao futebol ou outros sectores do clube, que, pela sua natureza e importância, podem não ser conciliáveis com os interesses pessoais, mas serão as adequadas aos superiores interesses do Sporting. Não há que fazer, como na politica, em que após uma mudança de governo, há que mudar tudo ou quase tudo, numa mudança que tem a ver com os interesses partidários e não com os do país!
A actual comissão de gestão tem uma missão e uma missão difícil. Há que respeitar a sua missão. Vivemos um período eleitoral num clube democrático, em que deve haver liberdade de expressão e opinião. Mas isso não é incompatível com o respeito pelas instituições, antes pelo contrário, pois democracia também é respeito pelas ideias dos outros e pelas decisões de órgãos que, ainda que temporários e de transição, são legítimos. Todas as decisões desta comissão devem ser respeitadas e acatadas desde que defendam os interesses superiores do Sporting!
O momento é especial e difícil. É um grande desafio à capacidade de todos nós, designadamente, à capacidade de unir e aglutinar. Se não se vencer o desafio, não teremos mais autoridade moral para dizer que somos diferentes. Passaremos a ser ... indiferentes!...