A hipocrisia

OPINIÃO20.07.201804:00

Queixa-se o destituído presidente do Sporting de estar a ser vítima de julgamento popular. Não fez o destituído presidente do Sporting outra coisa, durante demasiado tempo, senão acusar na praça pública, criar, ele sim, tribunais populares, condenar sumariamente e destruir quem pudesse atravessar-se no seu caminho.

O destituído presidente do Sporting - único presidente destituído, recordo, na história dos grandes clubes portugueses - tem a lata de considerar que estão a fazer com ele o que ele, coitado, nunca fez com ninguém. E bem sabemos que fez.

E fez o que ninguém faz com ele.

Que eu saiba, ainda ninguém tentou humilhá-lo, pelo menos publicamente.

Nem sequer o andam a acusar disto e daquilo.

As pessoas que falam do Sporting não querem falar do destituído presidente. E muitas, quando falam, até lembram algumas coisas boas que fez. Ou se pensa que fez.

Percebe-se, aqui e ali, que ninguém quer atirar mais achas para qualquer fogueira,

Ninguém lhe faz, na verdade, o que ele fez a tanta gente.

A não ser, talvez, por ironia do destino, os que lhe eram, e foram sempre, mais próximos, até ao momento, muito recente, de começarem a afastar-se, como é o caso, tornado público, de Elsa Judas.

Ainda a meio desta semana, curiosamente, enquanto o destituído presidente do Sporting se dizia, num canal de televisão, alvo de «vingança», noutro canal de televisão, a ex-presidente transitória da Mesa da Assembleia Geral leonina nomeada pelo destituído presidente (é confuso, não é?) chamava «aldrabão» ao destituído presidente, acusando-o, cito, de «mentir com os dentes todos».

Zangam-se as comadres, lá se vão descobrindo algumas verdades, não é o que diz o povo?!

Falta saber, a propósito, porque raio se zangaram, entretanto, com o destituído presidente alguns dos homens, como Carlos Vieira ou José Quintela, que não apenas estiveram, até ao fim, ao lado do destituído presidente, como se mostraram sempre seus indefetíveis seguidores…

Volto, aliás, a questionar: zangaram-se? afastaram-se? ou apenas decidiram, estratégica e temporariamente, separar-se?

Faz-me alguma confusão, confesso.

E já agora, numa semana em que voltámos a recordar os tristes acontecimentos de Alcochete que tão profundamente marcaram o Sporting, pela recordação que, na Áustria, onde trabalha como a nova equipa, deles fez o treinador Jorge Jesus, sou novamente despertado para a tremenda confusão que também me fez, volto a confessar, muito do que foi dito na altura pelo destituído presidente.

Quis, por exemplo, o então presidente, entretanto destituído, convencer toda a gente de que não fazia a mais pequena ideia do que sucedera no aeroporto do Funchal, lembram-se?, quando a equipa leonina se preparava para regressar a Lisboa, após a derrota com o Marítimo, na última jornada da Liga.

Sei que já se passaram dois meses, mas creio que vale a pena refletir um pouco mais sobre o assunto.

Foram os acontecimentos no Funchal, lembro, que no fundo serviram um pouco de antecâmara ao que veio, dois dias depois, a suceder em Alcochete, com a gravidade que ainda nem todos reconhecem.

Ou não foram?

Naquele fim de dia na Madeira já os ânimos tinham aquecido muito entre adeptos e jogadores.

Ou não aqueceram?

Recordo que o então presidente, entretanto destituído, que tinha ficado, naquele dia, em Lisboa, veio depois a afirmar que nunca soube de nada, que nunca se apercebeu de nada e que nunca os jogador lhe transmitiram qualquer tipo de ameaça.

E disse-o, recordo, já depois de suceder o que sucedeu em Alcochete, quase 48 horas depois daquele clima de tensão que se gerou no Funchal.

Acredito que os jogadores não lhe tivessem dito, e acredito que não lhe disseram porque nunca imaginaram que a ameaça pudesse resultar, realmente, em violência, e sobretudo, nunca imaginaram que o clube, e os responsáveis do clube, pudessem alguma vez permitir que a ameaça de adeptos chegasse, algum dia, à violência.

Alguém pode imaginar uma coisa daquelas?

Mas naquele fim de tarde, no clima tenso e de conflito que se gerou no aeroporto madeirense, enquanto alguns adeptos criticavam os jogadores e um dos adeptos pareceu até querer agredir um ou outro jogador, é ou não é verdade que o delfim do então presidente - falo de André Geraldes, o team manager da equipa - viu e ouviu tudo o que se passou?

Não foi André Geraldes testemunha, serena e tranquila, da pequena bomba-relógio que saiu daquela agitação no aeroporto do Funchal?

E querem que se acredite que André Geraldes não fez o relatório de tudo o que se passou ao então presidente, entretanto destituído, talvez mesmo antes do avião partir para Lisboa?

Como pôde o então presidente, entretanto destituído, fazer-nos crer nunca ter sabido de nada do que se passou no Funchal?

E como pôde até lamentar, como lamentou publicamente, que nunca os jogadores lhe tivesse contado?

Não lhe contou o delfim André Geraldes?

Não era  André Geraldes o diretor responsável pela equipa e não estava, serena e tranquilamente, André Geraldes perto dos conflitos no aeroporto do Funchal?

E não ficou preocupado com o que viu e com o que ouviu?

E não considerou tudo aquilo matéria suficientemente importante para a relatar ao então presidente, entretanto destituído?

Claro que deve ter contado.

Se não contou, foi mau profissional. E foi irresponsável.

Se contou, estamos conversados.

Julgo, aliás, com toda a franqueza, que...

...estamos conversados!