Conselho de Disciplina da FPF
A justiça desportiva em Portugal, no seu todo, é demasiado lenta, burocrática e branda
SEI o que alguns dos caros leitores estarão a pensar: ‘Volta e meia, este moço põe-se a jeito’. Mas olhem que não. Escolher temas mais ou menos atuais e opinar livremente (se eu pudesse, sublinhava a palavra livremente) sobre cada um deles não requer nem coragem nem loucura. É apenas o normal. Aquilo que se espera de quem, nesta fase da sua vida, tem obrigação profissional de dizer o que pensa sobre assuntos de interesse ligados ao desporto e ao futebol em particular.
O título da crónica não é, portanto, aleatório. Pelo contrário. Resulta do facto de, ainda na passada semana, este órgão ter estado notoriamente ativo no exercício das suas funções: pronunciou-se sobre alguns dos incidentes ocorridos no clássico; viu respondido o recurso por si apresentado ao Supremo Tribunal Administrativo (STA), sobre o caso Palhinha; e abriu procedimento interno sobre notícias vindas a público e que alegadamente envolveram, num passado recente, uma sociedade desportiva e um ex-árbitro de futebol (à data dos pretensos factos, no ativo).
Antes de mais, declaração de interesses importante: não conheço nenhum elemento do atual Conselho de Disciplina (CD). Não conheço a sua presidente, os seus vices, nem os seus vogais. Como compreenderão, nada - mas mesmo nada - me move a favor ou contra as pessoas ou profissionais que ali desempenham essas funções.
Dito isto, acho - e é mesmo uma questão de achar - que este órgão disciplinar é independente, sério e competente. É um daqueles que vai a direito, como se diz na gíria. Isso, a meu ver, é saudável. Muito saudável para a transparência de um jogo cheio de vicissitudes.
Claro que não discuto o mérito ou justiça de cada decisão que profere. Não sei se são todas coerentes e uniformes ou injustas e desadequadas. Confesso que não conheço todos os processos analisados nem tenho qualificações para me pronunciar sobre matérias cuja essência dos trâmites desconheço.
O que realmente acho (lá está o achar de novo) é que as suas decisões não têm nem cor nem agenda. Têm uma vontade clara, que é a de repor a justiça possível, dentro do enquadramento regulamentar e legal em vigor.
Entre outras, há duas razões que me levam a suportar esta perceção: o facto de muitas das suas decisões (sobretudo as mais mediáticas) serem alvo de críticas transversais, que chovem de todos os lados e não só de um ou de dois (isso sim, seria mau sinal); e o facto de lutar por cada decisão até às últimas instâncias, que é como quem diz, esgota todas as vias legais para defender aquela que é a sua visão jurídico-desportiva. Este CD não se conforma com vetos do TAD ou com outras pedras que legitimamente são colocadas no seu caminho: interpôs recurso até à ultima instância em todas as ocasiões em que foi derrotado (todas sem exceção). Curiosamente, em sede final, venceu bem mais de 90% dos seus recursos.
Nessa matéria, honra seja feita à FPF, que foi institucionalmente solidária em todos esses momentos. É fácil constituirmo-nos assistentes inicialmente para sairmos de cena à primeira derrota. Difícil mesmo é manter a posição até ao fim. Tem que haver disponibilidade financeira, sim, mas também confiança na verdade dos nossos.
Este elogio público, que tenta ver para lá da espuma ou de reações mais emocionais, não afeta opinião maior, que mantenho há muito: a justiça desportiva em Portugal, no seu todo, é demasiado lenta, burocrática e branda. Está refém de regulamentos desportivos, leis e até direitos constitucionais (convenhamos, algo simpáticos nos direitos concedidos aos arguidos) que permitem o aproveitamento de um conjunto de expedientes que fazem arrastar processos durante meses. Expedientes que, convenhamos, servem a quase todos. Tal como acontece em campo, a culpa nem sempre é de quem aplica a regra, é de quem a faz e não a muda. Há coisas que são muito difíceis de alterar, mas é preciso tentar e começar por algum lado, senão permanecem imutáveis.