Amorim disse o que quis

OPINIÃO23.08.202206:35

O treinador leonino reagiu antes da trovoada acontecer, como se a previsse. Não ficou à espera do resultado do clássico para depois falar

Oalvoroço suscitado pela saída de Matheus Nunes para o Wolverhampton parece-me exagerado. A razão central que perturba o normal quotidiano  do futebol leonino não se explica apenas pela venda de um praticante de muita qualidade, uma venda prevista e desejada, sublinhe-se, e que, nos dias de hoje, do ponto de vista de uma política que privilegia contas equilibradas, se tratou de uma operação irrecusável, sob risco de a administração leonina poder ser acusada de má gestão se tivesse outro entendimento.
Por outro lado, o jogador, apesar das juras de amor ao Sporting,  como qualquer pessoa no seu perfeito juízo, jamais enjeitaria um contrato que vai permitir-lhe ganhar cinco ou seis vezes mais do que recebia em Alvalade.
Pela dureza da conferência de Imprensa de Rúben Amorim, na projeção do clássico com o FC Porto, creio que a saída do médio foi o pretexto que faltava para descarregar tensões acumuladas em consequência deste caso e de outros mal resolvidos ou por resolver. Talvez por isso, Rúben Amorim tenha aproveitado a oportunidade para aliviar a alma, excedendo-se na palavra e dizendo o que quis dizer, numa reação surpreendente de quem se tem revelado hábil comunicador e sabe muito bem quando pode acelerar ou tem de travar na mensagem que pretende transmitir.
Desta vez, porém, não se conteve, e foi suficientemente explícito quanto ao destinatário do seu desabafo, ao recusar qualquer tipo de incoerência da sua parte em relação a todo este processo que culminou na saída de Matheus Nunes. Afirmou-o com todas as letras. «Não sou eu que vendo jogadores. Vou até ao fim nas minhas ideias, não sou incoerente. Vendemos o Tabata porque o Matheus não quis sair. Incoerência não é do lado do treinador», acentuou.
A «direção faz as suas escolhas»  e  o treinador é apenas «empregado do clube», recordou em duas frases que  reforçam o seu desconforto, ao  qual deu dimensão pública no dia anterior ao clássico no Dragão, o que faz toda a diferença. Rúben Amorim reagiu antes da trovoada acontecer, como se a previsse. Não ficou à espera  do resultado do jogo para depois falar, como é costume.
 

OS emblemas portugueses andam de mão estendida e mais uma vez o interesse financeiro sobrepôs-se ao interesse desportivo, tal como se verificou, no início do ano, quando o FC  Porto, apressadamente, libertou Luis Díaz para o Liverpool, sem cuidar dos efeitos  no desempenho futuro da equipa, tal como Sérgio Conceição denunciou na hora.
Os clubes lusos, quase todos,  vivem acima das suas possibilidades, sufocados por dívidas colossais, mas estranhamente iludidos pelos favores dos Mendes desta vida, que só têm olhos para os interesses deles  e dos financiadores amigos que lhes fornecem o combustível para manter acesa a chama dos negócios, porque, como alguém disse, o dinheiro precisa de circular para valorizar.
Depois de casa roubada, trancas na porta e, em função da pesada derrota sofrida no Dragão, a comunicação leonina foi célere em fazer constar que estará em marcha a contratação de alguém que possa preencher a vaga de Matheus Nunes com o mínimo de turbulência.
Li em A BOLA que se procura um jogador para a posição oito e que tenha  golo, como se fosse possível resolver o problema através de  simples golpe de magia. Mesmo aceitando que Rúben Amorim será capaz de, mais uma vez, enxergar uma luzinha de esperança na escuridão profunda, nem mesmo assim, creio, as coisas voltarão a ser o que eram no princípio. Ao fim de quase três anos de convivência muito frutuosa, é natural que haja alguma saturação e que o treinador que, ao fim de dezanove anos de longo jejum, conquistou  para o Sporting um título de campeão nacional, persiga outros desafios, em  países que reconheçam e exaltem as suas competências.


O LUGAR DO BENFICA É NA CHAMPIONS

R OGER SCHMIDT sabe que, hoje, pode cumprir o primeiro objetivo desportivo da época, eliminando o Dínamo de Kiev e garantindo a presença na fase de grupos da Liga dos Campeões Europeus.  O caminho ficou facilitado depois da vitória no jogo da primeira mão (2-0), mas isso em nada altera o seu grau de exigência. Para esta noite, na Luz, quer os melhores em campo e quer os melhores no banco de suplentes. Não é altura de fazer alterações só para rodar, respondeu, a fim de satisfazer as trivialidades de algumas perguntas que lhe fizeram.
Melhor do que ninguém ele sabe que o menor descuido pode comprometer o resto da temporada e é nesse sentido que colocou o acento tónico na atitude e no sentido de responsabilidade de quem for chamado a jogo porque, como fez questão de frisar, nada está resolvido e não pode subsistir a menor dúvida sobre a motivação de todos os profissionais da águia em regressarem à Liga dos Campeões  e lá se fixarem. Por ser importante em termos de contrapartidas financeiras, sem dúvida, mas, principalmente, por respeito ao passado do Benfica à sua história.  Schmidt já percebeu isso muito bem e os jogadores vão ter de perceber também, ou mudarem de ares…