Abdul-Jabbar citando Lincoln

Uma lenda do desporto convidada para ler o discurso de Lincoln na festa de Joe Biden

P ELA noite dentro eu seguia a festa de empossamento de Joe  Biden como presidente dos EUA. Tom Hanks ia apresentando músicos convidados, e entre eles surgiu um  segmento com quatro personalidades que leram discursos célebres de tomada de posse. A primeira foi um desportista lendário, que de resto a organização do evento emparelhou com o  de um nome maior, Abraham Lincoln. Disse Kareem, lendo as palavras de Abe em 1865: «Sem maldade, com caridade para todos, vamos lutar para terminar o trabalho que nos deram, curar as feridas da nação, cuidar daquele que participou na batalha, mas também da viúva e do órfão, até termos paz entre nós e com os outros.»
O ativismo político e social de Abdul-Jabbar é reconhecido - recuperado durante o mandato daquele ordinário que agora foi para casa - pelo que pedir-lhe para ler o excerto de Lincoln foi simbólico.
Mas se Abdul-Jabbar, ícone da NBA, tem muito de político, o próprio Lincoln teve muito de desportista. Foi um lutador de wrestling, campeão regional, beneficiando de uma altura e de um atleticismo que lhe deram contornos eternos. Ademais, junte-se a forma desportiva como fez política. A quem goste do tema recomenda-se Team of Rivals, de Doris Goodwin, um tratado de génio político, uma viagem à forma como Lincoln pegou em gente que se odiava e formou um governo funcional, com ele ao centro e sempre coerente, sem ceder, sem impor. No livro, há uma passagem que prezo: um dos tais rivais acusa Abe de ser troca-tintas, por querer estar bem com todos, de ter duas caras, afinal. Ele, que era feioso, respondeu: «Você acha que se eu tivesse duas caras ia estar a mostrar-lhe esta?» Todos se riram. Às vezes parece tudo tão fácil.