A escola parou no tempo
Professor Teotónio Lima, mestre do Desporto e da vida, teve, um dia, esta frase luminosa: «Quem deixar de aprender deve deixar de ensinar»
TENHO netos. Ser avô pode parecer uma estranha forma de vida, porque, em Portugal e na maioria das civilizações ocidentais, a sabedoria da vida parece ser dispensável. No entanto, como qualquer avô com a felicidade de ter uma cabeça solta, lúcida e interventiva, olho para o mundo de uma forma suficientemente distante para poder avaliar, refletir, pensar, que é coisa que parece ter-se tornado um dos luxos mais raros da nossa suposta avançada civilização.
Nas sociedades ditas modernas, corre-se o mais sério perigo de um retrocesso civilizacional, do ponto de vista dos conceitos essenciais à coexistência humana num mundo respirável, ao mesmo tempo que prossegue, como é natural que prossiga, o constante desenvolvimento tecnológico. O desenvolvimento das novas tecnologias, não é um bem, em si mesmo. Só representará uma mais-valia nas sociedades que o souberem usar e compreender numa perspetiva de evolução da vida comum.
Ora, a questão que torna esta sociedade paradoxal é que se por um lado temos cada vez mais ferramentas tecnológicas, por outro a sociedade estagnou, não evolui, nem mental nem comportamentalmente. É uma sociedade passiva, preparada apenas para aquilo que a vida entende reservar-lhe e não tem especiais objetivos, além daqueles mais primários de enriquecer na vida, seja de que maneira for ou, se tal não for possível, fingir que enriqueceu, ou, pelo menos, que tem um estatuto feito de uma imagem falsa, que dá jeito para entrar no universo do faz de conta e das aparências.
Mesmo admitindo que as grandes mudanças da História foram feitas pela revolução, pelo corte mais ou menos brutal do status quo, outras formas de transformação são possíveis nas chamadas reformas dos sistemas. É um processo mais lento, mais falível, mais retórico, mas menos sangrento, usando aqui uma amplitude de linguagem metafórica.
Nesta via, a grande mudança está na escola e o problema é que a escola de hoje, a escola dos nossos filhos e netos, a escola que está paralisada por reivindicações salariais e de interesses de grupo, que, aliás, serão legítimos, é uma escola parada no tempo, uma escola feita, em grande parte, por professores sem chama e sem alma, sem referências e que não se aproximam da categoria de mestres, que ensinam o que sabem e não ensinam o essencial que é aprender. Um dia, e a propósito do que aqui se diz, o Professor Teotónio Lima, homem do Desporto e mestre de gerações disse esta frase luminosa: «Quem deixar de aprender deve deixar de ensinar.» Calculo que para muitos professores esta frase seja estimulante, mas também sei que para muitos outros soa a sentimento de culpa.
A verdade é que a escola está parada em Portugal e não apenas pelo efeito das greves sindicais. A escola está parada em Portugal, ponto! Porque não evolui num contexto de desenvolvimento social, porque não entende a necessidade de refletir com base na experiência complexa de uma juventude dispersa, desinteressada e não raras vezes desinteressante, que encontra fora da escola todos os interesses que tem. E isso é dramático para a escola. E isso é letal para a afirmação do professor.
As reivindicações, volto a dizer, são legítimas, mas é doloroso que esta análise não seja feita e que as decisões sobre o que é e o que deveria ser a escola continuem desoladoramente arrumadas nas gavetas bolorentas de técnicos de alcatifa, que não pisam uma escola há séculos e que já não fazem a menor ideia da importância do compromisso com os jovens deste país. Jovens que aceitam uma aula como quem toma uma aspirina à espera que a dor passe.
DENTRO DA ÁREA
Rúben Amorim - exemplo raro
Rúben Amorim não tem tempo para usar os palcos das conferências de imprensa para exibir um qualquer alinhamento de lugares comuns. O que diz é pensado e sentido. Faz a diferença para a maioria e recusa o discurso previsível e chato. Não é, porém, suficientemente elogiado e valorizado. De tão embrutecido por uma linguagem e por um pensamento primário, o universo do futebol incomoda-se por ter de pensar além do que já todos pensaram. Falhar a rotina é uma chatice, mas Rúben continua a sua cruzada, contra a pasmaceira.
FORA DA ÁREA
O que excita a paróquia
A guerra na Ucrânia congelou. O povo já não se impressiona, como se impressionava, com os horrores da morte, da fome, da miséria. Continua a ter pena, mas começa a fartar-se do assunto. É preciso manter a chama viva. Agora são as greves e as escolas fechadas, os alunos sem aulas ouvidos na alegria de as não ter e ainda as anunciadas corrupções, sempre com um alegadas para defesa judicial, que beneficia pais, irmãos, primos e enteados. Isso é que excita a paróquia. Ter a certeza de que afinal os políticos são mesmo todos iguais.