Belenenses em patins e patins na Corunha
1 - Lamentável tudo o que se vem passando em redor do futebol no Clube de Futebol Os Belenenses (CFB), um dos clubes com maior tradição e significado no panorama desportivo nacional. Creio que, no fim, só haverá vencidos. Desde logo, o próprio clube. Mas também aqueles que protagonizam o cisma. Não me interessa de que lado está ou não está a razão, se é que está de algum dos lados. Não tenho suficiente conhecimento do que se terá vindo a passar no olho do furacão que avassalou os azuis de Lisboa, mas é razoável pensar-se que seria obrigação dos contendores preservarem, acima de tudo, a história e a vida do clube que está para além de todas as vicissitudes pessoais e institucionais.
Bem vistas as coisas, é no que dá uma legislação permissiva e aligeirada feita para uma realidade que já não é a de hoje. O risco de fragmentar irreversivelmente a ideia do clube-coração e a do clube-capital está aí neste tempo onde qualquer entidade ou pessoa pretensamente endinheirada se pode intrometer, não raro, invocando razões reais ou forjadas de sobrevivência de um clube falido ou endividado até ao pescoço. A partir daí, só o dever de bom-senso pode contribuir para que a unidade clube/SAD não se destrua, sabendo nós que a sensatez e o sentido estratégico são bens cada vez mais escassos.
Hoje é com Os Belenenses. Amanhã será com outros. Bem sei que há um certo vento de inevitabilidade no reforço da lógica capitalista, pela qual os donos-sócios de um clube são substituídos por um dono de capital. Lá fora isso espalha-se virulentamente com clubes importantes possuídos por árabes, russos, asiáticos endinheirados e, muitas vezes, fazendo dos clubes adquiridos verdadeiras lavandarias de dinheiro sujo. O futebol de há muito que deixou de ser um simples desporto competitivo para se tornar numa indústria pesada, onde muito poucos ganham quase tudo e todos os outros vivem na ilusão do que jamais alcançam. As organizações que tutelam o futebol, desde as poderosas FIFA e UEFA às agremiações paroquiais fingem ignorar o que, mais tarde ou mais cedo, vai implodir e, pelos vistos, dão-se bem com as golpadas e truques financeiros de instituições desportivas transformadas em dissimulados offshores de diversas naturezas e (des)ordem.
Aqui, no nosso cantinho à beira-mar plantado, ainda estamos no dealbar destas aquisições que começaram por surgir em clubes modestos, agora nas mãos de pequenos e disfarçados abutres. O Atlético Clube de Portugal, um clube com tradição na cidade de Lisboa, já provou o fel desta tendência.
Voltando ao CFB, assistimos a um divórcio que seria apenas burlesco, não fosse a magnitude das suas consequências. O Belenenses SAD na Primeira Divisão irá, em transumância, para o Estádio Nacional. O Clube de Futebol Os Belenenses vai iniciar a sua caminhada partindo da última divisão distrital da AF de Lisboa, e jogando no seu lindo Estádio do Restelo. O primeiro campo, provavelmente às moscas, a não ser nos jogos com os grandes como se estes jogassem em casa. O segundo, com os resistentes belenenses de coração a assistir aos iniciáticos futebolistas num estádio só com despesa e sem receita. O emblema da Cruz de Cristo, algures disperso entre Belém e o Jamor, ou como agora se diz a marca, avocada em regime de bigamia. Até agora, um silêncio insuportável da Federação e da Liga de futebol, mais preocupados com passarem entre os pingos da chuva. E, assim, se vai dissolvendo um clube que já foi grande desportivamente, que nunca havido deixado de ser grande no coração de muitas gerações de portugueses aqui e na diáspora, e que arrisca passar a ser irrelevante no próximo futuro.
Mas não haverá ninguém que, com humildade e racionalidade, diga BASTA a esta usurpação da história de uma instituição como é o CFB e se revolte contra uma aparente inacção ou apatia de quem tem deveres inalienáveis para com o clube?
O futebol português não são só os três grandes, o Ronaldo, a selecção e os programas televisivos sobre árbitros, transferências e patetices. É muito mais do que isso que importa considerar, sob pena de um dia o tsunami se voltar contra a ilusão da efemeridade do pequeno círculo de vedetas, vedetismo e celebridades.
2 - Está a decorrer esta semana mais um Europeu de hóquei em patins com 11 selecções. Portugal defende o título de há dois anos e procura alcançar uma conquista internacional fora do país, o que já não acontece desde 1993 no Mundial de Itália e desde 1996 num Europeu também em Itália.
Pertenço a uma geração que tinha nesta modalidade o sonho e o orgulho de ser o campeão. Hoje, submergido pelo poder totalizante do futebol, o hóquei minguou no coração dos portugueses. Continuo a acompanhá-la com gosto, quer a nível nacional onde as competições têm reganhado consistência e emoção que andavam arredias, quer a nível internacional onde a Espanha tem tido agora uma grande hegemonia.
De um modo geral, deixou de haver individualidades que só por si decidiam títulos, como o nosso grande e saudoso jogador Livramento. Agora é tudo mais programado colectivamente, o que talvez tenha tornado este desporto menos espectacular. Ainda hoje recordo, com saudade, o campeoníssimo Portugal de Moreira, Vaz Guedes, Adrião, Velasco e Bouçós. E os históricos confrontos com os espanhóis Zabalia, Orpinelli, Boronat e Puigbó, os italianos Panagini e Gelmini e até os irmãos suíços Monney. E sinto a falta de equipas adormecidas pela erosão do tempo, como o CACO de Campo de Ourique, o Hóquei de Sintra, o Infante de Sagres ou a CUF.
Neste Europeu, certamente acontecerá o costume: a seriação das selecções em 3 níveis estanques (Portugal, Espanha e vá lá a Itália, as 3 ou 4 do meio e as que fazem apenas turismo desportivo), onde as primeiras jornadas são só para aquecer. Ressalva-se o regresso da Holanda e Bélgica (embora esta num nível indigente) e a teimosia de Andorra e Áustria. As constantes mudanças de regras de jogo também em nada têm contribuído para reabilitar esta belíssima modalidade.
3Entre futebol mundial e hóquei europeu, jogou-se ténis em Wimbledon, que foi - como sempre -a rainha deste desporto. Este torneio do Grand Slam é, aliás, insuperável. Jogado em relva, o que lhe dá até uma frescura e estética inigualáveis, com um respeito bem britânico pela tradição que obriga jogadores e jogadoras a equipar só com a cor branca e não com o folclore de cores e vaidades de outros torneios, e não passando das 23 horas da noite para não perturbar as pessoas que vivem perto, tem também uma particularidade que, ainda que bastante discutível, tem algo de épico, qual seja a de não haver tie break no último set com o jogo empatado. Foi assim que, numa das meias-finais, se jogou durante 6 horas e 35 minutos com um final do 5.º set de 26-24, mesmo assim ainda longe do impensável 70-68 em 2010 (partida com 11 h 05 m). A transmissão televisiva deste torneio foi, como sempre, admirável.