Bruno Fernandes e mais dez
O Sporting entendeu fixar um teto muito alto para a venda de Bruno Fernandes e não tendo havido candidatos que chegassem a esse valor, decidiu não ceder, não abrir a época de saldos e manter, na sua remediada casa, o diamante da coroa imperial. Julgo que ninguém de bom senso poderá criticar a Direção leonina por essa decisão e, no entanto, ela não se revelou decisiva para qualquer tipo de solução nesta fase de profunda crise desportiva do clube.
Aliás, admito que possa chocar muitas pessoas, sportinguistas e não sportinguistas, se arriscar publicamente a opinião de que a continuidade de Bruno Fernandes, em Alvalade, foi prejudicial, em primeiro lugar, para ele próprio e, depois, para o crescimento natural da equipa e dos seus jogadores.
Foi e será prejudicial para Bruno Fernandes, porque a tentação de se considerar obrigado a ser a solução do Sporting, provoca-lhe um nível de ansiedade que não lhe permite ser o jogador taticamente lúcido que costumava ser; foi e será prejudicial, porque a sua elogiável liderança, tão importante na época passada, se transformou, agora, para todos os companheiros, numa submissão que anulou a criatividade e a livre iniciativa no jogo; foi e será prejudicial, porque existe, da parte do capitão do Sporting, uma obsessão pela utilidade efetiva, pelo controlo de toda a situação de jogo, que o leva a ser um recetor obrigatório da bola, marcar livres em qualquer zona do terreno, fazer passes irrepreensíveis, lançamentos da linha lateral e, ainda, fazer golos em todos os jogos.
Bruno Fernandes é, hoje, um jogador que exige ter uma omnipresença em todos os lances. Deixa de fazer em qualidade o que se obriga a fazer em quantidade.
O pior é que Bruno Fernandes é demasiadamente inteligente para não notar que em vez de se sobrevalorizar com tanto empenho, tanta dedicação, tanta vontade, tanta influência, acaba por se desvalorizar aos olhos do mercado e dos mercadores.
É bem possível que, a continuar assim, o seu valor diminua drasticamente no final da época, com prejuízo evidente para si próprio e para o clube, que tão apaixonadamente quer ajudar.
Mas há pior. De tanto querer ser, Bruno Fernandes condiciona a equipa e condiciona qualquer treinador que não tenha estatuto suficiente para lhe impor ser apenas e só ele próprio, ou seja, um dos melhores médios do futebol europeu, na atualidade. Sendo que para o ser, não pode ser ele e mais dez, tem de ser um entre onze, mesmo quando toda a gente percebe que esse um é diferente, marca o jogo pela classe e pelo brilho de um diamante que já não faz sentido estar em qualquer montra que não pertença a uma das mais caras joalharias europeias.
O Sporting precisava de um treinador de créditos firmados com estatuto irrepreensível, precisamente por causa de Bruno Fernandes. Contratou Silas e com essa contratação fez uma aposta de risco. Pode dar certo? Claro que sim, tal como qualquer cidadão pode acertar no Euromilhões.
Claro que Silas é experimentado no futebol, mesmo sem ter grande experiência como treinador. Ele sabe que Bruno Fernandes tem de voltar a ser unicamente o grande futebolista que é. Para bem dele, para seu sossego e resfriamento dos nervos que, em todos os jogos, o trai em campo; e para bem da saúde física e psicológica da equipa e de todos os jogadores do Sporting que tão precisados estão de se sentirem suficientemente livres para crescerem e se desenvolverem.
Aqueles que pensam que isto é maldizer de Bruno Fernandes, enganam-se. Não me lembro que alguém tenha dito ou procurado fazer tão bem.