Amorim e os dez milhões
Muito se tem falado da transferência de Rúben Amorim do SC Braga para o Sporting. Em especial dos dez milhões que Frederico Varandas arranjou para levar já para Alvalade aquele que é, por estes dias, o treinador da moda em Portugal. Mas convém, como quase sempre quando se fala muito sobre uma coisa - seja ela qual for -, analisar com alguma distância aquilo que se ouve e escreve.
Comecemos por António Salvador, a quem nem faltaram lágrimas para falar da saída de Rúben Amorim para o Sporting e da forma como ela se processou. Não vou, sequer, falar da hipocrisia de quem já fez, mais que uma vez, o mesmo - deixo isso para a memória sempre prodigiosa do Rogério Azevedo, em baixo. Mas convém chamar a atenção para um facto relevante: Salvador podia, se quisesse, ter travado a saída do seu treinador. Bastava querê-lo mesmo. Porque ao contrário do que deu a entender o presidente bracarense, o Sporting não bateu a cláusula de rescisão de Amorim. É verdade que pagará por ele os dez milhões inscritos na cláusula, mas em prestações. O que pressupõe, desde logo, uma negociação com o SC Braga, que teve de aceitar a saída do técnico mediante determinadas condições. São, perceba-se, cenários diferentes. Muito diferentes até. Sejamos claros: Rúben Amorim só é hoje treinador do Sporting porque António Salvador deixou. Não está, repare-se, em causa se fez bem ou mal. Se eu estivesse no lugar do presidente dos bracarenses teria, provavelmente, feito o mesmo. Dez milhões por um treinador com 13 jogos? Quem, no seu perfeito juízo, recusaria? É, até, um ato de gestão verdadeiramente extraordinário. E por isso custa ainda mais a perceber, ou a aceitar, as lágrimas de António Salvador.
Passemos ao outro lado, o do Sporting. Frederico Varandas fez questão de ressalvar, na apresentação do novo técnico - o sexto da sua presidência, dado que devia levá-lo a pensar um pouco, digo eu... -, que os tais dez milhões pagos ao SC Braga para garantir, no imediato, Rúben Amorim não representam um all in financeiro. Talvez não, cada um sabe de si e Varandas saberá melhor do que ninguém sobre as contas do Sporting. Mas o que Varandas não pode recusar é que a aposta em Amorim constitui, de facto, um all in enquanto presidente. Porque o que fez foi mesmo apostar as fichas todas num treinador que, aparentando ter tudo o que é preciso para ter sucesso, tem ainda de prová-lo num desafio mais exigente. Como aquele que encontrará em Alvalade. Não embarco, ainda assim, na ideia generalizada de que dez milhões por Rúben Amorim é uma loucura. É prematuro dizê-lo. Só daqui a algum tempo poderemos sabê-lo com absoluta certeza, porque - e nisso Varandas tem razão - há casos em que o que parece caro acaba por sair barato. Direi, apenas, que se trata de uma jogada de enorme risco do presidente do Sporting. Na certeza de que se correr bem será de génio mas se correr mal será a última jogada de Varandas em Alvalade.
Por fim, Rúben Amorim. Se percebo as opções de Salvador e Varandas, admito que me custa mais a entender a do jovem treinador. A dar em Braga os primeiros passos de uma carreira que pode ser brilhante (não deixa de poder sê-lo por se ter mudado para Alvalade, essa expectativa pode até, pelo contrário, sair reforçada...), escolheu arriscar já tudo, ainda por cima num Sporting que, convenhamos, não lhe oferece assim tantas condições para o sucesso. Acredito nele quando diz que não foi uma decisão motivada por motivos financeiros. Percebo até a ideia de começar, já, a preparar a próxima época. O problema é que até lá ainda faltam muitos jogos. Faltam, pelo menos, os suficientes para que, como o próprio assumiu, não haja sequer próxima época para Amorim em Alvalade. O que representaria um enorme passo atrás numa carreira que ainda não deu assim tantos passos à frente.