Benfica e Sporting: está tudo a pensar no mesmo
Ainda há um Benfica-Sporting na 33.ª e penúltima jornada da Liga

OPINIÃO DE VASCO MENDONÇA Benfica e Sporting: está tudo a pensar no mesmo

OPINIÃO29.04.202508:25

Um alerta: há por aí uma corrente purista segundo a qual não deve haver picardia pública nem sentido de humor nestes momentos. Não liguem demasiado. Vivam um bocadinho

A três jornadas do fim, está tudo a postos para um dos despiques mais empolgantes de que há memória. Digo que está tudo a postos porque a vida é, neste momento, uma sucessão de acontecimentos de moderada relevância entre agora e o dérbi de 10 de maio. Não confundir com bazófia — ainda será preciso vencer no Estoril, e a tarefa não se afigura fácil. Mas, como dizia uma campanha publicitária do Benfica há uns anos, a partir de agora, está tudo a pensar no mesmo. Nesse caso, o slogan referia-se à véspera interminável de uma conquista da Liga muito ansiada. A versão que aqui trago é um pouco mais inclusiva, e, por isso, estendo a consideração aos adeptos do adversário, que têm direito a sonhar com a conquista dos dois títulos em disputa e, por isso, estão a pensar no mesmo que nós, benfiquistas.

De resto, após o discurso motivacional de Frederico Varandas, os sportinguistas aparentam níveis de mobilização como eu não via desde que decidiram exigir a conquista de quatro campeonatos nacionais na secretaria ou, por exemplo, após aquele jogo em que Ricardo fez falta sobre Luisão e ainda teve a lata de se queixar. Faz parte, e não consigo avaliar negativamente a intervenção do presidente do Sporting. Não concordando com algumas coisas que disse, parece-me que o objetivo de galvanizar as tropas foi atingido. Digo-o com desportivismo e porque reconheço que Varandas tem sabido fazer o seu caminho. Por isso, aos meus amigos do lado oposto, envio um abraço e faço votos de que o choro seja abundante e ensurdecedor a partir das 20 horas de 10 de maio. Aos meus amigos benfiquistas, um alerta: há por aí uma corrente purista segundo a qual não deve haver picardia pública nem sentido de humor nestes momentos. Não liguem demasiado. Vivam um bocadinho. O futebol é feito de euforia e de depressão, e só sobreviveremos a ambos os estados de alma se os encararmos com algum sentido de humor. Quanto aos puristas, já sei o que dirão: se o Benfica vencer, saberemos que aconteceu apesar de adeptos como eu, que brincam com coisas sérias. Se perdermos, podem enviar a nota de culpa para minha casa. Mas, aconteça o que acontecer, este frenesim de antecipação já ninguém me tira, mesmo que tente, nem tampouco a visualização do desfecho a 10 de maio.

Poder vencer e celebrar a conquista do troféu na mesma noite, frente ao rival da mesma cidade, seria uma noite bonita na história recente do Benfica, que tão poucos títulos de futebol sénior venceu nos últimos anos, à mercê de uma direção errática e sem estratégia. A derrota, essa, permanece inconcebível por agora. Muito daquilo que torna o próximo confronto entre Benfica e Sporting tão emocionante começa na possível consequência direta: uma vitória de qualquer uma das equipas — no caso do Benfica, por dois ou mais golos de diferença — pode garantir o título já nessa noite. São ingredientes de sonho para uma Liga que se quer vendável, e não tenho dúvidas de que o cenário mais desejado era mesmo este. Parece-me que este photo finish 2024/2025 está longe de ser suficiente, mas é melhor do que tentar convencer meio mundo a pagar 300 milhões por jogos com 40 minutos de tempo útil a uma segunda-feira à noite. O que não ajuda seguramente é a qualidade apresentada por muitas das restantes equipas, começando pelos adversários de Benfica e Sporting no último fim de semana. Quaisquer dois jogos com quase uma dúzia de golos agradarão à maioria, mas a qualidade dos derrotados é uma lembrança aguda de que urge rever o quadro competitivo da liga. Não há qualidade para 18 equipas na primeira divisão.

De volta ao presente, o que mais me chamou a atenção nas últimas semanas foi mesmo o contraste entre estilos de jogo e estratégias para atingir os dois principais objetivos a nível interno: Liga e Taça de Portugal. A última jornada foi especialmente sintomática do modo como as duas equipas se aproximam da hora da decisão. Ambas golearam, mas fizeram-no de modo muito diferente.

O Benfica de Bruno Lage, salvo uma ou outra inconsistência, conseguiu o primeiro objetivo intermédio desta sequência de jogos, que era chegar ao final da 31.ª jornada com uma chance de conquistar a liderança no jogo em casa contra o Sporting. Qualquer outro cenário teria sido o rastilho de uma depressão profunda. Felizmente, longe disso. Para garantir esta posição, a equipa foi melhorando a média de golos marcados e apresenta agora números que não se viam há largos anos. Não precisava de o ter feito para depender só de si, mas chega a esta fase da temporada com um naipe de soluções que permite, por exemplo, ter seis jogadores diferentes a marcar os seis golos de uma vitória. Não tendo concordado com todas as escolhas de Lage até aqui (o que é perfeitamente normal), sinto que hoje estamos a ver o trabalho de um treinador mais maduro, que juntou a isso a coragem de ter aceitado o desafio inicial e de já ter dobrado mais do que um cabo das tormentas. Perante um adversário frágil como o Aves SAD, a equipa abordou o jogo com a atitude certa, trabalhando para uma vitória robusta que permitisse melhorar o goal average, já que este pode muito bem vir a decidir o campeão.

Do outro lado, um Sporting completamente dependente de Gyokeres, mas muito seguro de si nessa condição. Esse pragmatismo tem favorecido Rui Borges. A equipa chega a esta fase da temporada com a versão mais competente da única ideia de jogo que poderia garantir a este plantel do Sporting condições para lutar pelo título. Neste último ano ganhou força o hábito de diminuir as defesas adversárias por ainda não terem aprendido a impedir o sueco de marcar golos. Aqui chegados, talvez seja importante admitir que a tarefa não é fácil e está fora do alcance da esmagadora maioria dos defesas desta liga, tal é a facilidade revelada pelo sueco para repetir movimentos que já todos vimos dezenas de vezes. Para além do jogo mais direto, há capacidade no meio-campo ofensivo do Sporting para garantir que o ataque organizado também gera algumas ocasiões de golo, quase sempre finalizadas pelo mesmo. Mas sejamos avisados: entre o regresso de Pote, o talento de Trincão, a inteligência de Hjulmand ou a esperteza de Catamo, haverá muito para anular na receção no Estádio da Luz.

Aqui chegadas, ambas as equipas sabem que perder pontos na próxima jornada é um cenário muito pouco recomendável, mas o facto é que terão um dérbi logo de seguida que poderá permitir ao segundo classificado, nessa data, emendar a mão e recuperar a primeira posição. Se o leitor for como eu, acorda e adormece a pensar no Benfica ou, se tiver esse infortúnio, no Sporting. Por isso, a partir daqui, caso nos cruzemos, escusa de me perguntar o que me vai na alma. Já sabe que estamos ambos a pensar no mesmo.

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