Carta ao nosso caro Miguel

OPINIÃO23.09.201801:37

Escrevo-te esta carta no final de uma semana de esperança e de múltiplas notícias. Tu, bem entregue ao nosso Serviço Nacional de Saúde, e nós, sujeitos a múltiplos emails, à fantástica última aula do nosso querido Professor Marcelo - nós que fomos seus alunos em 1973(!) - e à notícia de uma outra colega de curso de Direito ir substituir como Procuradora Geral da República uma amiga e que desempenhou, com total dedicação à verdadeira causa pública, e nos últimos anos,  uma missão reconhecida e complexa, difícil  e estimulante, em que combinou virtude com querer, prudência com honra. É que, como aprendemos com o imortal Padre António Vieira, «o cargo igualmente pesa, como decorosamente honra»! E escrevo-te a seguir à primeira jornada da Liga dos Campeões e depois do teu Futebol Clube do Porto ter jogado em Setúbal, o meu Benfica jogar hoje na Luz e o Sporting do nosso Eduardo se deslocar apenas amanhã a Braga. Calendários europeus a condicionarem a nossa Liga. E, assim, antes de Atenas o Benfica joga já na quinta-feira em Chaves! Sei bem que aí nessa enfermaria todos são Miguel. Todos mesmo! Como cá fora todos o somos. Eu e o Paulo, os Vítor(s) e o Zé Manuel, o Pedro e lá longe o Henrique, a Rita e a Carla, a Ana e a Isabel  e tantas e tantos outros que gostam de ti, da tua simpatia, da tua fidalguia e do teu singular gosto de bem receber e bem servir. Sei bem, meu caro Miguel, que estás confrontado com a vida. E, por isso, brindo à vida. Eu e o Joaquim, ontem mesmo, assim o fizemos com a consciência que tu és um portista assumido, vibrante, de cachecol a envolver a alma e a contagiar o corpo. E acredita que a prometida camisola está a chegar para te envolveres nela e com ela nos dares, daqui a pouco, aquele abraço apertado que arrepiará, à noite, as paredes do teu e nosso Lisboa à noite! E lá estará, excessivamente apaixonado como sempre, o nosso querido Eduardo e não deixará de nos contar mais um êxito de uma equipa clínica extraordinária e que leva, na sua especialidade, e com muito orgulho, o nome de Portugal a todas as partes do mundo. É uma equipa bem especial e que nessa vertente é uma das melhores do Mundo. Eu digo, benfiquista assumido, que é a melhor do Mundo. É que, meu caro Miguel, também o mesmo Padre António Vieira nos avisou, há tantos séculos, que «quando considero na vida que se usa, acho que nem vivemos como mortais nem vivemos como imortais. Não vivemos como mortais, porque tratamos das cousas desta vida como esta vida for a terna. Não vivemos como imortais, porque nos esquecemos tanto da vida eterna como se não houvera tal vida».

Meu Caro Miguel,
A nossa vida é feita de momentos. Alegrias e tristezas. Angústias e felicidade. Dedicação e fé. Vitórias e derrotas. Empates alcançados como o do teu Porto na Alemanha e empates conseguidos com sorriso aberto como o de Nuno Espírito Santo ontem no teatro dos sonhos face ao Manchester de José Mourinho. E com uma armada portuguesa a elevar, tal como todas as noites o Lisboa, a nossa comum autoestima. O que sei, o que sabemos, é que queremos ver-te sorrir, a encomendar o meu delicioso bola de bolacha - sabes que já pediram a receita e nós … nada ? - a servires o robalo à Toni, a promoveres uma cabidela para degustar e o Eduardo, desta vez, não comerá apenas uma garfada (!), a teres entusiasmo, como todos os teus colegas, em nos receber em português e largas dezenas nas múltiplas línguas e carteiras que, graças a Deus, enchem Lisboa e a mostrares, na tua alma transmontana que em Lisboa, em pleno Bairro Alto, e à noite, há mérito e  mundo, há querer e respeito, há sonho e segredo. Este segredo que leva um portista, um sportinguista e um benfiquista a celebrarem a vida. Sim, a vida. Já que cada um de nós, na plenitude das nossas diferenças, é um ser que não se repete e que tudo devemos fazer para celebrarmos a vida.  E este sentido de unidade poderia chegar a todo o nosso desporto. O teu - vosso - dom de bem receber, de acolher com um sorriso, de abandonar palavras amargas, de nos despedirmos com um abraço apertado ou com uma fotografia calorosa não é, apenas, um reflexo de educação. É um marco cultural e civilizacional. Que anda afastado de muito convívio, de muita relação, mesmo que social. Mesmo que dizem «dentro da mesma indústria» e que até tem uma organização que a representa e, também dizem, que a defende!! Sei bem que em momentos duros e complexos não há nem clubes, nem cores. Mas também sei que aí, aí sim, há disponibilidade e solidariedade, excelência e competência, sagacidade e tenacidade, reconhecimento e sentimento. E são estes sentimentos que nos levaram a escrever esta carta. Os que gostamos, mesmo de verdade de desporto e também de futebol - benfiquistas e portistas, sportinguistas e academistas, de Belém do Atlético ou do Casa Pia, do Futebol Benfica ou do Vila Real, do Bairro Alto ou de Marvila - queremos discutir, a sério, os mails e todos os apitos, as grandes penalidades que o VAR não viu e a expulsão sem sentido do Cristiano Ronaldo, os aplausos justos ao Renato Sanches e o génio do Bernardo Silva, os fora de jogo não assinalados e os frangos concretizados, todas - mesmo todas - as camisolas ofertadas e os apertos de mão trocados e não sinalizados. Queremos falar acerca de tudo, Miguel. De tudo! Temos muitas quintas-feiras, à noite, com ou sem mudança de hora, para o fazer. Diria assim que largas quintas-feiras. E com a certeza que no singular Bairro Alto a roupa estendida continuará a cair, de mansinho, sobre as mesas onde se degusta um bacalhau assado e se prova um vinho do Douro que embala toda a noite. E nessas noites tu, portista declarado, eu, benfiquista encartado, e, por vezes, o Eduardo, sportinguista apaixonado, vamos falar e não gritar, partilhamos momentos e não nos zangamos a não ser por instantes. E, depois, mesmo à saída do repasto e do convívio, com a tua voz suave, entregas os pequenos chocolates que fazem as delícias de uma redação jovem - como o é a da Bola - e que sente e pressente que os poderes públicos - e por excelência o Ministério da Cultura - se deviam interessar muito mais pela imprensa e pela televisão, pela distribuição e pelas operações dos operadores. Incluindo dos novos! Agora, meu bom Amigo, é tempo de recuperar. Temos muito para conversar e debater. E não te esqueças que também gosto de comer uma “pescada com todos”, incluindo com um ovo mal cozido. E são estes todos que te saúdam e que, com cinco pedras de gelo, - sempre és penta! Te fazem um brinde especial À VIDA. Aceita um abraço nosso. De todas as cores e todos os emblemas. De todos aqueles que te querem e te apreciam. De todos aqueles que sabem, de verdade, que só o eu e o tu verdadeiros, nos levam ao nós. E o NÓS é o brinde da VIDA!

Um abraço bem apertado
do Paulo e deste Fernando