De Verona para a eternidade

OPINIÃO15.08.201804:00

O que mais me tem impressionado no efeito Ronaldo, além do espaço que lhe dedicam os media, é o respeito e carinho que lhe dispensam os adeptos e os profissionais do futebol italiano - mesmo os que não são afetos à Juventus. Todos os dias leio comentários e expressões elogiosas para o português - algumas reveladoras de orgulho e agradecimento por ele ter escolhido a Série A para prosseguir a carreira. Diria que a Itália parece grata a Cristiano. Num povo tradicionalmente cioso dos seus jogadores, dos seus treinadores e dos seus pergaminhos (são tetracampeões do Mundo!) e algo avesso a prodigalizar, assim do pé para a mão, elogios a quem vem de fora, é reconfortante perceber que eles têm perfeita noção do estatuto e da dimensão de Cristiano. Algo que, se calhar, nem sempre foi devidamente aceite e sublinhado pelos nossos amigos espanhóis. E se eles tiveram tempo para perceber o que tinham ali. No domingo passado a Gazetta dello Sport considerava CR7 «o melhor futebolista do Mundo com Messi, embora nos últimos anos Cristiano tenha sido quase sempre melhor». Logo após a estreia de Cristiano em Villar Perosa, assinalada com um golo aos 7 minutos e 16 segundos, John Elkann, CEO da Exor (a holding que controla a Fiat-Chrysler, a Ferrari e a Juventus) disse que a «equipa mais forte tem agora o [jogador] mais forte». As primeiras páginas dos três diários desportivos no dia seguinte eram esclarecedoras sobre a popularidade de CR7: «CRISTIAamo» (com um coração)», titulou a Gazetta, de Milão. «Ronaldissimo», escreveu o Tuttosport, de Turim. «ALIEN», titulou em letras garrafais o (ITÁLICO) Corriere dello Sport, de Roma. O entendimento com Paolo Dybala incendeia a imaginação dos adeptos e dos jornalistas, que acreditam poder esta dupla suplantar outros ‘tandéns’ imortais da Juve: Omar Sivori-John Charles (1957-1962), Boniek-Platini (1982-1985), Vialli-Ravanelli (1992-1996) e Del Piero-Trezeguet (2000-2010). Para encontrar uma euforia assim talvez seja preciso recuar a julho de 1984, quando Diego Armando Maradona aterrou em Nápoles vindo de Barcelona e foi recebido como um deus por 75 mil adeptos no estádio de San Paolo.  

É neste ambiente de enorme expectativa que Cristiano faz a estreia oficial com a camisola da Juventus, no sábado, em Verona, no estádio Marcantonio Bentegodi, que estará a rebentar pelas costuras. O guarda redes do Chievo, Stefano Sorrentino (39 anos), tentará evitar o golo que mais de 12 milhões de adeptos juventinos querem gritar. Toda a gente está à espera que Cristiano continue a marcar e não passa pela cabeça de ninguém que o registo estrastosférico de Madrid não tenha continuidade em Turim. É um risco grande dar isso por garantido mas, enfim, se alguém parece capaz de, aos 33 anos, continuar a marcar 50 golos por época… esse alguém é mesmo Ronaldo. Para ele, é o terceiro recomeço depois do adeus à casa-mãe de Alvalade no verão de 2003, com destino a Old Trafford. 15 anos depois, Cristiano abraça um desafio particularmente difícil no rochoso futebol italiano depois de consolidar em Madrid o estatuto de lenda viva do desporto. Na realidade, estatuto que é pau de dois bicos, mas quem aponta à eternidade não perde tempo a pensar no que pode correr mal…