As dívidas internas da SAD do FC Porto

OPINIÃO19.12.201803:00

1No espaço de uma semana, o FC Porto arrancou, a duras penas, três vitórias  marcantes: foi ganhar a Istambul para a Liga dos Campeões, foi ganhar a Ponta Delgada - uma vitória difícil e à campeão que os maledicentes habituais quiseram manchar com uma suposta falta no golo da vitória - e venceu em casa o Moreirense para a Taça de Portugal, atingindo assim as 14 vitórias consecutivas. Estranho jogo este: uma grande primeira parte dos portistas, embora sofrendo um golo no primeiro remate do Moreirense e embora revelando uma tendência que já vem de trás de abrir grandes rachas no centro da defesa. Depois, vira para 2-1, perde de seguida umas cinco oportunidades de golo e, a caminho das cabines, sofre o empate na segunda oportunidade do Moreirense. E uma segunda parte a acusar claramente o desgaste natural, salvando-se por dois golpes do talento de Brahimi a assistir o inesgotável Marega. Grande e incansável desempenho de Alex Telles a servir cruzamentos em série e de luxo, nomeadamente uma soberba cobrança do pontapé de canto do primeiro golo, em contraste com mais uma pungente prestação de Maxi, no lado oposto (caramba, não haverá mesmo alguém que possa fazer o lugar, considerando que Corona faz muita falta lá à frente?). Embora jogando contra um Moreirense muito desfalcado, o FC Porto fez um bom jogo, mas pagou pelo facto comezinho de que nem nestes jogos fáceis os maus jogadores desaprendem de o ser: Fabiano, Maxi e Adrián López ou comprometem ou são inúteis. Não há volta a dar.

2Creio que todos os portistas preferiam o Manchester United, por várias razões, algumas históricas, outras contemporâneas. Isso antes de se saber da saída de Mourinho e se o United de Fevereiro, livre do peso que Mourinho estava claramente a ser, não será já uma equipa diferente. Como o será a Roma, depois da anunciada ida ao mercado, em Janeiro. Mas, em Janeiro, os portistas esperam que a SAD do FC Porto também dê à equipa e ao seu treinador alguma coisa em troca do muito que estes já lhe deram. Esse é o ponto seguinte deste texto.

