Bruno, o ‘sportingado’!...
A língua é um grande património de um qualquer país, seja ele grande ou pequeno na sua dimensão territorial, seja pequeno ou grande na sua riqueza material ou cultural. Portugal é hoje um país pequeno e pobre, em quase todos os aspectos, mas a sua língua é falada em muitos países por esse mundo fora, independentemente de lá viverem ou terem nascido cidadãos portugueses. É hoje uma língua em expansão, tendo eu, ainda esta semana, assistido a uma a uma intervenção sobre o tema, onde se referiu que há actualmente na China 40 universidades onde se ensina o português!
O português é uma língua poética, e foi nele que foram escritos ‘Os Lusíadas’, de Luís Vaz de Camões, cuja data da morte - amanhã - é comemorada como o dia da raça. O português é a língua que foi eruditamente tratada por Camilo Castelo Branco; o português é aquela língua que, simplesmente tratada, deu realismo aos extraordinários livros de Eça de Queiroz. O português é aquela língua que hoje em dia é muito maltratada, chegando mesmo ao ponto de jornalistas e outros grandes responsáveis escreverem um português que ninguém percebe, porque, por vezes, até inventado é!
Lembro-me que, quando era muito mais novo, e designadamente, antes do vinte e cinco de Abril, sempre me ensinaram que ao acto de uma pessoa se deslocar de um lado para o outro se chamava deslocação, até que o Almirante Américo Tomás começou a falar, nos seus célebres discursos, não em deslocações aqui ou ali, mas em deslocamentos ao Porto, a Coimbra ou outros locais. Em breve, os seguidores do regime passaram a adoptar o termo deslocamento, em vez de deslocação, e hoje as duas palavras, significando o mesmo, fazem parte de qualquer dicionário. Por mim, apesar de entender que a língua é dinâmica, e nada ter contra os neologismos, continuo e continuarei a dizer deslocação e a emendar sempre que me falarem em deslocamentos.
E a propósito de língua portuguesa, recordo também uma palavra desta língua, que não tem paralelo ou semelhança com qualquer outra de qualquer língua e que traduz o sentimento que me assalta neste momento a cada dia, quando não a cada hora: saudade! A mágoa de me ver privado de uma coisa que há muito me diz respeito, porque faz parte da minha vida - o Sporting!
Não estou privado do ‘sportinguismo’, palavra que não existe no dicionário, mas que traduz um sentimento único, um sentimento de ligação ao Sporting Clube de Portugal e a tudo o que lhe diz respeito, designadamente, a sua SAD, que parece agonizar com a saída do treinador, rescisões de jogadores da sua formação e de outros que são activos em que se investiu. E como eu, milhares e milhares de sportinguistas - plural da palavra sportinguista que significa ser relativo ao Sporting ou adepto deste clube. Essa palavra existe mesmo no dicionário, e além de traduzir o que acaba de se referir, sempre traduziu, como o ‘sportinguismo’, um sentimento de simpatia e respeito entre os sócios e adeptos do Sporting Clube de Portugal, pese embora ideias divergentes acerca de determinados assuntos e que causaram alguns momentos de crispação, mas que sempre foram ultrapassados em nome dos superiores interesses do Sporting.
Momentos de grande divisão, que eu me lembre, ao longo dos meus 55 anos de sócio, e quase quarenta mais ligado à gestão e direção do clube, directa ou indirectamente, foram o mandato de Jorge Gonçalves, aliás curto, a questão da venda ou não do património não desportivo e o momento actual, que eu ainda não sei se é uma grande divisão entre o que queremos e o que não queremos, porque os sócios do Sporting Clube de Portugal, têm todos um sentimento e uma opinião, mas nem todos o podem exprimir na Assembleia Geral, onde reside o poder soberano do clube, mas labregamente desrespeitada pelo Presidente do Conselho Directivo.
O Sporting Clube de Portugal não tem antes, nem depois, como se fala do antes ou depois de Cristo. O Sporting tem história, e uma história mais que centenária, de que todos nos orgulhamos, assumindo as glórias com alegria e humildade, e as derrotas sem quebra de dignidade ou carácter. A barreira recente do antes de Bruno de Carvalho e depois deste, foi por ele próprio estabelecida. Felizmente, todos sabemos o que foi o Sporting antes de Bruno de Carvalho, inclusivamente, jovens que nunca viram o Sporting ganhar o campeonato nacional, mas que conhecem a sua história, e que choravam no fim do Rio Ave com o Sporting, reclamando a salvação do seu clube - imagens que não mais esquecerei, independentemente das alegrias que o Sporting ainda me vier a dar. Infelizmente, porém, ninguém sabe o que será o Sporting depois de Bruno Carvalho!...
O passado sabemos todos o que foi; o futuro não sabemos o que será. Sabemos que o momento presente é de angústia e de mágoa, porque temos a nossa palavra dependente da justiça e não simplesmente dos nossos estatutos e vontade. Vive-se ou sofre-se um sentimento confuso e inexplicável, que resulta do facto de a vontade dos sportinguistas terem tornado realidade o sonho de criança de Bruno de Carvalho e ele ter transformado essa realidade num pesadelo dos e para os sportinguistas!
Não será por essa ingratidão que ele ficará conhecido na história do Sporting, como se calhar não ficará pelas boas obras que faz questão de apagar, porque a sua personalidade não admite qualquer outro protagonista, mesmo que seja o Benfica pelas piores razões. E depois nós é que somos os ingratos?!!!
Mas sem dúvida ficará na história, porque foi no seu reinado que aconteceu o que aconteceu em Alcochete. Como ficará na história a sua reação: «foi chato mas amanhã é outro dia». Seguiram-se realmente outros dias, com saída de jogadores, do treinador, e mais não sei quantas coisas, ridículas ou sérias, que custa recordar. Amanhã só será outro dia, quando Bruno Carvalho sair e ficar apenas para a história!
E ficará, sem dúvida, na história do Sporting, como ficaram e ficam todos os Reis ou Presidentes da República, na história de Portugal. Aqueles com o respectivo cognome, como, por exemplo, Afonso Henriques, o ‘conquistador’; D. Dinis, o ‘lavrador’ ou D. João I ‘o de boa memória’! Bruno de Carvalho escolheu o seu próprio cognome para história, porque só ele manda e só ele sabe. Porém, apesar de se ver como ‘o rei - sol’, optou por ficar na história, cognominando-se com uma palavra que não existe no dicionário, mas que, por ironia, ele próprio criou para qualificar outros: Bruno, ‘o sportingado’!...
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