Bravo, Inglaterra! Nem parecias tu

OPINIÃO04.07.201804:00

Eric Dier, produto de Alcochete, não tremeu e a Inglaterra eliminou a Colômbia no desempate por penalties depois de ter sido eliminada dessa forma por seis vezes (em seis possíveis) desde 1990. Foi histórico! Os ingleses têm agora uma oportunidade única de chegarem a uma meia-final do Mundial, onde não põe os pés desde o Itália-1990: vão enfrentar a Suécia, uma seleção rija e atlética que não venceria nenhum concurso de beleza. Se a Imprensa inglesa saudou com o habitual delírio de exageros as vitórias dos Três Leões sobre os minorcas da Tunísia (2-1, no último fôlego) e do Panamá (6-1), faço ideia como serão os títulos de hoje! Mais a mais, a Inglaterra está no lado bom do quadro e até pode chegar à final sem ter defrontado qualquer tubarão pelo caminho, ao jeito de Portugal no Euro-2016. Lembre-se: Tunísia, Costa Rica, Bélgica B, Colômbia… agora Suécia e se houver um depois é com a Rússia ou a Croácia. No momento em que escrevo estas linhas (noite de ontem) há muito ingleses eufóricos a beberem nos  bares do Bairro Alto - e de todo o Mundo - e a cantarem vigorosamente os refrões que os tablóides de hoje não deixarão de reproduzir - «Heroes!», «Come on England!», «We’re going to the final!», etc, etc. É claro que neste momento ninguém se lembra que a Inglaterra foi eliminada pela Islândia (1-2) no último Europeu e que a Suécia representa uma ameaça bem mais séria que os islandeses. Da mesma forma que nenhum adepto inglês aceitará que o endeusado Gareth Southgate («o homem que nos fez voltar a acreditar!», escrevia no outro dia o  Daily Mail) não inspira a confiança que o experiente Bobby Robson inspirava no Mundial de 1990, quando a formidável equipa inglesa, depois de eliminar os Camarões de Roger Milla nos quartos-de-final (3-2) com dois penalties de Lineker, caiu em Nápoles, na meia-final, aos pés da Alemanha de Matthaeus, Klinsmann e Voeller (no desempate por penalties, claro) no final de uma batalha épica. Os ingleses tinham Shilton, Pearce, Lineker, Gascoigne, Waddle, Platt, Beardsley, Barnes e McMahon e, mesmo com muito boa vontade, não consigo estabelecer qualquer paralelo com esta equipa de Kane, Delle Ali, Lingard e Sterling. De qualquer maneira a Selecção inglesa - a eterna candidata - parece a caminho de alguma felicidade. E faz sentido, não é? Os ingleses têm a Liga mais fascinante do Mundo, gostam de futebol como ninguém, cantam e vibram nos estádios como ninguém, investem e pagam como ninguém e tem lá grandes jogadores e os melhores treinadores do Mundo (estrangeiros, claro). Alguma vez a Selecção principal tinha de sair da cepa torta!

O Brasil segue em passo firme. Nenhuma surpresa. Terceira vitória por 2-0 e o México (eterno quase, caem nos oitavos pela sétima consecutiva…) podia ter apanhado bem mais. Escrevi aqui no inicio do Mundial que o Brasil era o favorito por me parecer, entre as selecções mais fortes, a que tem menos pontos fracos. Mantenho e até reforço essa ideia. O Brasil tem talento, tem consistência e defende bem - na verdade todos defendem quando é preciso, até Neymar - o craque com mimica de palhaço. E tem um treinador lúcido, competente e actualizado em Adenor Leonardo Bachi, dito ‘Tite’. Bem sei que a canarinha ainda não defrontou ninguém da primeira linha (Suíça, Costa Rica, Sérvia, México… e esteve quase a ser Japão!) e a Bélgica, desconfio, não será para os brasileiros um escolho assim tão grande. O grande teste estará reservado para a meia final, com a França ou o Uruguai. Qualquer delas já causou desgostos profundos a milhões de brasileiros. O Uruguai em 1950 (Maracanazo…) mas sobretudo a França, verdadeira besta negra dos canarinhos: deu cabo deles nas últimas três vezes que se defrontaram: em 1986 (quartos), 1998 (final) e 2006 (quartos). 

A terminar. Como não admirar a selecção japonesa e respectivos adeptos, que deram consecutivas lições de  fair play e civismo nas bancadas (quem esquece as imagens deles a recolherem o lixo no final dos jogos?) O jogo com a Bélgica foi um espectáculo frenético, talvez o melhor do Mundial, que terminou de forma cruel para os nipónicos (pagaram bem caro certas ingenuidades). Pois nem essa imensa decepção impediu os jogadores de deixarem o balneário num brinquinho e um papel a dizer «obrigado» em russo. Frequentador diário das ruas lisboetas e testemunha indignada das suas imundicies, tenho a certeza que não perderíamos nada em imitar essa faceta da cultura japonesa.

 

Peseiro: pouco entusiasmante mas... 

Sousa Cintra escolheu José Peseiro e assumiu a responsabilidade da aposta. Que é arriscada. Peseiro regressa a uma casa onde foi muito infeliz há treze anos e ainda por cima não tem tido resultados nos últimos tempos (não vingou no FC Porto, no SC Braga e no V. Guimarães…). Não é, portanto um nome entusiasmante para o sportinguismo, mas isso não quer dizer que Peseiro não possa vir a ser feliz nesta segunda passagem, algo que não se via em Alvalade desde que Manuel José foi convidado a regressar em fevereiro de 1989 depois de ter orientado os leões entre 1985 e 1987 (não correu bem: foi novamente despedido e substituido por Raúl Águas). O tempo é outro, a conjuntura é outra e as expectativas são forçosamente menores em face da brutal sangria que o plantel sofreu. Peseiro sabe isso como sabe que este plantel não lhe dá as garantias que dava em 2005: nesse tempo havia Ricardo, Polga, Miguel Garcia, Beto, Rogério, Rui Jorge, Custódio, Hugo Viana, Pedro Barbosa, Fabio Rochemback, Rodrigo Tello, Liedson, Sá Pinto, Niculae, Douala… Mas talvez precisamente por ninguém esperar milagres, Peseiro possa surpreender, fazer mais que o esperado e sacudir de vez o ferrete de pé frio. Creio que é esse o feeling de Sousa Cintra.