3Vendo meia equipa titular do FC Porto ganhar na Turquia ao Galatasaray e terminar a fase de grupos da Champions como a equipa com mais pontos feitos nos seis jogos, dei comigo a pensar o quanto a SAD do FC Porto deve à actual equipa e ao actual treinador, Sérgio Conceição. Sucedendo a uma série de erros de casting mais do que previsíveis (Lopetegui, Peseiro, Nuno Espírito Santo), Sérgio Conceição aceitou prescindir de metade do vencimento que iria ganhar em França para vir treinar uma equipa descrente e desacreditada, que há quatro anos não ganhava título algum e que a SAD lhe entregava com expressa menção de que não poderia contar com qualquer reforço, devido à iminente falência a que a gestão da SAD levara a sociedade e o clube. E Sérgio Conceição, sem uma lamúria nem um queixume, pegou no curto plantel de que dispunha, recuperou jogadores votados ao fracasso e ao esquecimento e com eles evitou o campeonato do Benfica, devolveu o título de campeão ao FC Porto e ainda levou a equipa até aos oitavos de final da Champions, onde só caiu às mãos do inacessível Liverpool. E, aos milhões da Champions, juntou os milhões da venda de jogadores valorizados por si, dos quais o mais emblemático foi Diogo Dalot. Este ano, apenas com um verdadeiro reforço (Éder Militão e para o lugar de Marcano), fez o que fez na Champions, onde já arrecadou 68 milhões para a SAD e mantém vivas as esperanças de ir mais além, ao mais tempo que lidera o campeonato e está vivíssimo em todas as frentes. Poucos treinadores, se é que algum, e poucas equipas do FC Porto conseguiram em tão pouco tempo ser de tal forma rentáveis para o clube e a sua SAD. Pois é altura de perguntar: e o que tem feito a SAD, em troca?
O FC Porto, dizem-no as estatísticas, está entre os dez clubes do mundo que mais dinheiro facturaram com a venda de jogadores nos últimos dez anos. Também está entre os cinco que mais presenças tiveram na Champions, arrecadando as respectivas receitas. Para onde foi todo esse dinheiro para se ter chegado ao ponto de a SAD, mesmo antecipando receitas do fabuloso contrato televisivo celebrado com a Altice, ter acumulado dívidas de 380 milhões de euros e se ter visto sujeita a uma espécie de processo de falência controlada por parte da UEFA? Como é que Fernando Gomes, o administrador com o pelouro das Finanças, responde a isto? Ou acha normal e contenta-se com a falta de curiosidade dos órgãos estatutários que deveriam colocar estas perguntas mas não o fazem?
Por outro lado, tendo o FC Porto, por mérito dos seus atletas e treinadores, conquistado um estatuto de clube mundial, de que ninguém mais goza, de perto ou de longe no futebol português, sendo hoje um clube conhecido não apenas na Europa, mas na Ásia e profundamente em toda a América Latina, estando sistematicamente presente ao mais alto da competição europeia de clubes - a Champions - cujos jogos são transmitidos para o mundo inteiro e vistos por centenas de milhões de espectadores, como se compreende que a sua equipa de futebol ainda não tenha arranjado um patrocinador para as camisolas, pelo menos ao nível daquele que o Benfica - essa medíocre equipa europeia - conseguiu já há vários anos? E como se compreende que o Estádio do Dragão, que é constantemente cenário dessas transmissões televisivas e, além do mais, um dos mais bonitos do mundo, com uma arquitectura absolutamente surpreendente e única, não tenha conseguido angariar um naming? O que anda a fazer o administrador com o pelouro comercial (que, tal como os outros, ganha uma fortuna para exercer as suas funções)? Está sentado à espera que os patrocinadores lhe caiam no colo? Por que razão vejo tantas equipas que jamais ganharam ou ganharão o que quer que seja, em termos internacionais, patrocinadas por grandes multinacionais do planeta, e as camisolas do FC Porto nada mais ostentam que o símbolo do seu fabricante?
4Falando do mesmo assunto, mas numa outra lógica, Luís Filipe Vieira veio declarar, comparando o Benfica ao FC Porto, que «aqui não há intervenção da UEFA nem credores a bater à porta». Sobre a UEFA, terá razão, sobre os credores já não tanto: certo é que a dívida do Benfica também não se recomenda. Mas o que é de salientar é o atrevimento do presidente do Benfica: não tem intervenções da UEFA nem credores à porta? Será. Mas tem intervenções da PJ e do Ministério Público, processos em tribunal, um saco azul de dinheiro por explicar e um saco fundo de suspeitas no ar. Por isso, para tentar desesperadamente desviar as atenções do que verdadeiramente os aflige e traz em pânico, todos os dias o gabinete de crise da Luz vomita cá para fora seleccionados e disparatados ataques às arbitragens dos jogos do FC Porto, tentando convencer as almas (quais?) de que o FC Porto comanda o campeonato, não porque seja a melhor equipa, mas porque é ajudado pelos árbitros (matéria em que o Benfica se achava com direitos de exclusividade), e que só por causa disso é que o Benfica vai em quarto lugar, apesar de estar a jogar um futebol de encher o olho. Como se vê, jogo a jogo.

5SCP: Sporting Clube de Penalty. Soma e segue. Ano após ano e jornada após jornada. O primeiro contra o Nacional foi decisivo para evitar o que parecia uma inevitável derrota: decisivo e anedótico. O segundo confirmou a minha perplexidade: aquele calmeirão do Bas Dost, aliás excelente jogador, cai ao chão com uma simples corrente de ar. Depois, ao cobrar os penalties, limita-se a esperar que os guarda-redes caiam eles ao chão e calmamente desvia-lhes a bola para o meio ou para a outra banda. Pergunto-me para que servem os treinadores de guarda-redes?

6Os três países do mundo cujos clubes de futebol mais dinheiro gastam com agentes de jogadores são, por ordem, a Inglaterra, a Itália e a Alemanha, o que se compreende visto que são, além da Espanha, aqueles que mais transacções movimentam. Extraordinário é que o quarto país, logo a seguir àqueles três e até à frente da Espanha, seja Portugal. Talvez isso ajude a explicar em grande parte  por que razão os nossos três grandes estão falidos.  
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