A nossa melhor equipa
Nuno Espírito Santo completa hoje em casa (Estádio Molineux) 50 jogos na época à frente da melhor equipa portuguesa de Inglaterra e em absoluto. Chama-se Wolverhampton e, nas palavras de Nuno (ao canal ESPN Brasil), «já não é um projeto. É a minha vida». O adversário é o Bournemouth, que está em zona de descida. Em teoria, os lobos somam mais três pontos (ficam com 49) e colam-se ao Chelsea de Frank Lampard (51), que recebe amanhã o Manchester City novamente em modo goleador. Lembre-se que o Wolverhampton na Premier segue num brilhante quinto lugar, empatado com o Manchester United (46 pontos), ambos a cinco pontos do Chelsea (4.º) e da qualificação automática para a próxima Champions - e do respetivo bónus de 42 milhões. Mais atrás vêm o Sheffield United de Chris Wilder (joga hoje em Old Trafford), o Tottenham de José Mourinho e o Crystal Palace do eterno Roy Hodgson, mas pelo que se tem visto nenhum deles tem pedalada para Nuno e Solskjaer. Embora a qualificação via Premier seja difícil - é claro que o Chelsea não vai facilitar - deve lembrar-se que Nuno, tal como Solskjaer, ainda pode chegar à Champions via Liga Europa (se a ganhar). O Manchester United já está nos quartos de final (venceu na Áustria o Lask Linz por 5-0) e o Wolverhampton para lá caminha depois de empatar em Atenas com o Olympiakos de Pedro Martins (1-1) - lembre-se, no entanto, que os gregos foram a Londres eliminar o Arsenal (2-1) nos 16 avos de final.
Na retoma da Premier, o Wolves foi a Londres vencer o West Ham (2-0) com mais um cabeceamento certeiro do mexicano Raúl Jiménez (73’) e um golo extraordinário do jovem Pedro Neto que, tendo entrado a substituir Diogo Jota (64’), fulminou de primeira o guarda redes Lukasz Fabianski com uma autêntica pedrada ao ângulo - certamente um dos golos mais violentos da época; um jornal escreveu que aquela bola «arrancava» a cabeça de Fabianski se lhe tivesse acertado. Pedro Neto, 20 anos, produto da formação do Braga, como Francisco Trincão, tem sido uma das maiores revelações nacionais da época (lembro os grandes jogos que fez com o Liverpool e o Man. United) e, por este andar, vai certamente engrossar o lote de lobos habitualmente convocados pelo selecionador Fernando Santos - o mesmo se diga do lateral esquerdo Rúben Vinagre (21), uma força da natureza cuja evolução Raphael Guerreiro e Mário Rui devem estar a observar com alguma apreensão.
Nuno levou toda a armada portuguesa ao Olímpico de Londres (Patrício, Rúben Neves, Moutinho e Jota figuraram no onze inicial; Vinagre e Pedro Neto foram suplentes utilizados; Podence e Bruno Jordão não saíram do banco) e os adeptos por cá devem ter reparado pela enésima vez na enorme diferença de intensidade, velocidade e poder atlético do jogo do Wolverhampton comparado com aquilo que nos servem por cá. É uma diferença assustadora. E não!, não são latagões ingleses, escoceses, galeses e irlandeses quem faz a equipa do Wolves parecer, a espaços, um cilindro compressor laranja: são portugueses, a maioria deles futebolistas jovens em fase de afirmação (seis dos oito tugas de Nuno têm entre 20 e 24 anos).
Também incomoda perceber que o Nuno que saiu do FC Porto com o epiteto de frouxo (lembram-se? era demasiado calado, demasiado cordato, demasiado educado, demasiado bonzinho, pouco assertivo, pouco refilão, pouco etc, etc, etc…) é o mesmo que, exatamente com o mesmo perfil, construiu em três anos (começou no Championship, a segunda divisão inglesa) uma formidável máquina de combate que joga, de longe, o melhor futebol que se vê numa equipa de matriz portuguesa. Deixem-me repetir para não haver dúvidas: este Wolverhampton ganhava a Liga portuguesa com uma perna às costas e uns vinte pontos de avanço. Este mesmo Wolverhampton que, em três anos, tem saldo positivo nos confrontos com Manchester City, Manchester United e Arsenal, saldo empatado com Chelsea e Tottenham e registo negativo com apenas um dos poderosos big six - o Liverpool. Se isto não é de caras a melhor equipa portuguesa vou ali e já venho.
Luís Castro, docemente…
Luís Castro, treinador do Shakhtar Donetsk, acaba de ganhar a liga ucraniana a cinco jornadas do fim. Ele é do mesmo campeonato de Nuno Espírito Santo: um homem genuinamente simpático, educado, avesso a peixeiradas e senhor de um discurso cativante pela franqueza que se intui naquilo que diz. Nunca o vi ser incorreto com um adversário, antes pelo contrário. O novo campeão da Ucrânia fala bem, levanta questões interessantes e, como Nuno, foge aos lugares comuns que preenchem uma parte significativa do discurso de muitos treinadores portugueses. Como Nuno, também Luís Castro não sobreviveu à experiência de treinar (na reta final de 2013/2014) a equipa principal do FC Porto (também com um plantel francamente empobrecido…) e saiu do Dragão com a imagem de ser talvez demasiado suave para as necessidades da casa. Boa parte da magia da vida reside na diversidade, quer dizer, de não pensarmos, dizermos e fazermos todos o mesmo. No futebol é a mesma coisa. Podemos sentir até fascínio pela capacidade de encenação de treinadores de perfil truculento e discurso provocador como Brian Clough, Malcolm Allison, José Mourinho e Jorge Jesus, como podemos sentir admiração pela classe e elegância natural de gente como Franz Beckenbauer, Arrigo Sacchi, Carlo Ancelotti, Arsène Wenger, Pep Guardiola e Zidane. Desde que haja respeito e não se ultrapasse determinada linha, há lugar para todos. Muitos parabéns, Luís Castro.