Correr com Bolt dali para fora
USAIN BOLT estará de saída da equipa de futebol australiana Central Coast Mariners, onde se arriscara em nova carreira, porque estes não o consideram satisfatoriamente bom para lhe pagar muito e Bolt discorda.
Ainda que tal não cause espanto, repare-se como nos agrada acalentar esta ideia do desportista renascentista, se me for admitida a expressão, querendo eu com ela dizer que nos atrai a consideração de um atleta tão bom que estará apto a mudar para outra modalidade assim de um momento para outro, como um Da Vinci, um polímata (é esta a palavra), alguém cujo conhecimento detalhado não se restringe a uma área. Estes de Da Vinci, recorde-se, foram tempos que antecederam em séculos as especializações profissionais que nasceram sobretudo com a revolução industrial, contudo as ideias estimulantes perduram e, honrando-as, achamos sempre que Jordan pode jogar basebol ou que Ronaldo podia, se tal lhe apetecesse, tornar-se atleta de realce em provas de velocidade. Mas não funciona assim. Bolt é mais rápido do que qualquer outro futebolista, claro, contudo cansa-se facilmente, não está habituado a mudanças de velocidade ou direção e desconhece rotinas de um futebolista, como passar e mover-se. A velocidade singular nunca lhe servirá ali e ele também já deveria sabê-lo. Só dessa forma, aliás, me parece justificável que os Mariners lhe tenham oferecido um contrato de 150 mil euros (e com o treinador dizendo que Bolt não cabe na equipa...) e Bolt tenha pedido 3 milhões, 20 vezes mais! A disparidade demonstra, então, que Bolt sabe que como futebolista é só um velocista quase mitológico ou não insistiria na preservação de um valor comercial descaradamente acima do préstimo desportivo.
Nestes atrevimentos sport-renascentistas esfuma-se-me sempre um pouco da aura destas figuras.